Setor elétrico contraria ministro e diz que privatização encarecerá energia
Foto: Lucas Lacaz Ruiz
Executivos do setor elétrico dizem que a aprovação pelo Senado da medida provisória que abre caminho para a privatização da Eletrobras gera maior insegurança jurídica a investidores no país, ao sinalizar que mudanças estruturais no mercado podem ser feitas por meio de emendas sem relação com o tema, os chamados jabutis.
Os custos que serão repassados para conta de luz dos brasileiros também foram elevados pelos senadores. O grupo União pela energia, que reúne 45 associações ligadas à indústria e ao setor de energia, fez as projeções. Os jabutis do Senado, afirma o grupo, acrescentaram R$ 15 bilhões em custos adicionais no futuro, elevando a despesa que será paga pelos brasileiros para R$ 56 bilhões. Incluindo impostos e benefícios setoriais, o custo chegaria a R$ 84 bilhões.
“É uma sinalização muito ruim para o setor elétrico”, disse após a votação o presidente do Fase (Fórum de Associações do Setor Elétrico), Mário Menel. “Reserva de mercado é uma coisa que aparentemente estava superada na visão de modernização do setor elétrico.”
Menel refere-se ao projeto de lei em discussão no Congresso, também apoiado pelo governo federal, que prevê uma reforma do setor elétrico e caminhava num sentido de maior liberalização. Agora, diz ele, o texto terá que ser revisto para se adequar a medidas aprovadas na MP.
“As definições [da MP] invadem o espaço do planejamento setorial e ampliam o risco de investimentos no setor por sinalizar grande instabilidade para investimentos de capital intensivo e de longo prazo, assim como a governança da operação do setor elétrico”, disse antes da sessão no Senado a União pela Energia.
“Sinaliza também que a tendência é de que, a cada MP, podem surgir novas decisões que afetam a concorrência no mercado de energia e perturbam a competição, alterando os resultados entre vencedores e perdedores do setor”, acrescentou a entidade.
Após a votação, a União pela Energia disse lamentar a aprovação dos jabutis e que seu foco agora estará no debate do projeto de lei de modernização do setor.
O setor reclama ainda de interferência do Congresso no planejamento, sem estudos técnicos prévios que justifiquem as medidas, ao definir volumes obrigatórios de contratação de determinadas fontes e locais para instalação de usinas.
“Atribuir ao Legislativo a atividade de planejamento, que é de cunho técnico, e interferindo no papel do MME [Ministério de Minas e Energia], da EPE [Empresa de Pesquisa Energética] e das diretrizes de politica energética do CNPE [Conselho Nacional de Política Energética], é um sinal ruim e introduz instabilidade regulatória”, reforça o presidente da consultoria PSR Energy, Luiz Barroso.
Para a Abradee (Associação Brasileira das Distribuidoras de Energia Elétrica), “o texto final da MP traz pontos de preocupação em relação a custos que irão recair nas contas dos consumidores”. O segmento acabou sendo atingido no Senado com um jabuti que determina a abertura total do mercado de energia até 2026.
Essa medida garante que consumidores possam procurar seu próprio fornecedor de energia. A mudança já era alvo do projeto de modernização e as distribuidoras defendem que, se não for feito de forma organizada, transferirá aos consumidores de pequeno porte os custos da migração dos maiores para o mercado livre.
Setores beneficiados, por outro lado, rebatem as críticas e defenderam que a MP é benéfica ao consumidor. Para a Abegás (Associação Brasileira das Distribuidoras de Gás Canalizado), a contratação obrigatória de térmicas reduz o custo da energia e permite a construção de gasodutos para o interior do país.
” A medida irá contribuir para que o país produza cada vez mais gás natural, alocando o gás do pré-sal para os brasileiros”, afirmou.
A inclusão no texto aprovado de uma térmica no Triângulo Mineiro, área de atuação do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-RJ), ajuda a viabilizar um antigo projeto de gasoduto para Brasília. O Senado ampliou de 6.000 para 8.000 MW (megawatts) o volume obrigatório de térmicas.
Essas usinas operariam por pelo menos 70% do tempo, inflexibilidade necessária para justificar a construção de grandes gasodutos. Não foram definidos os locais, mas o presidente da Abegás, Augusto Salomon, diz que a tendência é que os novos projetos sejam construídos perto de grandes linhas de transmissão.
Também beneficiado, o setor de pequenas centrais hidrelétricas (PCHs) agradeceu ao trabalho dos relatores da MP, o deputado federal Elmar Nascimento (DEM-BA) e o senador Marcos Rogério (DEM-RO).
Para o presidente da Abragel (Associação Brasileira de Geração de Energia Limpa, entidade que representa as PCHs), Charles Lenzi, a aprovação do texto “é um reconhecimento do Senado que reforça o entendimento da importância desse setor dentro do contexto da geração de energia limpa e renovável”.