Além da extrema pobreza, famílias não têm esgoto

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Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Grande parte dos brasileiros ainda não tem acesso a saneamento básico, incluindo acesso à água potável e à rede de coleta de esgoto, segundo dados divulgados no estudo As Despesas da Família Brasileira com Água Tratada e Coleta de Esgoto, feito com base em dados de 2018 pelo Instituto Trata Brasil. Considerando a população que mora em unidades de consumo abaixo da linha de pobreza no país, 67,5% não tinha acesso à rede de esgotos em 2018. O pior resultado está na Região Norte, onde 88% dessa população não tinha esgoto.

Mais da metade (51,7%) das pessoas residentes em unidades de consumo abaixo da linha da pobreza no país também não recebiam água com regularidade – diariamente e na quantidade exata. Nesse caso, o pior resultado é o da Região Nordeste, em que 62,8% das pessoas não tinham acesso regular à água. Os dados reforçam a associação entre pobreza e falta de acesso aos serviços de saneamento no Brasil, segundo o estudo.

As análises, que traçam um perfil das pessoas mais afetadas pela falta de saneamento básico no país, são baseadas em informações da Pesquisa de Orçamento Familiar (POF) do IBGE, no período de 2008 a 2018. O estudo apontou que uma em cada quatro famílias brasileiras – unidades de consumo – pertencem à classe de renda de até R$ 1,9 mil mensais, que é a mais prejudicada no acesso ao saneamento em relação às de rendas mais altas.

Para 60% das unidades de consumo que recebiam menos de R$ 1,9 mil por mês, não havia acesso à coleta de esgoto. Além disso, 45,8% das famílias nessa mesma faixa de renda não tinham acesso regular à água tratada. Em famílias com rendimento médio mensal entre R$ 1.908,01 a R$ 2.862,00, a falta de redes de esgoto ainda chegou em 48,5% e a falta d’água regular atingiu 35%.

O levantamento apontou ainda que a situação das famílias que moram nas capitais é melhor: 78,9% das famílias que moram nessas áreas tinham acesso à rede geral de coleta de esgoto em 2018; enquanto 70% das famílias que moram em regiões metropolitanas tinham acesso à coleta; e 51,4% nas demais cidades dos estados tinham acesso ao serviço.

“É extremamente preocupante ver que os mais privados dos serviços são justamente as pessoas abaixo da linha da pobreza, fato que se repete ao longo dos anos. Até mesmo o atendimento irregular de água é muito mais comum nas casas dos mais pobres, o que também aumenta a vulnerabilidade pelo fato daquela família não receber água encanada 24 horas por dia e 7 dias por semana”, disse um dos autores do estudo, o pesquisador e economista Fernando Garcia de Freitas.

Segundo Freitas, o estudo oferece um olhar clínico muito relevante e chama a atenção de empresas operadoras, agências reguladoras e autoridades para a urgência de todos terem acesso aos serviços, de forma a que os custos sejam aqueles que caibam no orçamento familiar.

O estudo revelou que as despesas relativas com saneamento diminuem conforme cresce a classe de rendimentos, o que significa que o peso das despesas com esses serviços é maior nas famílias mais pobres. Em 2018, as unidades de consumo com renda superior a R$ 23,8 mil gastavam 0,33% de sua renda com saneamento, enquanto as unidades de consumo com renda inferior a R$ 1,9 mil gastavam 3,69% no mesmo serviço.

Mesmo considerando a população em geral, os números revelam deficit no acesso ao saneamento, já que 29,7% das pessoas não tem acesso à rede de abastecimento de água e 39% não tem acesso à rede de coleta de esgoto. Em ambas as situações, a Região Norte apresenta os piores índices, com 50,3% e 81,2%, respectivamente.

Os índices de acesso aos serviços de saneamento registrados pelas populações negra – parda e preta – e indígena são piores do que aqueles da população branca e amarela. O percentual de 32% da população preta não têm abastecimento de água e 37,7% não têm rede de esgoto; 36,5% da população parda não tem água e 48,7% não tem esgoto; e 33,7% dos indígenas não têm água e 45,2% não tem esgoto. Enquanto 22,5% da população branca não tem água e 29,8% não tem acesso a sistema de coleta de esgoto e 15,7% da população amarela não tem água e 20,4% não tem esgoto.

O estudo identificou também carência maior entre população jovem, com idade até 19 anos. Um terço dessa população não tinha acesso à água em 2018 e 44,2% não tinha acesso à coleta de esgoto. No grupo de pessoas “sem instrução educacional”, também o mais afetado pela falta de saneamento, o deficit de serviço de coleta de esgoto prevaleceu em dois terços da população e o deficit de abastecimento regular de água tratada ultrapassou 50%.

A sanção do novo Marco Legal do Saneamento Básico, que completa um ano nesta quinta-feira, tem como objetivo alcançar a universalização dos serviços de saneamento básico até 2033, garantindo que 99% da população brasileira tenha acesso à água potável e 90%, ao tratamento e à coleta de esgoto.

A votação das mudanças no marco legal gerou opiniões divergentes sobre os efeitos da iniciativa. Associações empresariais acreditam que haverá mais condições de investimento e ambiente de negócio para ampliação dos serviços de saneamento. Já algumas entidades da sociedade civil temem que a medida privatize o acesso a recursos hídricos, inviabilize o financiamento das redes mais onerosas e deixe a universalização do saneamento fora de perspectiva.

O Ministério do Desenvolvimento Regional autorizou, nesta quarta-feira (14), a liberação de R$ 38,4 milhões para a continuidade de obras de saneamento básico no Distrito Federal e em 13 estados: Bahia, Ceará, Goiás, Minas Gerais, Mato Grosso, Pará, Paraíba, Piauí, Paraná, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e São Paulo.

Segundo o ministério, desde janeiro, R$ 243,6 milhões do Orçamento Geral da União (OGU) foram repassados pela pasta para garantir a continuidade de empreendimentos de saneamento básico. Mais R$ 696,4 milhões foram assegurados para financiamentos por meio do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e outros fundos federais financiadores.

Com Agência Brasil

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