Bolsonaro se joga na política que criticava
Foto: Reprodução/Twitter
O senador Ciro Nogueira (PP-PI) aceitou o convite feito pelo presidente Jair Bolsonaro para ser o novo ministro da Casa Civil. Enquanto aguarda a nomeação ser oficializada, o parlamentar já se movimenta para cumprir as missões delegadas pelo chefe do Executivo, em especial, a de melhorar a interlocução do governo com o Congresso Nacional.
Depois da reunião, na manhã de ontem, com Bolsonaro e outros ministros no Palácio do Planalto para confirmar a entrada no governo, Nogueira fez um primeiro contato com colegas de Parlamento para mostrar que está disposto a estreitar a relação entre os Poderes. O futuro novo ministro tem bom trânsito entre deputados e senadores por ser um dos principais expoentes do Centrão no Congresso. Nas conversas, ele informou que quer recuperar as funções originais da Casa Civil, especialmente a de assistir Bolsonaro na coordenação política do governo.
Esse ponto é importante para os parlamentares porque a interlocução de Luiz Eduardo Ramos, que deixará a pasta para assumir a Secretaria-Geral da Presidência, nunca conseguiu agradar totalmente o Congresso. Com quase três décadas de vida legislativa, Nogueira quer virar essa página e indicou que dará mais ouvido aos interesses do Parlamento. Esse trabalho deve garantir que deputados e senadores consigam indicar recursos do Orçamento federal para suas bases eleitorais e, em contrapartida, ampliar o apoio a Bolsonaro, que aposta no jogo de interesses para não ver o governo derrotado no Congresso.
Entre os assuntos mais urgentes para o governo, estão as sabatinas do advogado-geral da União, André Mendonça, indicado para o Supremo Tribunal Federal, e do procurador-geral da República, Augusto Aras, escolhido por Bolsonaro para seguir na instituição por mais dois anos. Além disso, o Congresso se mobilizará, no próximo mês, para analisar o possível veto do presidente ao fundão eleitoral de R$ 5,7 bilhões. Como há a promessa por parte do chefe do Executivo de propor que o fundo no ano que vem seja de R$ 4 bilhões, Nogueira terá de convencer parlamentares a concordar com a redução aprovada pelo Legislativo na primeira quinzena deste mês.
A maior aproximação de Bolsonaro com o Centrão, com a chegada de Nogueira, é uma tentativa de estancar as crises pelas quais passa o Executivo. Se, na campanha eleitoral de 2018, o então candidato ao Planalto levantou a bandeira da rejeição à “velha política” e ao “toma lá, dá cá”, agora se rende às práticas que ele criticou por ser ameaçado por pedidos de impeachment, estar em queda na popularidade e enfrentar denúncias de corrupção no governo, reveladas na CPI da Covid.
Com a estratégia, Bolsonaro também age pensando em 2022. Ele espera que a presença de Nogueira no governo aumente a sua popularidade no Nordeste, onde o seu principal rival, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), tem um forte eleitorado. “Conheço o Ciro de algum tempo. No Nordeste, era quase impossível você fazer campanha sem estar com o PT ao teu lado. Eu reconheço isso. E as pessoas mudam. O Ciro está feliz. Ele falou para mim que o sonho dele era ocupar um ministério como esse”, disse Bolsonaro, ontem, à Rede Nordeste de Rádio.
Nas redes sociais, Nogueira, que é réu na Lava-Jato, agradeceu a confiança de Bolsonaro. “Acabo de aceitar o honroso convite para assumir a chefia da Casa Civil, feito pelo presidente. Peço a proteção de Deus para cumprir esse desafio da melhor forma que eu puder, com empenho e dedicação em busca do equilíbrio e dos avanços de que nosso país necessita”, escreveu o parlamentar, que também disse estar “muito feliz em fazer parte do time de ministros”. Ele ainda pediu o apoio do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que fez uma pausa no recesso parlamentar e veio a Brasília unicamente para participar da reunião de ontem.
A posse do senador deve ser concretizada ao longo desta semana. Para ocorrer, Bolsonaro tem de assinar uma medida provisória (MP) para criar o Ministério do Emprego e da Previdência, antigo Trabalho. No início da gestão do presidente, a pasta perdeu o status de ministério e suas atribuições foram repassadas ao ministro da Economia, Paulo Guedes. Agora, voltará a ter espaço na Esplanada para que Bolsonaro faça a dança das cadeiras necessária à acomodação do líder do Centrão no governo. A nova pasta será chefiada por Onyx Lorenzoni, que sairá da Secretaria-Geral para dar espaço a Ramos.
Também com uma publicação na internet, o general deu as boas-vindas a Nogueira e disse que dará o “seu melhor” no próximo cargo. “Seja bem-vindo, Ciro Nogueira, ao time Jair Bolsonaro. Desejo muito sucesso na Casa Civil. Agradeço aos servidores que estiveram comigo nessa jornada e sigo em nova missão determinada pelo presidente da República na Secretaria-Geral.Tenham certeza de que, mais uma vez, darei o meu melhor em defesa do Brasil”, acrescentou ele que, dias antes, disse ter se sentido atropelado com a mudança.
Quando soube, na semana passada, que seria retirado da Casa Civil, e da articulação do governo, o general Luiz Eduardo Ramos se disse surpreendido com a notícia. “Eu não sabia, estou em choque. Fui atropelado por um trem, mas passo bem”, afirmou, ao Estadão. “O presidente é ele, eu sou soldado, cumpro missão. Aprendi, em 47 anos de vida militar, que soldado não escolhe missão. Se ele me der outra no governo, aceito”, acrescentou.
O senador Ciro Nogueira (PP-PI) é alvo de duas denúncias criminais e três inquéritos que apuram suspeitas de suborno e distribuição de propinas. O histórico judicial do parlamentar tem paralelo com o perfil que o presidente Jair Bolsonaro prometia expurgar ao ser eleito, em 2018, sob a promessa de acabar com a velha política e de romper com fiadores do PT. Nogueira é o presidente do partido que se sagrou como o mais implicado na Operação Lava-Jato e ascendeu política e financeiramente durante os governos de Lula e Dilma Rousseff.
Desde que Bolsonaro aprofundou sua ligação com o Centrão para se livrar de pedidos de impeachment e ter governabilidade, o passado de Nogueira foi considerado um mero detalhe pelo Palácio do Planalto. Com a fluidez política que lhe é característica, Nogueira foi de lulista a integrante do primeiro escalão de Bolsonaro.
O presidente Jair Bolsonaro admitiu, ontem, que, apesar de seu governo, inicialmente, ter escolhido seus ministros baseado em questões técnicas, “pouco políticas”, foi necessário se moldar em busca de apoio e entendimento com o Congresso.
“Tive a oportunidade ímpar, como chefe do Executivo, de escolher nosso ministério, baseado em questões técnicas. Abandonamos um pouco a questão política, mas vimos que era necessário, cada vez mais, buscar o apoio e entendimento do Parlamento brasileiro”, afirmou. “Fomos nos moldando, mas, desde o início, aquela bandeira colocamos em prática: o efetivo combate à corrupção”, emendou, em discurso na cerimônia de lançamento do Sistema de Integridade Pública do Poder Executivo Federal, no Palácio do Planalto.
Na solenidade, Bolsonaro insistiu que não existem acusações de corrupção contra o governo, apesar das recentes denúncias de irregularidades na aquisição de vacinas contra a covid-19 pelo Ministério da Saúde. Em escândalo recente, o ex-chefe da pasta Eduardo Pazuello prestou depoimento à CPI da Covid, no qual negou ter participado de negociações de compra de imunizantes, contraditado por vídeo em que aparece numa reunião com intermediários interessados na venda de doses da CoronaVac por valor superior ao oferecido pelo Instituto Butantan.
“Dois anos e meio (de governo) sem qualquer acusação de corrupção realmente é uma coisa fantástica. Mas não consideramos virtude, é obrigação. É o mínimo que podemos fazer com nossa população”, destacou.
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