TSE dá decisões diferentes para casos iguais de abusos de candidatos
Foto: Marcelo Camargo / Agência O Globo
Em Cafelândia (SP), 20 candidaturas à Câmara Municipal foram cassadas pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) no ano passado por uso de “laranjas”. Os elementos que resultaram em condenação neste processo, votação ínfima, pouca ou nenhuma movimentação financeira e ausência de propaganda, levaram a um resultado oposto seis meses depois, quando o mesmo tribunal rejeitou uma denúncia do Ministério Público Eleitoral de candidaturas de fachada em Pedro Laurentino (PI).
Como não há jurisprudência consolidada sobre candidaturas-laranja no TSE, tribunais de todo o país estão dando sentenças conflitantes para casos que analisam a fraude em que os partidos inscrevem mulheres apenas para atingir o mínimo exigido de 30% de candidaturas femininas. Advogados eleitorais ouvidos pelo GLOBO dizem que há um cenário de “loteria judicial” e que isso pode levar partidos a continuarem burlando a regra de cotas eleitorais.
— Essa falta de clareza sobre as provas necessárias gera um cenário de completa ‘loteria judicial’, o que resvala, inclusive, na vontade de mais mulheres participarem da política, já que o cenário é tão incerto — diz a professora de Direito e integrante do Núcleo de Gênero e Direito da FGV-SP Luciana Ramos.
Nos casos de laranja que chegaram ao TSE e que terminaram sem condenação, a Corte tem alegado falta de “robustez” das provas, mesmo quando há indícios como falta de votação, propaganda e recursos partidários para as candidaturas. No caso de Pedro Laurentino, por exemplo, o acórdão cita o “benefício da dúvida”, além da ausência de “provas robustas”. Presente na sessão, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso foi um dos três que votaram a favor da cassação dos registros e acabou vencido.
“As candidatas não obtiveram qualquer voto. Não tiveram movimentação financeira, não produziram material de campanha. Esses fatos comprovam, a meu ver, o objetivo de burlar o comando legal”, afirmou Barroso em seu voto.
Procurado pelo GLOBO, o ministro disse que, na sua opinião, a jurisprudência na matéria é “bastante consistente” e que, apesar de ajudarem na demonstração da candidatura fictícia, element os como ausência de movimentação financeira ou entrega de prestações de contas padronizadas exigem uma análise “cuidadosa”.
— É possível que uma candidata real desista legitimamente de sua candidatura, não obtenha apoio financeiro ou não consiga votação significativa nas urnas — afirmou o presidente do TSE ao GLOBO.
Soma-se à dificuldade de reunir provas, o fato de que raramente uma candidata laranja ou algum beneficiado pela irregularidade admite a prática:
— Sobretudo nas cidades pequenas, é muito difícil a prova testemunhal, tendo em vista todo o assédio, as pressões e o próprio medo de se comprometer cassando poderosos — afirmou o advogado e coordenador acadêmico da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político, Renato Ribeiro de Almeida.
Nas instâncias inferiores, há situações parecidas com a de Cafelândia e Pedro Laurentino. Ao analisar um caso de Penápolis (SP), um juiz afirmou que seria “temerário” dar prosseguimento à ação cuja candidata denunciada recebeu apenas três votos, não apresentou prestação de contas e sequer fez propaganda de si mesma — ela ainda divulgou a candidatura da filha, que é presidente do mesmo partido e, em tese, sua concorrente. O magistrado considerou que as provas não constituíam indício de fraude.
Já numa ação movida em Mauá, na Região Metropolitana de São Paulo, uma juíza suspendeu liminarmente a diplomação dos candidatos eleitos por um partido porque uma das candidatas não recebeu votos e não movimentou suas contas de campanha.
— Vemos que há todo tipo de decisão, inclusive por não punir o partido, apesar de uma série de provas. O problema é que se não há penalidade, as siglas se sentem autorizadas a continuar com a prática dos pleitos futuros — afirma a advogada Maíra Recchia, coordenadora geral do Observatório de Candidaturas Femininas da OAB-SP.
Por outro lado, a exigência de provas que complementem indícios como votação zerada e nenhum gasto, protege a vontade das urnas, segundo a advogada e cientista política Fernanda Cordeiro de Oliveira:
— A Justiça Eleitoral deve sempre coibir as práticas nefastas que possam influenciar no livre exercício do sufrágio, até mesmo como meio de legitimar o exercício da representatividade política a partir de um processo eleitoral justo e transparente — disse Fernanda, especialista em direito eleitoral.
Outra crítica de especialistas é que, mesmo quando a irregularidade é comprovada, os dirigentes partidários ficam livres da punição. Em 2019, quando o TSE julgou um caso de Valença (PI), abriu o precedente de cassar toda a chapa eleita em uma situação de irregularidade da participação feminina. Os responsáveis por coordenar as candidaturas, porém, não foram citados.
Apesar de a legislação eleitoral de 1997 já falar sobre reserva mínima de 30% das candidaturas proporcionais (vereadores e deputados) para cada gênero, apenas em 2009, com a minirreforma eleitoral, o preenchimento das vagas com mulheres candidatas passou a ser obrigatório. Ainda que haja casos de fraudes nas eleições de 2014 e 2016, foi no pleito de 2018 que o uso de candidatas de fachada passou a ser enfrentado de forma mais contundente pela Justiça Eleitoral.
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