Bolsonaro chama golpe de “antídoto” e faz ameaças

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Foto: Reprodução

Numa nova escalada na crise institucional aberta com o Judiciário, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) reagiu nesta quarta-feira (4) à sua inclusão como investigado no inquérito das fake news e disse, em tom de ameaça, que o “antídoto” para a ação não está “dentro das quatro linhas da Constituição”.

“Ainda mais um inquérito que nasce sem qualquer embasamento jurídico, não pode começar por ele [pelo Supremo Tribunal Federal]. Ele abre, apura e pune? Sem comentário. Está dentro das quatro linhas da Constituição? Não está, então o antídoto para isso também não é dentro das quatro linhas da Constituição”, disse Bolsonaro, em entrevista à rádio Jovem Pan.

A crítica de Bolsonaro se refere ao fato de o inquérito das fake news —e a sua inclusão nesta quarta como investigado— ter sido aberto de ofício, e não a pedido da PGR (Procuradoria-Geral da República).

No caso do inquérito das fake news, a abertura ocorreu por decisão pelo então presidente do STF Dias Toffoli e posteriormente referendado pelo plenário da corte.

A inserção de Bolsonaro como alvo da investigação, por sua vez, ocorreu a pedido do presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), Luís Roberto Barroso.

A ameaça de agir fora dos limites constitucionais foi repetida em outras ocasiões na entrevista.

“O meu jogo é dentro das quatro linhas [da Constituição]. Se começar a chegar algo fora das quatro linhas, eu sou obrigado a sair das quatro linhas, é coisa que eu não quero. É como esse inquérito, do senhor Alexandre de Moraes. Ele investiga, pune e prende? É a mesma coisa”.

Em outro momento, ele disse: “Estão se precipitando. Um presidente da República pode ser investigado? Pode. Num inquérito que comece no Ministério Público e não diretamente de alguém interessado; esse alguém vai abrir o inquérito, como abriu? Vai começar a catar provas e essa mesma pessoa vai julgar? Olha, eu jogo dentro das quatro linhas da Constituição. E jogo, se preciso for, com as armas do outro lado. Nós queremos paz, queremos tranquilidade. O que estamos fazendo aqui é fazer com que tenhamos umas eleições tranquilas ano que vem.”

Bolsonaro concedeu a entrevista ao lado do deputado Filipe Barros (PSL-PR), relator de uma PEC (proposta de emenda à Constituição) que institui o voto impresso. O projeto é defendido por Bolsonaro, que tem lançado suspeitas e questionamentos sobre sistema eletrônico de votação.

O presidente tem afirmado, sem apresentar provas, que as últimas eleições presidenciais foram fraudadas. Ele também alega que as urnas eletrônicas são vulneráveis a adulterações —afirmações que o TSE rechaça.

Na entrevista desta quarta, Bolsonaro voltou a alimentar a tese falsa de que ele teria sido eleito em primeiro turno.

O presidente venceu o segundo turno das eleições de 2018, numa disputa com Fernando Haddad (PT). O resultado final foi 53,13% para o atual presidente contra 44,87% para o petista.

“Eu volto a dizer, pelo meu sentimento, pelas minhas andanças pelo Brasil, pelo que aconteceu: nós ganhamos disparado no primeiro turno”, declarou.

Na entrevista, Barros apresentou o que ele diz ser um inquérito em que o próprio TSE teria reconhecido que um hacker invadiu o sistema interno do tribunal.

De acordo com Bolsonaro e o deputado, isso mostraria a fragilidade das urnas eletrônicas

Em uma rede social, o presidente da comissão especial que analisa a PEC do voto impresso, Paulo Eduardo Martins (PSC-PR), afirmou que os documentos apresentados por Barros e por Bolsonaro “possuem conteúdo grave e a situação exige uma investigação séria”. “É de interesse de todos que zelam pela democracia”, escreveu.

A Folha recebeu, na semana passada, o inquérito citado na entrevista e consultou diversos especialistas e uma pessoa envolvida na investigação, que foram unânimes: o inquérito não conclui que houve fraude no sistema eleitoral em 2018 ou que poderia ter havido adulteração dos resultados, ao contrário do que disse o mandatário.

Bolsonaro também desferiu novos ataques contra Barroso, a quem chamou de mentiroso.

Em nota à imprensa, na madrugada desta quinta (5), o TSE disse, em referência ao inquérito da Polícia Federal que apura ataque ao seu sistema interno em 2018, que o episódio foi divulgado na época em vários veículos de comunicação e não representou qualquer risco à integridade das eleições.

“Isso porque o código-fonte dos programas utilizados passa por sucessivas verificações e testes, aptos a identificar qualquer alteração ou manipulação. Nada de anormal ocorreu”, afirma a nota.

O TSE diz também que o código-fonte é acessível aos partidos políticos, à OAB, à Polícia Federal e a outras entidades que participam do processo. “Uma vez assinado digitalmente e lacrado, não existe a possibilidade de adulteração. O programa simplesmente não roda se vier a ser modificado”, diz o tribunal.

Na nota, o TSE reafirma que as urnas eletrônicas não entram na rede. “Por não serem conectadas à internet, não são passíveis de acesso remoto, o que impede qualquer tipo de interferência externa no processo de votação e de apuração”.

“O próprio TSE encaminhou à Polícia Federal as informações necessárias à apuração dos fatos e prestou as informações disponíveis. A investigação corre de forma sigilosa e nunca se comunicou ao TSE qualquer elemento indicativo de fraude”, aponta o tribunal na nota à imprensa.

Segundo o TSE, de 2018 para cá novas camadas de proteção foram incluídas no cenário mundial de cybersegurança, o que aumenta a segurança dos sistemas informatizados.

“Por fim, e mais importante que tudo, o TSE informa que os sistemas usados nas eleições de 2018 estão disponíveis na sala-cofre para os interessados, que podem analisar tanto o código-fonte quanto os sistemas lacrados e constatar que tudo transcorreu com precisão e lisura”, finaliza a nota.

Folha de S. Paulo

 

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