Bolsonaro impede entrega de vacinas a governadores adversários

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Foto: ROBERTO CASIMIRO/FOTOARENA/FOTOARENA/ESTADÃO CONTEÚDO

A distribuição de vacinas é o mais novo capítulo da briga pública entre governo federal e estados durante a pandemia. O Ministério da Saúde é acusado de desobedecer a divisão de doses entre os estados e o debate ganha contornos políticos.

Com falhas de distribuição, a pasta tem hoje cerca de 7,9 milhões de doses estocadas, segundo levantamento do painel “Quantas doses?”, do analista de dados Apolinário Passos. Órgãos que fazem o controle de qualidade das vacinas indicam que não são responsáveis pelo atraso nos repasses.

O UOL procurou o Ministério da Saúde para checar a quantidade oficial em estoque e o motivo do represamento, mas não obteve retorno até a publicação desta reportagem.

O represamento tem sido alvo de críticas dos governadores João Doria (PSDB) e Helder Barbalho (MDB), de São Paulo e do Pará, e do prefeito Eduardo Paes (PSD), do Rio de Janeiro —cidade que nesta semana interrompeu por dois dias a vacinação por falta de estoque.

As autoridades dizem que vacinação precisa avançar para conter casos e mortes em decorrência da covid-19 e a disseminação da variante delta, mais transmissível.

Antes de chegar aos estados, as vacinas recebidas pelo Ministério da Saúde passam por controle de qualidade. Depois, são distribuídas às unidades federativas, responsáveis por entregar a cada município.

O Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde (INCQS/Fiocruz) —um dos órgãos que fazem essa análise— informou ao UOL que as vacinas são liberadas em até 24 horas.

Já a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) diz que a liberação é feita “em horas”, mesmo nos fins de semana, e que “o licenciamento da importação pode ser iniciado mesmo antes da chegada das vacinas ao país”.

O painel “Quantas doses?” mostra contudo que um lote de vacinas chegou ao Brasil em 5 de agosto e ainda não tem previsão de distribuição.

Ontem, a Anvisa informou que não havia qualquer dose sob sua tutela para controle de qualidade.

Na semana passada, Doria inaugurou um novo capítulo no embate público com o governo federal.

No dia 4, Doria disse ter recebido apenas 10% da remessa total do ministério, quando o pacto federativo estabelece que, por causa da população, São Paulo fique com 22,6%. Isso resultaria em um déficit de 228 mil doses da Pfizer/BioNTech.

O governador chamou a decisão de arbitrária e indicou que ela seria proposital. “O governo federal já fez maldades demais com o Brasil e agora quer adicionar uma dose a mais de maldade a São Paulo.”

O ministério argumentou que o envio foi menor “para compensar”. Dois dias depois, o secretário estadual de Saúde, Jean Gorinchteyn, foi a Brasília encontrar o ministro Marcelo Queiroga, mas não chegaram a um consenso.

Queiroga não só confirmou o envio menor como disse que São Paulo recebeu mais doses do que deveria. Revoltado, Gorinchteyn voltou a ameaçar o Ministério da Saúde de judicialização.

Nesta semana, a história ganhou um novo capítulo quando o ministério prometeu enviar 50 mil doses extra da vacina, como parte do acordo para sanar o déficit. Na quarta (11), Doria disse que não recebeu a remessa e provocou Queiroga: “Meu pai me ensinou a não mentir”.

O Ministério da Saúde não enviou as doses que prometeu enviar a São Paulo. O Ministério da Saúde descumpriu o acordo que fez comigo e com o Jean, feito pelo ministro da Saúde, Marcelo Queiroga. Não entregou nem 228 mil [doses], nem 220 mil e nem 50 mil.”
João Doria, governador de São Paulo

Em resposta ao UOL, a pasta afirmou que as “50 mil doses extras” foram entregues junto às 241.020 doses da Pfizer enviadas ao estado na terça (10). Como tréplica, a secretaria paulista confirmou o recebimento das doses, mas negou que sejam extras.

Sem acordo, a confusão segue com contornos cada vez mais políticos. Caso o governador paulista vença as prévias do PSDB em novembro, ele o Bolsonaro podem se enfrentar nas eleições de 2022.

A cidade do Rio de Janeiro tinha a previsão de vacinar todos os adultos até o dia 18 deste mês. Mas, nas últimas três semanas, interrupções atrasam o calendário.

A primeira interrupção aconteceu em 23 de julho. Na ocasião, Paes deu uma alfinetada no Ministério da Saúde quanto ao ritmo da distribuição das vacinas. “Não é possível que isso fique parado um minuto que seja”, disse Paes.

Até o Rio retomar a vacinação, o prefeito criticou o senso de urgência do ministério, a quantidade entregue e a falta de celeridade nas entregas. Em 26 de julho, o ministério anunciou que novas remessas chegariam ao estado.

Com isso, expôs também uma marca de Paes no imbróglio: não deixar de elogiar quando julga necessário. Na mesma data, o prefeito agradeceu a “parceria” do ministro Queiroga. A vacinação foi retomada no dia 28.

Por duas semanas, a vacinação correu como o planejado na capital. Chegou a bater o recorde de vacinas aplicadas em uma só semana —451 mil doses entre 1º e 8 de agosto.

Mas, poucos dias depois, outra interrupção. Na terça (10), a cidade anunciou que só conseguiria manter a primeira dose para pessoas com 50 anos ou mais, gestantes, puérperas, lactantes e pessoas com deficiência. Com isso, a vacinação ficou interrompida na terça e na quarta (12).

Paes chegou a fazer uma tabelinha com Doria —o prefeito pediu ao governador o envio direto de doses de Coronavac, produzidas pelo Instituto Butantan, e ouviu de Doria que o governo federal é “incompetente”.

Com a retomada de hoje, porém, o Rio só garante aplicar a primeira dose por mais dois dias. Em nota, a Secretaria Municipal de Saúde afirma que precisa receber mais vacinas para continuar com o calendário a partir da segunda-feira (16).

Pará também diz ter recebido menos doses
Em pronunciamento na terça, o governador do Pará, Helder Barbalho (MDB), também acusou o governo federal de distribuir proporcionalmente menos doses ao estado e, como São Paulo, disse ter acionado a PGE (Procuradoria Geral do Estado) para judicializar a questão.

Nós somos o segundo estado com menor número de vacinas até o momento. E nós não podemos aceitar isso. Não queremos nada a mais que os demais estados, mas não aceitamos também nada a menos
Helder Barbalho, governador do Pará

“Me disse o Queiroga que o ministério estará recompondo essa quantidade e que, a partir das próximas entregas, o Pará será restituído”, declarou o governador.

Uol

 

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