
Militar reformado sugere como enquadrar PMs insubordinados
Foto: Claudio Belli/Valor
Major da reserva da Polícia Militar do Rio de Janeiro, onde atuou por 21 anos, o cientista político Luiz Alexandre Souza da Costa, de 48 anos, afirma que PMs têm muito medo de duas coisas: perder o emprego e ficar preso pela Justiça. Diante da politização dos quartéis, com a mobilização do presidente Jair Bolsonaro para atos de cunho golpista no feriado de 7 de setembro, a primeira alternativa de punição para os policiais, lembra o professor em direito militar, tem baixo potencial de inibir a participação da elite de oficiais das corporações estaduais, pela dificuldade de demiti-los, embora possa conter aqueles que ocupam as patentes mais inferiores: “Os praças – soldados, cabos, sargentos e subtenentes – você consegue mandar embora muito rápido”. Mas é no aumento do risco de prisão, defende Costa, a melhor saída para se evitar que as manifestações bolsonaristas na terça-feira transformem a Polícia Militar na ponta de lança de uma ruptura institucional nos moldes do que ocorreu na Bolívia, em 2019.
Costa lembra que o Rio de Janeiro já foi palco de uma “experiência empírica” bem-sucedida, quando bombeiros invadiram o quartel central da corporação, em 2011, na capital, levando à prisão em flagrante, por motim, de 439 participantes. Um dos líderes à época era o Cabo Daciolo, que por meio do movimento grevista catapultou carreira política a deputado federal, com candidatura à Presidência em 2018. “Isso aí teve um efeito muito grande na tropa e, após essa prisão, praticamente se extirpou o movimento paredista, não fizeram mais manifestações. Normalmente, [a prisão] tem o poder de debandar o movimento. Agora, se ninguém fizer nada, se os comandantes-gerais, os comandantes de áreas, não fizerem nada, é uma omissão criminosa”, diz.
Integrante do Laboratório de Estudos Políticos de Defesa e Segurança Pública do Iesp-Uerj, Costa destaca a importância do papel dos Ministérios Públicos estaduais para conter a politização dos quartéis, sobretudo em caso de omissão do comando da PM. Em sua opinião, “os governadores têm que agir com muita força em relação aos comandantes das polícias; e os comandantes com suas tropas”. Mas lembra que desde a sanção por Bolsonaro da Lei nº 13.967, de 2019, policiais e bombeiros militares – diferentemente das Forças Armadas – não podem mais ser punidos disciplinarmente com a perda de liberdade, com prisão no quartel por até 30 dias. “Os governadores têm menos um instrumento punitivo para conseguir segurar a tropa. Se for um crime, é necessário ter uma ordem judicial. Antes, só a transgressão disciplinar já era suficiente para botar esse sujeito preso”, afirma.
Por isso, ressalta Costa, cresceu de importância a utilização da lei penal militar, que prevê penas rigorosas contra crimes como motim; revolta; conspiração; organização de grupo para a prática de violência; omissão de lealdade militar; aliciação para motim ou revolta; e incitamento: “A revolta é um motim armado. Se esses militares se revoltam armados em prol de um golpe a pena é de oito até 20 anos de reclusão. Foi o que o [ministro do Supremo Tribunal Federal] Ricardo Lewandowski escreveu no artigo dele [no fim de semana]. Você tem consequências”.
Para o cientista político, os comandantes das instituições deveriam sinalizar agora para a aplicação do Código Penal Militar. “O risco de golpe é uma coisa séria, e que tem que envolver de maneira muito forte o Poder Judiciário dos Estados, o Ministério Público e os governadores, pressionando os comandantes das polícias”, diz.
O major da reserva defende que o Ministério Público identifique “essas elites golpistas” nas Polícias Militares e comece a instaurar inquérito de prisão preventiva, caso o clima não favoreça uma detenção em larga escala, como ocorreu há dez anos, com os bombeiros do Rio. “Ah, não vai pedir prisão preventiva para todo mundo? Pede para os líderes então. Bota ali três, quatro, cinco na cadeia que o restante segura a onda. Isso aí – ficar preso preventivamente pela Justiça – o Ministério Público pode começar a fazer, com os PICs, procedimentos investigatórios criminais”, diz.
Luiz Alexandre Costa afirma que promotores do MP não precisam aguardar a corda arrebentar no dia das manifestações para agirem. “Não precisa nem esperar. Se tiver uma investigação e ela indicar que se está fazendo reuniões para se buscar um motim, com incitamento, aliciação, já pode começar a instaurar inquérito, e até pedir a prisão preventiva, a depender da gravidade da situação. Tem crimes no Código Penal Militar que só de você fazer algumas reuniões está cometendo crime, como é o caso do artigo 165, sobre reunião ilícita, que prevê detenção de seis meses a um ano”, diz.
A mesma antecipação vale para os comandantes-gerais. “Não se pode chegar ao ponto de o pessoal ir para a rua. Precisa tomar medidas preventivas. Já tem que proibir, publicar nos boletins diários da corporação quais crimes e transgressões estariam passíveis de responder, dizer que vai ser instaurado o inquérito policial militar, que o sujeito vai ser preso em flagrante, e que os comandantes-gerais concedam entrevistas aos jornais estaduais. Você avisa a corporação o que está acontecendo. Se deixar correr solto e no dia tem 500 policiais, quem vai lá prender esses 500 armados? Olha a tragédia, se houver uma troca de tiros”, alerta.
Costa explica que, quando o comando-geral quer dar uma notícia importante, a publica nos boletins internos diários por três dias consecutivos e determina aos comandantes dos batalhões que leiam essas determinações nas trocas de serviço. Dessa forma, conseguem que toda a tropa, que reveza diariamente para o serviço externo, tome conhecimento.
“Se esse movimento deslanchar, e o risco de começar neste feriado é grande, isso tem a tendência de virar uma onda. E aí, o 7 de setembro agora pode ser uma amostra do 7 de setembro do ano que vem, com Bolsonaro despencando nas pesquisas, dando vitória para o Lula. Aí o 7 de setembro de 2022 já me preocupa, realmente”, afirma.
Para Luiz Alexandre Costa, há muito tempo as polícias militares estão politizadas, em razão de movimentos paredistas – que são proibidos mas tradicionalmente recebem anistia. A busca por cargos eletivos fez crescer em 391% o número de PMs da ativa que concorreram a deputado federal e senador entre 2010 e 2018, aponta. Essa politização é maior que nas Forças Armadas, onde a maioria é temporária, formada por recrutas que ficam poucos anos na corporação, afirma. Costa estima em 750 mil o número de policiais na ativa e na reserva – como ele, que tem duas pistolas e uma espingarda – que estão armados. Cerca de 80% seriam bolsonaristas. “Temos uma legislação penal militar muito forte que pode ser usada em desfavor desse pessoal, que está se arvorando a tutelar a democracia”, diz.
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