Contarato explica estímulo de Bolsonaro à homofobia

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Foto: Reprodução

Ex-delegado da Polícia Civil e primeiro senador da história a admitir publicamente que é homossexual, Fabiano Contarato (Rede-ES) ganhou os holofotes durante a sessão da CPI de Covid desta quinta-feira ao confrontar o empresário bolsonarista Otávio Fakhoury, responsável por ataques homofóbicos contra o parlamentar. Num desabafo emocionado, ele falou que, mais uma vez, estaria expondo seus filhos e seu marido, mas não poderia deixar passarem batidas as ofensas de Fakhoury, que prestou depoimento à comissão.

Embora sua a postura tenha repercutido agora, Contarato relatou ao GLOBO que ser alvo de investidas do gênero não é novidade para ele. Mas, de acordo com o congressista, elas se intensificaram a partir de 2019, primeiro ano de governo do presidente Jair Bolsonaro. Segundo o senador, não foi por acaso:

— As pessoas se sentem legitimadas pela conduta do presidente. Quando ele faz uma fala homofóbica, ele legitima as pessoas a reverberar aquilo que há de pior no ser humano. Antes do presidente, não que isso não existisse, mas as pessoas ficavam mais comedidas para verbalizar ou ofender, seja fisicamente ou moralmente. Isso é muito grave — disse Contarato, ao GLOBO.

E acrescentou:

— Bolsonaro já disse que se você tiver um vizinho gay, o seu imóvel diminui o valor. Não consigo conceber isso. O presidente é preconceituoso, sexista, racista, misógino, homofóbico, e isso ecoa na população e nos adeptos dele.

A fala do senador repercutiu imediatamente nas redes sociais. O trecho da sessão foi compartilhado por inúmeros perfis, incluindo de influenciadores da comunidade LGBTQIA+, e o nome do senador permaneceu entre os assuntos mais comentados do Twitter durante o dia. Na noite de ontem, Contarato publicou um agradecimento por “todas as mensagens de apoio e gestos de carinho, apoio e solidariedade”. O post teve mais de 35 mil curtidas até a manhã desta sexta-feira”.

A reação de ontem de Contarato na CPI remonta a um episódio visto no Twitter, em maio. Naquela ocasião, depois de a comissão colher o depoimento do ex-secretário especial de Comunicação Fabio Wajngarten, o senador comentou na rede social que ele deveria ter sido preso supostamente por ter mentido: “Há estado fragrancial (sic) configurado!”. Na verdade, ele quis dizer flagrancial (flagrante configurado). Fakhoury se aproveitou do deslize para praticar homofobia, ao postar em seguida:

“O delegado [Contarato], homossexual assumido, talvez estivesse pensando no perfume de alguma pessoa ali daquele plenário… Quem seria o ‘perfumado’ que lhe cativou?”, escreveu o empresário bolsonarista.

O senador disse que nunca sofreu uma ameaça de morte durante os seus 27 anos como delegado, mas que isso mudou a partir dos primeiros seis meses de mandato parlamentar, quando adotou postura contundente de oposição ao governo.

— Tenho observado que, mesmo sem ser membro da CPI, quando eu me manifesto na comissão para defender a ciência e criticar o comportamento do presidente, é sintomático, as redes voltam a me atacar, ofender a minha honra, minha família. Parece uma ação orquestrado. Mas eu tenho, desde o início do mandato, acionado a Polícia Legislativa e Federal para responsabilização criminal ou indenizatória por dano moral — afirmou.

O parlamentar destaca que a liberdade de expressão não pode servir de subterfúgio para ataques de qualquer natureza.

Ontem, na CPI da Covid, Contarato falou ao depoente, que o atacou nas redes sociais, sobre a importância da família:

— O senhor não é um adolescente. O senhor é casado, tem filhos. A sua família não é melhor do que a minha — afirmou o senador na quinta-feira.

O parlamentar já havia mencionado a família durante outras sessões da Casa, mas, nessas ocasiões, para defender a ampliação do direito à adoção. Em maio deste ano, ele apresentou proposta legislativa para estimular a adoção tardia. O texto foi aprovado em junho.

Senador Fabiano Contarato ao lado do marido e dos filhos Foto: Reprodução/Twitter

— [Meus filhos] são os meus pequenos, eles são a razão da minha vida, e esse amor que a gente tem é um amor incondicional. Adotar é um ato tão sublime que eu costumo dizer que, antes, eu pensava que era feliz. E depois, quando os meus filhos nasceram na minha vida, na vida do meu esposo, e falo isso com orgulho, eu descobri o que é felicidade. Que todas as pessoas que sonham em ter um filho se habilitem ao processo de adoção — afirmou Contarato, na ocasião.

Recentemente, em agosto, na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), o senador contou a parlamentares que ouviu de um promotor que não poderia ter filhos com o marido, o fisioterapeuta Rodrigo Groberio.

— Eu, casado, me habilitei [para a adoção], e Deus me deu meu o anjo Gabriel com 2 anos e 8 meses. E quando entrei com o processo de adoção, um membro do Ministério Público teve a ousadia de escrever que ele era contra, porque falava que um filho só poderia ter filiação de um pai e uma mãe. Jamais de dois pais — lembrou.

Contarato classificou o posicionamento como uma violência contra ele:

— Vocês não sabem o que é ouvir isso. Vocês não têm noção do ato de violência que isso me atinge. Com um mês eu era pai. Com um mês, Gabriel já chamava Rodrigo (marido de Contarato) de papai. Eu tinha sido eleito senador. E todas as vezes que eu viajava, eu tinha que autorizar o meu esposo a trazer o nosso filho, porque um promotor foi preconceituoso, foi homofóbico.

Em dezembro do ano passado, após a decisão ser revertida, Contarato entrou com um processo, e o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) decidiu punir o promotor, que ficou afastado por cinco dias.

No primeiro ano de mandato, em 2019, Contarato teve que recorrer à Justiça contra um auditor de tributos municipais da Serra, no Espírito Santo, após receber áudios que continham xingamentos e ameaças. Nas gravações, o homem proferia xingamentos homofóbicos: “viado, vagabundo assim tem que entrar na porrada”.

Eleito como o senador mais votado do Espírito Santo em 2018, Contarato venceu a disputa na esteira do movimento a favor da Operação Lava Jato, com 1.117.036 dos votos.

Com o passar do tempo, entretanto, ele se aproximou de pautas progressistas, identificadas com partidos de esquerda. O senador chegou a se reunir com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em maio deste ano, quando recebeu convite de filiação para o PT.

Além disso, o parlamentar se colocou como um dos principais opositores ao governo Jair Bolsonaro, apresentando diversas ações ao Supremo Tribunal Federal (STF) contra o presidente da República. Ele também protocolou uma petição na Corte em que pedia o afastamento de ministros, como Ricardo Salles, ex-titular da pasta do Meio Ambiente.

Ao GLOBO, na quinta-feira, Contarato contou que muitos dos seus eleitores dizem que ele os traiu por sua postura contra Bolsonaro, mas ele discorda.

— As pessoas estigmatizam que todo policial tem que ser bolsonarista. Eu falo que sou garantidor de direitos, não sou violador de direitos. Fico até ofendido quando me falam isso. Eu defendo as instituições e os poderes — afirmou ao GLOBO.

O Globo 

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