Moro ganha R$ 1,7 mi por ano e deve desistir de candidatura

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Foto: Cristiano Mariz/VEJA

Em julgamento mais racional do contexto político e pessoal, Sergio Moro parece ter um punhado de bons motivos para ficar longe de qualquer palanque em 2022, sobretudo aquele no qual a disputa promete ser mais sanguinolenta, o que pavimenta o caminho ao Palácio do Planalto. Pesa contra ele, por exemplo, a falta de experiência em embates do tipo, algo ainda mais complicado levando-se em consideração que os atuais líderes das pesquisas são Luiz Inácio Lula da Silva e Jair Bolsonaro, adversários experientes que não poupam munição nas cargas explícitas de populismo e estão entre os principais desafetos do ex-juiz. Outro dilema envolve trocar uma confortável carreira na iniciativa privada para mergulhar de cabeça nessa disputa eleitoral duríssima e de resultados incertos. Desde novembro, ele tem um contrato com a consultoria americana Alvarez & Marsal, que só se encerrará no fim de outubro de 2022 e, segundo rumores de mercado, rende uma remuneração perto de 1,7 milhão de reais ao ano. Satisfeita com o graduado funcionário, aliás, a empresa já estaria negociando a renovação do acordo nos mesmos termos financeiros. Por fim, caso resolva mesmo abrir mão desse belo emprego, terá também a dificuldade de escolher no campo congestionado da terceira via o melhor caminho para embarcar numa campanha.

Diante de todos esses senões, seria natural pedir escusas aos apoiadores e pular fora do que pode se tornar uma aventura perigosa. Mas o fato de Moro ainda abrir uma fresta à possibilidade de embarcar na corrida para 2022 movimenta políticos no seu entorno. O ex-juiz prometeu definitivamente bater o martelo em novembro, após a consolidação de dois fatos relevantes relacionados ao campo da terceira via: as prévias que vão definir o candidato do PSDB e a ratificação da fusão de DEM e PSL, que criará o União Brasil. A falta de um nome forte para se contrapor hoje aos extremos políticos representados por Lula e Bolsonaro alimenta a esperança de quem deseja ver Moro na campanha. Um levantamento recente feito pela Quaest mostrou que ele só fica atrás de Lula e Bolsonaro (veja o quadro). “O cenário é muito favorável para disputar contra Bolsonaro, que tem uma popularidade pior do que a de presidentes anteriores no terceiro ano de mandato”, afirma a socióloga Fátima Pacheco Jordão, especialista em pesquisas de opinião pública.

É esse tipo de avaliação que agita os políticos que gravitam hoje ao redor de Moro, a ponto de estarem sendo construídos os alicerces de uma possível campanha, com o discreto apoio do ex-juiz. A equipe já conta com marqueteiro, advogado e até uma “embaixatriz” disposta a pavimentar alianças. Uma das preocupações é a forma como ele será inserido na disputa. O Podemos, partido responsável pela estrutura oferecida, evita desde já o termo “terceira via” e tenta emplacar a versão de que Moro seria o “futuro”, enquanto Bolsonaro é o presente e Lula, o passado, ambos em condições de ser superados.

A legenda tem feito pesquisas qualitativas quinzenais sobre a imagem do possível candidato e compartilha com ele os resultados. Nelas, aparece ainda muito associado à luta contra a corrupção, bandeira que não pode ser empunhada pelos atuais favoritos, sobretudo Lula. Bolsonaro, por sua vez, também aparece associado a desemprego, inflação e fome. Como economia não é exatamente a praia de Moro, ele foi aconselhado a se aproximar de economistas respeitados, mas com o cuidado de não criar um “fiador”, como foi Paulo Guedes para Bolsonaro. O ex-presidente do Banco Central Persio Arida é um dos nomes. Caso decida seguir em frente, Moro sabe que precisará expandir o apoio partidário para além do pequeno Podemos. A presidente da sigla, Renata Abreu, que atua como “embaixatriz” da candidatura, leva o nome do ex-juiz a conversas com Novo, Patriota e PSL enquanto trabalha a pré-campanha com o marqueteiro Fernando Vieira e com a equipe jurídica do ex-ministro do TSE Joelson Dias.

Seja como candidato, seja como apoiador de um nome de centro, o certo é que a entrada de Moro no jogo de 2022 terá um impacto considerável nas eleições. Não por acaso, os presidenciáveis da terceira via procuram manter um contato amistoso com ele. Em setembro, Moro jantou com o ex-ministro Luiz Henrique Mandetta (DEM, futuro União) e o governador paulista João Doria (PSDB). Mantém ainda conversas com João Amoêdo (Novo) e com o Movimento Brasil Livre. Caso não decida concorrer ao Palácio do Planalto, uma possibilidade é a de entrar na disputa pelo Senado, por Paraná ou São Paulo. A amigos, que perguntam o que ele vai fazer, costuma apenas dizer: “Estou pensando”.

Na hipótese de encarar uma briga direta com Lula e Bolsonaro, o ex-juiz já sabe que levará chumbo forte dos dois lados. Apoiadores do atual presidente o atacam constantemente desde que rompeu com o governo e deixou o Ministério da Justiça acusando o capitão de deixar de lado a luta contra a corrupção. Enquanto isso, Lula, livre da Justiça, posa de injustiçado pelo carrasco Moro. A ida para a Alvarez & Marsal será fartamente explorada. Quando aceitou o convite, ele foi duramente questionado pelo fato de a companhia ter entre os seus clientes a Odebrecht, que foi bastante atingida pelas decisões do então juiz Moro. “Ele será alvo de uma campanha pesada dos adversários, que já têm estruturas para ataques na internet”, afirma Roberto Gondo, professor de comunicação política do Mackenzie. Para os entusiastas de sua candidatura, a esperança é a de que pesem na decisão o tratamento que recebeu de Bolsonaro e a maneira como foi humilhado na volta por cima de Lula. Mas ele não dá sinais aos interlocutores de que esteja em busca de uma redenção pessoal. Quando deixou a toga, Moro ouviu conselhos sobre as diferenças entre a vida partidária e a segurança da magistratura. Agora, caminha para optar entre a segurança da vida corporativa e as incertezas da política. O ex-juiz, por ora, não dá seu veredicto.

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