Oficial da PM aposentado desmascara farsa macabra de PMs
Foto: Reprodução
Um tenente-coronel de 71 anos, aposentado da Polícia Militar paulista, estava em viagem na madrugada de 11 de julho de 2021. Mas as câmeras de segurança da casa dele, na zona sul de São Paulo, permaneceram ligadas e flagraram uma farsa macabra de PMs da Força Tática do 27º Batalhão, acusados de assassinato.
O equipamento filmou um Volkswagen Voyage transitando lentamente por uma rua no Parque Cocaia, às 2h04, até estacionar de forma abrupta. A porta do motorista abre e um homem baleado cai com as mãos ao solo. Em seguida, chega uma viatura da Força Tática.
Três PMs descem do veículo oficial. Dois deles pegam o homem caído no chão e o colocam no banco de trás do Voyage. O terceiro policial militar assume o volante do automóvel —segundo as investigações, ele dirigiu por 1,5 km, seguido pelos colegas de farda, até o cruzamento das ruas Particular e Cultura Popular.
Foi nesse endereço que o sargento Cristiano Procópio Magalhães, 47, e os cabos Alex Medeiros Borges, 35, e Dimas dos Santos Silva, 37, simularam uma ocorrência de resistência seguida de morte, envolvendo o engenheiro civil Vinícius Texucla Oliveira, 36. A vítima já tinha sido ferida antes em outro local e em circunstâncias ainda não bem apuradas.
Ainda de acordo com as investigações, minutos depois de balear Vinícius e forjar o confronto, a equipe da Força Tática do 27º Batalhão (Parque América) “plantou” um revólver calibre 38 e uma pistola 380 ao lado do corpo dele e em seguida providenciou o “socorro” ao engenheiro.
A viatura 04114 da Unidade de Resgate do Corpo de Bombeiros foi acionada e levou Vinícius para o Hospital Geral do Grajaú, mas ele não resistiu. Peritos do IML (Instituto Médico Legal) constataram que o engenheiro foi baleado nas costas e no abdômen.
A farsa não terminou aí. A polícia aponta que o cabo Tiago Vieira da Silva, 37, também da Força Tática, já havia encerrado o turno de trabalho e soube do episódio. Como ele morava perto do local decidiu ir até lá. Assim que chegou, os PMs lhe pediram um favor.
Tiago teria sido orientado a jogar areia nas marcas de sangue deixadas pelo ferimento em Vinícius, para eliminar provas em uma das cenas do crime. O cabo cumpriu à risca a determinação.
Foi aí que entraram em cena mais uma vez as câmeras de segurança da casa do tenente-coronel aposentado. O circuito registrou a chegada de Tiago em uma moto às 5h58. As imagens mostram o cabo segurando um saco e esparramando a areia no asfalto.
No 101º DP (Jardim das Imbuias), o sargento Cristiano e cabos Alex e Dimas apresentaram uma versão fantasiosa. Disseram que avistaram o Voyage, ocupado por três indivíduos em atitude suspeita. Afirmaram que tentaram fazer a abordagem com sinais sonoros e luminosos.
Acrescentaram que o condutor não obedeceu a ordem de parada e que no cruzamento das ruas Particular e Cultura Popular, o Voyage colidiu com um monte de entulhos. Os PMs contaram que dois homens desceram do carro atirando e fugiram e que o terceiro, no banco de trás, foi ferido no revide.
A equipe da Força Tática só não sabia que na rua onde Vinícius foi colocado no banco de trás do Voyage —o único ocupante do automóvel— havia câmeras de segurança. E, por ironia do destino, foi o equipamento da casa de um tenente-coronel da PM que derrubou a versão dos militares.
Assim que voltou da viagem, o tenente-coronel foi checar o equipamento. Enquanto o oficial acompanhava estarrecido as imagens, uma equipe da Corregedoria da PM tocava a campainha da casa dele à procura de câmeras de segurança na região.
Cristiano, Alex e Dimas foram denunciados à Justiça comum pelos crimes de homicídio doloso com três qualificadoras: motivo torpe, meio cruel e recurso que impossibilitou a defesa da vítima, e também por fraude processual, porque alteraram a cena do crime.
Eles também inseriram declaração falsa em documento público para alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante, pois pesquisaram o RG de Vinícius, mas relataram ao final da ocorrência que o indivíduo morto não havia sido identificado. Sumiram com os documentos dele. Os três PMs estão presos preventivamente e são réus.
O MPE-SP (Ministério Público do Estado de São Paulo) denunciou Tiago com base no artigo 347 do Código Penal: inovar artificiosamente o estado de lugar para induzir a erro o juiz, o perito ou os responsáveis por uma investigação. Os policiais militares respondem ao processo na 3ª Vara do Júri da Capital.
Já na Justiça Militar, Cristiano, Alex e Dimas, são processados pelos crimes de falsidade ideológica, fraude processual, abandono de posto e por se reunir em grupo para cometer violência. Tiago responde por fraude processual.
No próximo dia 27, o juiz Ronaldo Roth, da 1ª Auditoria do Tribunal de Justiça Militar, ouvirá as testemunhas do caso e no dia seguinte, o magistrado irá interrogar os policiais militares.
A reportagem não conseguiu contato com os advogados dos réus. Nas petições judiciais, os defensores alegam que seus clientes são inocentes e que agiram em confronto.
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