Progressistas oferece dinheiro e tempo de TV para Bolsonaro se filiar

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Foto: Alan Santos/PR

O escritório da presidência do Progressistas, o mais poderoso partido do Centrão, foi tomado de uma apreensão inabitual na terça-feira 5. Naquela tarde, uma reunião com deputados do Rio Grande do Sul teve de ser interrompida após rumores de que Jair Bolsonaro havia concordado em assinar a ficha de filiação à legenda para disputar a reeleição. Desde o início do ano, o comando da sigla negocia com o presidente da República o retorno dele ao Progressistas. As conversas ganharam tração com a nomeação do senador Ciro Nogueira (PI) para o cargo de ministro-chefe da Casa Civil. Mandachuva do partido e principal responsável pela adesão do Centrão ao governo, Ciro ofereceu a Bolsonaro ativos considerados estratégicos para a próxima sucessão presidencial: a estrutura de uma das maiores bancadas da Câmara, o que garante fatias importantes de tempo de propaganda e dos fundos partidário e eleitoral, além da possibilidade de apoio de centenas de prefeitos no Nordeste, região em que o mandatário enfrenta o seu maior nível de rejeição — e na qual o PT de Lula colhe, historicamente, um caminhão de votos.

Diante do burburinho de que a filiação estava sacramentada, o ministro da Casa Civil passou a desmentir a informação aos dirigentes estaduais do Progressistas que o procuravam. A precaução era necessária, já que, se depender de Ciro Nogueira, o presidente se filiará ao partido (as portas estão abertas, e o tapete estendido), mas falta a concordância de Bolsonaro, que fracassou até aqui em todas as suas tentativas de encontrar uma nova agremiação desde que deixou o PSL. Em 2018, o ex-capitão venceu a eleição numa legenda nanica e rompeu o paradigma segundo o qual um candidato só tem chance de vitórias se sustentado por uma boa estrutura partidária. Fenômeno eleitoral, Bolsonaro triunfou naquela ocasião sem tempo de TV e com uma campanha franciscana. O problema é que, até mesmo seus aliados mais fiéis, não acreditam que será possível repetir essa proeza. Diante do derretimento de sua imagem e da aprovação do governo, o presidente foi aconselhado a buscar uma legenda de médio a grande porte, porque precisará de bons minutos na TV e de aliados experientes nos rincões para responder aos ataques de rivais em temas como pandemia, desemprego e inflação.

Se sacramentado, o casamento representará uma guinada na estratégia eleitoral do Progressistas. Historicamente, a regra na sigla é não lançar candidatos à Presidência, ficar livre para fechar alianças nos estados e centrar esforços na eleição da maior bancada possível na Câmara dos Deputados. Superada a votação, a legenda procura o presidente eleito, seja ele de direita ou de esquerda, e se oferece para ajudar no Congresso em troca das contrapartidas de sempre: cargos, emendas etc. Empoderado na Casa Civil, Ciro Nogueira chegou à conclusão de que é hora de dar um passo diferente. Aos seus colegas de cúpula do partido, ele alegou que com a filiação de Bolsonaro — e de outros campeões de voto que virão com ele, como Eduardo Bolsonaro, que colheu a maior votação da história para a Câmara em 2018 — o Progressistas pode não só conquistar o Palácio do Planalto como eleger a maior bancada do Congresso. As projeções dão conta de um potencial para chegar a mais de setenta deputados federais (hoje são 42) depois da eleição de 2022. A sigla decorrente da fusão entre o DEM e o PSL contará de início com mais de oitenta integrantes, mas o número tende a diminuir, já que parte deles pretende migrar para o novo partido de Bolsonaro.

“Nós, bolsonaristas que ficamos à deriva neste momento, estamos aguardando a palavra do presidente para ver para onde ele vai, para então podermos nos filiar ao mesmo partido, se possível”, diz o deputado Coronel Tadeu (PSL-SP). Facilita as conversas a diferença de foco entre os dois lados. Enquanto a prioridade de Ciro Nogueira é a Câmara, a de Bolsonaro é o Senado, onde é acossado pela CPI da Pandemia e até agora não conseguiu aprovar a indicação de André Mendonça para o cargo de ministro do Supremo Tribunal Federal. O presidente considera essencial eleger uma bancada maior de senadores aliados. Ciente disso, o Progressistas já aceitou deixar para Bolsonaro a indicação de candidatos à Casa em colégios eleitorais como São Paulo, Rio de Janeiro, Distrito Federal e Paraná. O discurso também já começou a ser alinhavado.

Em uma recente viagem a Alagoas, caciques do partido se colocaram à disposição para defender a tese de que os problemas enfrentados pelo brasileiro, como a alta nos preços da gasolina e do gás de cozinha, são responsabilidade de governadores, e não do presidente da República (o que, evidentemente, não é verdade). Arthur Lira (AL), presidente da Câmara, encampou uma investida para reduzir o ICMS como forma de conter as altas sucessivas nos combustíveis. Os aliados também estão dispostos a insistir na cantilena de que a vacinação contra a Covid-19, atribuída em pesquisas aos esforços dos governadores, é mérito de Bolsonaro (outra história da carochinha).

Restam resistências nos diretórios estaduais, sobretudo de estados da Região Nordeste, como Bahia e Pernambuco. Os representantes desses diretórios querem se aliar ao ex-presidente Lula por entender que assim terão mais chances de renovar seus mandatos. Mas nem isso deve se tornar um empecilho. Há uma negociação em curso dentro do partido para que os insatisfeitos com a filiação de Bolsonaro aceitem o retorno do presidente e, em contrapartida, possam subir em outros palanques. Essa infidelidade consensual já prevaleceu em 2018, quando o partido compunha a chapa do tucano Geraldo Alckmin como vice, mas viu importantes quadros na Região Nordeste endossarem a candidatura do petista Fernando Haddad. Mesmo que os contrários a Bolsonaro decidam deixar o partido, os entusiastas da filiação do presidente alegam que a debandada será compensada, com folga, pelas adesões de bolsonaristas renhidos.

Dinheiro também não será problema. Em 2020, o Progressistas recebeu 47 milhões de reais do fundo partidário e mais 140 milhões do fundo eleitoral. Os integrantes da legenda querem que esses recursos sejam aplicados nas campanhas para deputado. Até nisso as coisas parecem bem encaminhadas, já que a expectativa é de o presidente financiar sua campanha à reeleição com as doações que receberá de pessoas físicas, sobretudo de grandes empresários que o apoiam. “A campanha de presidente vai ter uma arrecadação própria, de doação. Podemos, inclusive, ter sobra da campanha presidencial para ajudar os deputados”, afirmou o líder do governo na Câmara e tesoureiro do Progressistas, Ricardo Barros (PR).

Em entrevista a VEJA há duas semanas, Bolsonaro disse que o seu partido de destino estava entre o Progressistas, o PTB, o PL e o Republicanos — a base mais sólida do Centrão. O PTB perdeu força na banca de apostas porque, entre outros motivos, tem apenas dez deputados e seu líder, o mensaleiro Roberto Jefferson, foi preso e é investigado no STF em um inquérito que apura ataques a instituições. Chefiado por outro notório mensaleiro, Valdemar Costa Neto, o PL, apesar de ser da base governista, prefere desempenhar o papel de sempre e deixar para a última hora a definição do caminho a seguir na eleição presidencial. Já o Republicanos promete marchar ao lado de Bolsonaro em 2022, mas sem ele na legenda. O fato é que a oferta do Progressistas é providencial para Bolsonaro. Com a rejeição recorde ao governo, o presidente se tornou um investimento de risco. A maioria das legendas, por enquanto, prefere uma postura conservadora e não deseja apostar todas as fichas nele. Já Ciro Nogueira resolveu arriscar. Ele quer comprar na baixa para, se tudo der certo, lucrar como nunca na alta.

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