Doria e Eduardo Leite mantêm embate sobre app das prévias
Foto: Rodger Timm
Após uma longa e tensa reunião na noite de segunda-feira (15), a cúpula do PSDB descarta adiar as prévias presidenciais marcadas para domingo (21) entre João Doria (SP), Eduardo Leite (RS) e Arthur Virgílio (AM).
Como mostrou a Folha, diante de fragilidades no aplicativo de votação, a campanha de Leite chegou a sugerir adiamento, algo que o governador gaúcho nega, enquanto Doria e Virgílio foram contra.
A questão do aplicativo, que originou o imbróglio, segue, contudo, não resolvida. Foi inclusive agravada por um ataque, na noite de segunda, a 43 perfis de tucanos cadastrados na ferramenta. A tentativa de apagar esses perfis foi identificada pela Fundação de Apoio da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Faurg), desenvolvedora do app.
Num contexto de acirramento e resultado em aberto entre Doria e Leite, haverá novas reuniões sobre o uso do aplicativo ao longo desta terça-feira (16) entre a direção tucana e as campanhas dos três postulantes.
A tendência, no entanto, é usar a ferramenta de votação, mesmo com os problemas apontados. Aliados de Leite e de Doria até traçam alternativas. Porém, como mostrou a Folha, o partido não tem um plano B —cédulas de papel são consideradas mais vulneráveis e não há logística para a votação em urna eletrônica de 44 mil tucanos espalhados pelo país.
No cenário de disputa apertada e clima belicoso, o aplicativo é visto como um dos principais motivos para posterior questionamento do resultado e judicialização do proceso. Também pode servir de brecha para que o perdedor decida deixar o PSDB. A união do partido após as prévias é um desafio.
Para caciques tucanos que acompanham o processo, haverá algum risco na votação pelo app, mas há segurança suficiente para realizar a votação no dia 21. As falhas apontadas por auditoria da empresa de segurança cibernética Kryptus estão sendo sanadas ou mitigadas até a data, segundo a Faurg.
O cadastro para votação pelo aplicativo se encerrou na segunda, e cerca de 44 mil tucanos (de um universo de 1,3 milhão de filiados) se inscreveram para participar. Segundo as regras atuais, todos os filiados podem votar pelo aplicativo. No entanto, haverá urnas eletrônicas em Brasília para prefeitos, deputados, senadores, governadores e ex-presidentes da sigla que queiram votar presencialmente.
Os últimos acontecimentos no processo das prévias, com brigas entre as campanhas e vulnerabilidades do aplicativo expostas, trouxeram prejuízos à imagem do PSDB. Tucanos dizem acreditar que os ataques hackers visam descredibilizar as prévias.
A campanha de Leite também saiu fustigada. A sugestão de adiamento foi considerada um erro político de aliados do gaúcho. Doria e seu entorno tem dito que Leite buscou adiar o pleito ao perceber que está em desvantagem. Recaiu sobre o gaúcho a acusação de querer inviabilizar as prévias.
“Defender adiamento é melar as prévias do PSDB”, resume o tesoureiro da sigla, César Gontijo, aliado de Doria.
O partido já preparou um grande evento em Brasília no dia 21 e já pagou passagens e hospedagem dos mandatários que podem ir até a capital federal votar na urna eletrônica. “Não tem sentido adiar, seria uma irresponsabilidade com recurso público, seria uma desmoralização para o partido”, completou.]
Diante do recuo, com Leite negando querer qualquer adiamento, a questão da data foi considerada superada. Áudios da reunião mostram, no entanto, que os representantes do governador gaúcho na reunião falaram em adiamento.
Nos bastidores, aliados de Leite afirmam que de fato se tocou no tema, mas nunca como uma sugestão. A ideia seria elencar outras alternativas após a constatação de que o aplicativo não estaria pronto e não ceder à proposta da campanha de Doria.
Os paulistas, que há semanas apontam os problemas do aplicativo e são receosos de seu uso, argumentam que, para limitar a possibilidade de fraude, os tucanos que têm a faculdade de votar na urna (que representam 62,5% dos votos) deveriam ser obrigados a votar presencialmente.
O aplicativo seria usado apenas por militantes e vereadores. Aliados de Doria também chegaram a cogitar o uso de urnas com cédulas de papel pelo país, o que é considerado inviável.
Auxiliares do governador paulista afirmam que não haveria grande prejuízo em votos de filiados que não pudessem ir a um local de votação, já que, na verdade, apenas cinco estados concentram 80% dos cadastrados para votar.
A campanha de Leite, que tem menor poder de mobilização para o voto presencial e cujos apoiadores estão mais espalhados pelo país, defende que qualquer pessoa possa votar no aplicativo se preferir.
O aplicativo seria a ferramenta para democratizar a votação, com possibilidade de participação em todo o país. A votação em locais físicos exige uma coordenação logística que o diretório paulista do PSDB tem, mas outros não, o que poderia dar vantagem a Doria.
Mas, na reunião desta segunda, houve uma inversão de papeis. Aliados de Leite concordaram que o aplicativo é passível de fraude e que seria preciso mais tempo para consertá-lo.
Os representantes de Doria, por sua vez, apesar de também desconfiarem do aplicativo, discordaram. Admitiram o uso da ferramenta atual ao menos entre filiados, sem adiamento.
A campanha de Leite considera inaceitável tal divisão, em que o alto clero tucano estaria livre de fraudes votando na urna, mas os militantes não. No entorno do gaúcho, se São Paulo dá o aval para o uso do aplicativo, esse aval deve valer para todos.
Até a semana passada, Leite e Virgílio já haviam concordado com o uso do aplicativo. Portanto, a responsabilidade de aceitar e viabilizar as prévias era uma pressão que pesava sobre os paulistas.
Eram os apoiadores do gaúcho que viam na celeuma do aplicativo uma tentativa de aliados de Doria de conturbar o processo diante do temor de uma derrota —até a reviravolta desta segunda.
Coordenadores da campanha do paulista argumentam que a própria Kryptus relatou possibilidade de fraude em massa e judicialização da votação.
Para a campanha de Doria, a anuência ao app dependia do novo relatório da Kryptus desta semana. O parecer aponta que algumas falhas foram, de fato, corrigidas, mas outras inseguranças permanecem.
“Algumas vulnerabilidades do mecanismo que antes poderiam permitir fraude massiva de votos ainda persistem, porém foi implementado autenticação multi-fator via SMS, o que mitigou o caminho de ataque massivo anteriormente encontrado”, diz o parecer.
No fim de semana, circulou um vídeo em que um vereador tucano conseguia burlar o aplicativo, que tem reconhecimento facial, e cadastrar uma pessoa sem o consentimento dela. O partido afirma que levará o caso ao Ministério Público.
A ideia é identificar, por meio de foto e de IP, todos aqueles que tentarem algum tipo de fraude e buscar responsabilização criminal. O cadastro dos filiados com mandato é checado um a um, mas isso não é feito para a massa de filiados.
Outro problema atingiu ambas as campanhas e provocou reclamação de Doria e Leite ao PSDB nacional: o sumiço de 36 vereadores que, depois de cadastrados, desapareceram da lista de inscritos. O partido afirma que o caso não se deve a ataques, mas que a própria sigla removeu os perfis por falta de dados e comprovação. Os votantes já foram reabilitados.
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