Bolsonaro quer disputar com Lula paternidade do Fies

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Foto: Pedro Ladeira/Folhapress e Miguel Schincariol/AFP

Pressionado pela provável candidatura em 2022 do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o presidente Jair Bolsonaro (PL) decidiu dar fôlego a uma proposta de renegociação de dívidas do Fies (Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior).

A ideia é publicar uma MP (medida provisória) para permitir a redução de parte das dívidas com o programa que concede empréstimos públicos para estudantes pagarem faculdades privadas.

Em transmissão nas redes sociais na quinta-feira (9), Bolsonaro imitou Lula ao citar uma medida para beneficiar os estudantes.

“Tem gente que fica prometendo: ‘Se eu for presidente, vou anistiar todo mundo’. Por que não fez lá atrás, pô? Está aí de sacanagem”, disse Bolsonaro, simulando a voz do petista.

Na transmissão, porém, Bolsonaro se confundiu e disse que a ideia era tratar de dívidas do Prouni —programa que concede bolsas de estudo, não financiamento.

“Estamos estudando, não quero anunciar, né? Pessoal inadimplente aí, do Prouni, brevemente…”, disse o presidente, sem completar a frase. A fala de Bolsonaro foi uma resposta a declarações de Lula.

Uma semana antes, o petista disse no podcast Podpah que é preciso “anistiar os meninos” do Fies.

“Tem um milhão de meninos e meninas devendo para o Fies, porque não podem pagar. Anistia essas crianças. Qual o prejuízo para o país? Tem tantos empresários que dão calote, o que custa anistiar os meninos?”, afirmou.

Lula lidera as pesquisas para as eleições a presidente em 2022, com Bolsonaro em segundo. Além disso, a entrada do ex-aliado e ex-ministro da Justiça Sergio Moro na disputa ao Planalto também tem irritado o presidente, pois ambos miram o eleitorado da direita.

Uma medida provisória para aliviar os débitos dos estudantes está em estudo há alguns meses, segundo integrantes do governo. Porém o texto deve ter limites, por preocupações com o impacto da iniciativa para as contas públicas.

De acordo com integrantes do governo ouvidos pela Folha, a medida trará algumas ressalvas. Parte do Executivo nega que os descontos alcançarão 100% da dívida e diz que o mais provável é que o modelo exija um pagamento mínimo em troca de uma renegociação dos valores.

Os descontos só ocorreriam se não gerarem renúncia de receitas para o governo. Para isso, a medida precisaria ser voltada a quem não tem condições de pagar, abrangendo somente valores que já não eram mais esperados —à semelhança de outros modelos de negociação da União.

Parte das dívidas do Fies já são contabilizadas como prejuízo para a União, dependendo de fatores como o tempo em que as parcelas estão inadimplentes. O Balanço Geral da União registrou um ajuste para perdas de R$ 27,9 bilhões no Fies ao fim de 2020.

No total, o Fies tem a receber dos devedores R$ 123 bilhões, segundo números atualizados em 30 de setembro, os mais recentes disponíveis.

De acordo com o documento do Tesouro Nacional, o Fies já atendeu mais de 3,4 milhões de estudantes. Desse total, 2,7 milhões ainda possuem contratos ativos (aqueles que ainda têm saldo a pagar ao fundo).

Estabelecido por lei em 2001, no governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB), o Fies passou por uma expansão significativa sobretudo a partir do governo de Dilma Rousseff (PT). Do total, 79% dos contratos foram assinados de 2011 em diante.

O programa é operado pelo FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação), vinculado ao Ministério da Educação, que solicita os recursos ao Tesouro Nacional.

Em grande parte, o Tesouro emite títulos públicos para obter o dinheiro, o que gera um impacto direto na dívida pública.

Pelo fato de seus riscos serem em maior parte bancados pela União, o programa é alvo frequente de análises dos diferentes governos e já passou por sucessivas mudanças para mitigar o risco para os cofres públicos.

O programa financia até 100% do valor dos encargos educacionais cobrados pelas instituições de ensino que aderem ao fundo, dependendo da renda familiar mensal bruta e do comprometimento com os custos da mensalidade.

Essa não é a primeira vez que o programa passa por flexibilizações, e renegociações já foram feitas ao longo dos anos, inclusive em 2019, durante o governo Bolsonaro. Em 2020, foram suspensos os pagamentos dos estudantes beneficiários durante a pandemia de Covid-19.

Em outra frente, na segunda-feira (6), Bolsonaro editou uma MP para ampliar o acesso de alunos egressos de escolas privadas ao Prouni. A medida foi questionada por parte da oposição.

“Fui criticado, que estava elitizando o Prouni. Pelo contrário, estamos fazendo justiça”, disse Bolsonaro em transmissão em redes sociais na quinta.

A iniciativa para beneficiar os estudantes não vem de forma isolada. Como a Folha mostrou, Bolsonaro tem buscado anunciar medidas para reverter a queda da popularidade em 2022, quando tentará a reeleição.

O Palácio do Planalto tem estabelecido dezembro como prazo para tirar algumas delas do papel, como o vale-gás, que foi lançado, e o Auxílio Brasil, prioridade número 1 do governo.

O programa sucessor do Bolsa Família —uma marca de gestões do PT— foi anunciado em outubro, mas só na semana passada conseguiu elevar o teto de gastos em 2022 para tentar encaixar o programa. O teto limita as despesas à inflação.

O presidente decidiu aumentar o valor do benefício para R$ 400, dificultando a acomodação dos números no ano que vem.

A manobra foi colocada na PEC (proposta de emenda à Constituição) dos Precatórios, promulgada na semana passada, depois de dias de negociação. Assim, o auxílio de R$ 400 passou a ser pago na sexta (10) a um público abaixo do prometido.

Folha de S. Paulo

 

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