Congressistas preparam farra pré-eleitoral

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Foto: Dida Sampaio/Estadão

O Congresso se prepara para acelerar, nas próximas semanas, um pacote de propostas que atendem ao lobby de grupos políticos. É uma espécie de “Black Friday” parlamentar, antes da virada do ano. Medidas defendidas pelo Centrão, como a liberação de jogos de azar e a derrubada do veto do presidente Jair Bolsonaro ao Fundo Eleitoral de R$ 5,7 bilhões, estão previstas para a pauta de dezembro.

A pressa dos deputados e senadores tem motivo: eles querem votar tudo agora porque 2022 é ano eleitoral e, além do desgaste que iniciativas como essas podem representar, boa parte dos políticos costuma se ausentar de Brasília para fazer campanha em seus Estados.

O Fundo Eleitoral é um dos itens que desperta mais interesse dos parlamentares. Após o financiamento de empresas ser vetado, em 2015, o dinheiro público se tornou a principal fonte para candidatos e partidos bancarem gastos de campanha. Por se tratar de uma medida relacionada ao Orçamento de 2022, os congressistas querem tomar uma decisão antes do fim deste ano.

Presidentes de partidos consultados pelo Estadão disseram não haver um acordo sobre a quantia a ser destinada às eleições de 2022, mas afirmaram que vão se reunir, nas próximas semanas, para definir o valor. O Congresso aprovou em julho um fundo de R$ 5,7 bilhões para financiar as campanhas, número que representa quase o triplo dos recursos destinados às disputas de 2018 (R$ 2 bilhões).

Em agosto, o presidente Jair Bolsonaro vetou o montante aprovado pelo Legislativo e hoje o Fundo Eleitoral está indefinido. O governo negocia com o Congresso para que o valor seja de até R$ 3,5 bilhões, mas dirigentes de partidos do Centrão querem algo na casa de R$ 5 bilhões.

“Temos que acertar isso daqui até 20 de dezembro (prazo para o recesso do Congresso), mas até agora não tem acordo”, afirmou o presidente do Solidariedade, deputado Paulinho Pereira da Silva (SP), conhecido como Paulinho da Força.

A presidente do PT, deputada Gleisi Hoffmann (PR), disse que a definição ocorrerá nos próximos dias. “Não conversamos ainda. Vamos discutir nessa semana”, observou ela, referindo-se aos outros partidos. Por serem as legendas com o maior número de deputados, o PT e o PSL recebem as fatias mais gordas do fundo.

No pacote de fim de ano, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que aumenta de 65 anos para 70 a idade mínima necessária a nomeações em tribunais superiores também ganhou tração. O texto foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, no último dia 23, e agora está na fase da comissão especial.

A mudança beneficia diretamente dois ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que são próximos do Centrão: Humberto Martins, atual presidente da Corte, e João Otávio Noronha. Ambos completaram 65 anos em 2021 e, pelas regras atuais, não conseguiriam ser nomeados para uma cadeira no Supremo Tribunal Federal (STF). Com o novo limite, porém, eles podem ser indicados para as próximas vagas no Supremo.

Antes de completar 65 anos, Martins estava cotado para o lugar do decano Marco Aurélio Mello, mas acabou preterido por Bolsonaro, que optou pelo ex-ministro da Justiça André Mendonça. Noronha também tem boa relação com o Congresso. Em setembro, um projeto do ministro do STJ foi aprovado pelos parlamentares: cria o Tribunal Regional Federal da 6ª Região (TRF-6), que atenderá Minas Gerais, Estado de Noronha.

O presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL), determinou a abertura de uma comissão especial para analisar a PEC que aumenta a idade mínima dos indicados aos tribunais. Não se trata de um comportamento usual. Lira tem preferido usar o instrumento de grupos de trabalho para construir textos que são votados diretamente no plenário, muitas vezes sem passar pela CCJ.

A proposta que abre caminho para Bolsonaro nomear magistrados com boa interlocução com o Centrão é de autoria do líder do Progressistas, Cacá Leão (BA), aliado de Lira. “Juízes e desembargadores que completam 65 anos deixam de ter acesso às cortes superiores (com a PEC da Bengala, em vigor) e, por não terem perspectiva de ascensão na carreira, muitos acabam pedindo aposentadoria precoce”, escreveu o deputado na justificativa da PEC.

Ao endossar a medida, Lira disse que a mudança deve ser feita para haver uma adequação a outra PEC, que reduz de 75 anos para 70 a idade da aposentadoria compulsória de ministros do Supremo, dos tribunais superiores e do Tribunal de Contas da União (TCU).

Batizada de PEC da Bengala, a iniciativa foi patrocinada em 2015 pelo então presidente da Câmara, Eduardo Cunha (MDB-RJ), para aumentar a permanência dos magistrados nos tribunais e diminuir o número de indicações às quais a então presidente Dilma Rousseff (PT) tinha direito.

O projeto de lei que libera os jogos de azar, por sua vez, avançou na Câmara e seus apoiadores esperam que seja votado nas próximas semanas. A previsão do deputado Felipe Carreras (PSB-PE), relator do texto, é que isso ocorra no dia 15.

A medida libera apostas em corridas de cavalo, bingos, cassinos e jogo do bicho. Uma versão inicial do relatório de Carreras foi protocolada na última quarta-feira, 24, e traz novidades, como a criação do Sistema Nacional de Jogos de Apostas, que servirá para regular e administrar a atividade no País. A ideia é que o parecer seja votado diretamente no plenário.

Os defensores dos jogos argumentam que a prática vai alavancar a economia e o turismo. Um dos principais focos de Carreras ao construir o texto está na regulamentação dos cassinos integrados a resorts, que são estruturas hoteleiras normalmente instaladas em praias.

O lobby pela aprovação da medida é encabeçado por deputados do Centrão e pelo senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ), filho mais velho do presidente Jair Bolsonaro. O interesse destes parlamentares na liberação dos jogos é poder levar os cassinos para seus redutos eleitorais, alavancando a economia local e poder ganhar votos por isso. O pai de Lira, o ex-senador Benedito de Lira (Progressistas), é prefeito de Barra de São Miguel, no litoral de Alagoas, região que poderia receber cassinos. Já Flávio defende transformar a região de Angra dos Reis, na costa fluminense, em uma espécie de “Las Vegas” brasileira.

No ano passado, o “Zero Um” levou uma comitiva de políticos para visitar a cidade americana famosa por seus cassinos. Na ocasião, o grupo se reuniu com Sheldon Adelson, um apoiador do ex-presidente americano Donald Trump que comandou a Las Vegas Sands, uma das maiores empresas do mundo do ramo de cassinos. O americano morreu em janeiro deste ano.

Por outro lado, a bancada evangélica tenta impedir a aprovação do projeto. O principal argumento é de que o vício nos jogos prejudica as famílias e vai de encontro a valores religiosos. Deputados foram até Lira no último dia 24 para manifestar a contrariedade com a iniciativa. “Dissemos a ele que somos totalmente contra e vamos trabalhar contra. Não concordamos com isso”, afirmou o deputado Cezinha de Madureira (PSD-SP), coordenador do grupo.

“Ele (Lira) tem a liberdade para pautar e discutir o assunto que quiser. A pauta é dele, mas já sabe que somos mais de 120 deputados contra”, insistiu Cezinha. Para um projeto de lei ser aprovado são necessários 257 votos.

Não é só entre os evangélicos, no entanto, que há resistência à aprovação da medida. Auditores fiscais também engrossam o coro contra o texto. A Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Anfip) divulgou nota no fim do ano passado declarando que “os efeitos deletérios resultantes da jogatina superam qualquer possível ganho econômico advindo da prática”.

A associação afirmou que, “além de estimular atividades ilícitas como corrupção, prostituição, tráfico de drogas e lavagem de dinheiro, pode causar sérios danos à saúde, desencadeando doenças como a ludopatia – transtorno compulsivo patológico reconhecido pela Organização Mundial da Saúde (OMS), causado pelo vício em jogos”.

A regulamentação dos jogos de azar é um desejo antigo do Centrão e foi apoiada pelo ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, quando ele exercia o mandato de senador pelo Progressistas do Piauí. Em 2018, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa rejeitou um parecer de Nogueira sobre o tema.

Estadão

 

 

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