Governo pode ser processado por atrasar vacinação de crianças
Foto: Side Show Stock/iStock
Pais, mães e outros tutores podem pedir à Justiça que o governo federal pague indenização por colocar suas crianças de 5 a 11 anos em risco ao atrasar a imunização contra a covid-19. Isso inclui não apenas as famílias que tiveram crianças infectadas, mas também as que não tiveram. A avaliação é de Eloísa Machado, professora da FGV Direito-SP e coordenadora do centro de estudos Supremo em Pauta.
“Todas as crianças entre 5 e 11 anos que foram privadas de vacinação para a covid-19 desde que a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) aprovou o imunizante da Pfizer para elas estão sofrendo danos direta e exclusivamente atribuíveis a condutas ilícitas de Marcelo Queiroga e de Jair Bolsonaro”, afirmou nas redes sociais e depois à coluna.
Para Eloísa Machado, as famílias podem pedir indenização individual à Justiça com menção expressa sobre a necessidade de o Estado brasileiro cobrar, depois, o valor do patrimônio dos dois.
Para atrasar a imunização de crianças, que conta com forte oposição de bolsonaristas, o governo federal abriu uma consulta pública sobre a aplicação do imunizante da Pfizer em quem tem entre 5 e 11 anos. O assunto que deveria ser restrito a cientistas, pesquisadores e médicos tornou-se tema para opinião de leigos.
Além disso, tanto o ministro quanto o presidente defenderam a necessidade de apresentação de prescrição para vacinação de crianças – demanda que dificulta a vida de famílias mais pobres que não contam com um médico que pode fazer uma consulta por telefone e enviar uma receita por WhatsApp.
O ministério da Saúde recebeu pela internet contribuições de mais de 99 mil pessoas sobre o tema entre os dias 23 de dezembro e 2 de janeiro. Uma audiência pública sobre o assunto está sendo realizada nesta terça (4).
De acordo com a jurista, a Constituição Federal trata expressamente como dever do Estado manter a criança a salvo de qualquer forma de negligência e, ao mesmo tempo, garantir seu direito à vida, à saúde e às convivências comunitária e familiar. E o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) traz a vacinação como direito da criança e dever da família e do Estado.
“Estamos com dois anos de pandemia e o dever do Estado em garantir meios de conter a covid-19 já conta com jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. A lei dá à Anvisa o aval técnico e impõe o Estado o dever de vacinar. Atrasar deliberadamente o plano de imunização de crianças é um ato ilícito e indenizável”, afirma Machado.
Ela elenca como danos o medo da família diante da incerteza frente à falta de vacina, a privação da convivência com parentes mais idosos e outros membros da comunidade e a exposição evitável a um risco de adoecimento e morte.
“Se a criança adoeceu por covid-19, o dano é evidente. Mas o mero risco é ilícito porque a Constituição impõe dever de não ser negligente e o ECA impõe o dever de prevenir violações e direitos”, afirma.
Dados da Câmara Técnica de Assessoramento em Imunização da Covid-19 mostram que, do início da pandemia até o dia 6 de dezembro, 301 crianças entre 5 e 11 anos morreram pela doença e 6.163 diagnósticos positivos foram registrados.
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