PT tem disputa interna de plano econômico para Lula

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Foto: Tiago Queiroz/Estadão

Quatro grupos buscam protagonismo na montagem do programa econômico do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para a campanha ao Palácio do Planalto. Participam dos debates a Fundação Perseu Abramo, centro de estudos do PT dirigido pelo ex-ministro Aloizio Mercadante; o Instituto Lula, comandado pelo ex-presidente do Ipea Marcio Pochmann; a ala sindical, liderada por ex-diretor do Dieese Clemente Ganz Lucio; e o grupo de parlamentares que vêm apresentando projetos econômicos no Congresso com a consultoria de ex-gestores, entre os quais o ex-ministro da Fazenda Nelson Barbosa.

Na reforma trabalhista há divergências em relação ao que deve ser revogado e a cúpula do PT afirma que o programa de governo estará alinhado às parcerias políticas. Cotado para vice de Lula, o ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin – ainda sem partido – mostrou descontentamento com as ideias de um “revogaço” da reforma aprovada no governo Michel Temer. A ala do PT interessada no acordo disse que tudo será discutido com o Congresso, caso Lula vença a eleição.

O fim do teto de gastos une todos os grupos. A regra criada no governo Temer para limitar o crescimento das despesas à variação da inflação tem sido citada por Barbosa e por outros economistas como uma camisa de força, algo “inexequível”. Há, porém, discordâncias sobre a melhor forma para o desenlace. Outra parte das desavenças se refere a quais medidas devem ser adotadas primeiro na economia, caso o ex-presidente retorne ao Planalto, em 2023. Aumentar o salário mínimo ou usar os recursos orçamentários para reforçar os programas sociais e o combate à pobreza ou, ainda, incentivar os investimentos públicos, que estão no chão, para ativar o crescimento e o emprego? Todos esses temas, aliados à necessidade da reforma tributária com mais justiça na distribuição de renda, são fundamentais para os economistas consultados pelo PT.

Uma primeira reunião de Lula com eles, para discutir essas ideias, foi marcada para sexta-feira. Ao menos até o lançamento oficial da candidatura, porém, o ex-presidente tem dito que não terá porta-voz. Os economistas não falam em nome do partido nem da campanha, que não foi lançada oficialmente, mas têm se posicionado em vários assuntos.

Desde o início da pandemia de covid-19, as reuniões presenciais deram lugar a conversas virtuais, por meio do WhatsApp. O grupo, porém, existe desde 2018. Ali, todos concordam em 90% dos temas. A divergência ocorre nos 10% restantes, segundo um dos participantes ouvidos pelo Estadão.

A ala sindical do PT puxou a fila com o debate sobre a revisão da reforma trabalhista. “Há uma crítica de que essa reforma foi regressiva, tirou o poder de negociação dos sindicatos e fragilizou o sistema de relações do trabalho”, disse Clemente Ganz Lúcio, assessor do Fórum das Centrais.

Lula promoveu nesta terça-feira, 11, um encontro, na Fundação Perseu Abramo, com economistas, líderes sindicais e representantes do governo da Espanha para debater justamente as mudanças adotadas nessa área pelo país europeu, em 2012, e a chamada “contrarreforma”. O ex-presidente defendeu a retomada do emprego, mas, de acordo com relatos, não disse se pretende revogar a reforma trabalhista.

Na Fundação Perseu Abramo estão os economistas do chamado “núcleo duro”, muitos originários da Unicamp, que devem participar diretamente da elaboração do programa de governo. Antes de Lula ser preso, eles se reuniam quinzenalmente com ele. No grupo estão Guilherme Mello e Pedro Rossi. O ex-ministro da Fazenda Guido Mantega também continua sendo interlocutor do ex-presidente.

Integrante desse núcleo, o economista Marcelo Manzano, pesquisador do Centro de Estudos em Economia do Trabalho e Sindicalismo da Unicamp, disse ser “importante rever a reforma trabalhista”. Na sua avaliação, seria necessário uma “análise mais pormenorizada” para decidir a extensão das mudanças.

“É interessante a ideia de montar um fórum tripartite para discutir a legislação trabalhista no Brasil, com todos os atores, governos, trabalhadores e empregadores”, afirmou Manzano ao Estadão, destacando que falava apenas em seu nome. “No segundo governo Lula houve um congresso do Sistema Público de Emprego, Trabalho e Renda e havia essa iniciativa. Infelizmente, isso não foi adiante. É preciso retomar esse diálogo social tripartite.”

Manzano observou que algumas regras do atual sistema de regulação trabalhista “são muito ruins”. O economista citou como exemplo a extinção da obrigatoriedade de contribuição sindical e a retirada da possibilidade de negociação pelos sindicatos em períodos nos quais não há uma determinação específica sobre um tema.

“Em qualquer lugar do mundo, eles cumprem um papel muito importante na garantia de direitos. Aqui a política, nos últimos anos, foi conduzida para enfraquecer os sindicatos, tirando sua base de financiamento”, argumentou. A opinião é compartilhada por Ganz Lucio. “A ideia é que os trabalhadores beneficiados em acordos coletivos definam, em assembleias, qual é o aporte a dar aos sindicatos. Isso seria por categoria”, disse ele.

Estudos da Organização Internacional do Trabalho (OIT) analisados também indicaram que um cenário com regras muito flexíveis para contratar ou demitir, para jornadas parciais ou contratos intermitentes, provoca insegurança no trabalhador. E a incerteza tem reflexos em outros setores.

“Para o empresário, na gestão cotidiana de negócio, isso parece positivo. Mas, para o desempenho da economia como um todo, isso significa que os trabalhadores ficam muito mais retraídos para suas ações de gasto”, observou. “O cara não sabe se tem emprego, se terá renda. Ele não se endivida para comprar um imóvel, para comprar uma geladeira, um automóvel. Há uma contração da demanda. Em última instância, isso vai prejudicar esse mesmo empresário que acha bom haver flexibilidade para contratar e demitir. Não vai haver mercado para ele vender.”

Estadão

 

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