Terceira onda de covid já supera a primeira
Foto: Rodrigo Santos/Secretaria de Saúde do Amazonas
Com uma aceleração inédita durante a pandemia, o número de casos de covid-19 explodiu esta semana no país, o que fez a média móvel de sete dias superar o pico da primeira onda registrada em 2020. A projeção é que, nos próximos dias, o número de casos supere o recorde da segunda onda.
Segundo o painel de dados do Conass (Conselho Nacional de Secretários de Saúde), ontem o país registrou 87.471 novos casos, fazendo a média móvel alcançar 52.271.
O crescimento de casos este ano impressiona. Dez dias antes, em 3 de janeiro, foram 11.850 novos casos registrados —alta de 737%, algo inédito para um mesmo período durante toda a pandemia.
O recorde da média na primeira onda foi batido em 29 de julho de 2020, com 46.536 casos. Já na segunda onda, o recorde da média foi em 24 de junho de 2021, com 77.265 casos.
A alta agora é atribuída à chegada e circulação da variante ômicron, somado às festas natalinas e de Réveillon. A curva de aceleração de casos é a mesma vista em outros países que também são desafiados pela transmissão da nova cepa. A previsão é que metade da Europa seja infectada nas próximas semanas.
Os números, porém, devem ser muito maiores já que ainda há resquícios dos problemas que gerou um apagão de dados do Ministério da Saúde e por conta da subnotificação de casos devido à quantidade de casos leves, falta de testes e de pessoas que não buscam serviços de saúde para testagem. Some-se a isso a ausência de um programa massivo de testagem em âmbito nacional.
“Este é, sem dúvida, o momento de maior número de casos no Brasil”, diz o cientista Miguel Nicolelis, que alerta para o que seria uma falsa premissa de que a ômicron —por gerar casos mais leves e pela alta taxa de vacinação no país— não deve causar problemas, como lotação em hospitais.
Em nível populacional não tem nada de leve! Não interessa se os sintomas são leves da maioria das pessoas porque, quando você multiplica um número gigantesco por um número pequeno dá um número gigantesco ainda. Muita gente infectada, logo, muita gente vai precisar de internação” Miguel Nicolelis, cientista
O diretor da OMS (Organização Mundial da Saúde), Tedros Adhanom Ghebreyesus, alertou no sábado passado que a ômicron não deve ser descrita como branda, já que o número recorde de pessoas infectadas vem lotando sistemas de saúde em todo mundo.
“A ômicron está entre os vírus mais infecciosos já conhecidos pelo homem, pau a pau com e até ganhando do vírus do sarampo”, diz Flávio Fonseca, presidente da Sociedade Brasileira de Virologia.
Em alguns estados, o número de casos já é recorde, como no Espírito Santo. Em Pernambuco, a ocupação de leitos de UTI (unidade de terapia intensiva) para casos de SRAG (Síndrome Respiratória Aguda Grave) está em 85%, mesmo com a abertura de mais de 200 vagas nas últimas semanas.
No Amazonas, onde as ondas de covid passadas causaram colapso hospitalar, o número de casos explodiu esta semana após apresentarem meses de números sob controle. Ontem, foram 1.659 casos notificados, uma incrível alta de em comparação ao dia 3, quando foram registrados 88 casos.
Outros dados apontam que a pandemia no Brasil também apresenta dados além do notificado oficialmente.
No Rio de Janeiro, a positividade de testes feitos de covid-19 chegou a 50%, com o dobro de casos de dezembro em apenas sete dias do ano.
Como não há boletins epidemiológicos de covid-19 publicados este ano ainda pelo Ministério da Saúde, não é possível saber o atual percentual de positividade dos testes em laboratórios públicos no país.
Um outro exemplo da explosão de casos é o número de buscas no Google por “teste de covid”, que nos últimos dias bateu recorde no Brasil.
O número de pessoas que reportaram sintomas de covid também atingiu, em muitos estados, o seu recorde, segundo dados do projeto da Rede Análise Covid-19, em parceria com o Facebook e Universidade de Maryland (EUA).
“Temos indícios que mostram que o apagão pode estar não nos deixando ver um incêndio forte. Eu acredito que podemos estar no pior momento [de casos], mas também podemos não estar. Não temos como comprovar isso”, diz Isaac Schrarstzhaupt, analista de dados e coordenador na Rede Análise Covid-19.
Outro número que chama atenção é a projeção do IHME (Institute for Health Metrics and Evaluation), da Universidade de Washington. Ele aponta que o Brasil teria hoje uma subnotificação de casos que chegaria a até seis vezes do total, o que faria o país ter ao menos 450 mil casos no dia.
No painel de análise de projeções, o pico de casos ocorrerá no início de fevereiro, superando 2 milhões de casos por dia no Brasil. “Agora imagina se tivermos isso com um serviço de saúde já baleado?”, questiona Miguel Nicolelis.
Ele questiona o porquê de as autoridades no país não estarem tomando medidas mais rígidas para garantir o distanciamento social.
“Primeiro falaram que não era para olhar o número de casos, que o que importava era o de hospitalização. Aí depois veio o aumento de hospitalizações, falaram que deveríamos olhar somente para o de leitos de UTI, e que agora também está disparando também.”
Somente no estado de São Paulo, o número de pessoas internadas em UTI cresceu 40% em apenas oito dias: no dia 3 de janeiro, havia 1.141 pacientes; na segunda-feira (10), eram 1.597 pacientes. O número de entradas diárias de pacientes cresceu ainda mais: 91%.
Estamos tendo recorde de casos nos EUA, foram 1,4 milhão de casos do domingo para a segunda. O Reino Unido estava em 5 mil pessoas internadas e agora está em 20 mil; e as mortes estão na ordem de 300, eram de 10 a 12. Ou seja, as pessoas aqui não olham os casos e dados do mundo. A minha sensação é essa” Miguel Nicolelis, cientista
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