Bolsonaro e governadores disputam apoio de policiais

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Foto: Isac Nóbrega/PR / Agência O Globo

O desenrolar do ano eleitoral acirrou a disputa pelo apoio de uma categoria cortejada com frequência pelo presidente Jair Bolsonaro: os policiais. Governadores de 17 estados já deram aumentos salariais ou enviaram para debate nas assembleias propostas de reajuste — há casos de medidas destinadas especificamente ao grupo e de benefícios mais amplos, que englobam também outros servidores. Nas dez unidades da federação restantes, há acenos diversos, como projetos de reestruturação de carreira, compra de equipamentos e aumento de efetivo.

Em paralelo, o titular do Palácio do Planalto, que viu o Congresso aprovar semana passada uma Medida Provisória do governo que ampliou o crédito para integrantes das forças de segurança comprarem imóveis, planeja enviar um texto que amplia a “retaguarda jurídica”, pleito antigo de agentes envolvidos em operações. Segundo estimativa do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o universos das forças de segurança tem cerca de 18 milhões de pessoas, somando servidores da ativa e da reserva, cônjuges e filhos.

Na tentativa de diminuir sua alta taxa de rejeição e subir alguns pontos nas pesquisas, o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), pré-candidato à Presidência, foi um dos que lançou mão de reajustes para policiais civis e militares. A categoria receberá 20% de aumento, o dobro do anunciado para boa parte das categorias do funcionalismo público no início do ano. Ao anunciar o reajuste, o tucano lamentou a demora para a recomposição salarial e disse que gostaria de dar mais aos policiais, a quem chamou de “heróis”.

O deputado Delegado Olim (PP), que integra a base do governo na Assembleia Legislativa, reconhece a importância do reajuste, apesar de reclamar que o valor está aquém do necessário:

— Nós temos o pior salário do Brasil. Ele deveria dar 25% (de reajuste), no mínimo.

Ex-bombeiro, o governador de Santa Catarina Carlos Moisés (sem partido), que pretende concorrer a mais um mandato, concedeu valores ainda mais altos: 33% de aumento aos policiais na base das carreiras e 21%, aos níveis mais altos.

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Integrante do Fórum Brasileiro de Segurança Pública e professor da Fundação Getulio Vargas (FGV), Rafael Alcadipani lembra que os policiais são uma das categorias mais numerosas do funcionalismo público.

— As medidas podem ainda ser vistas como resposta ao temor dos governadores pela bolsonarização das PMs e como uma ação defensiva diante das promessas de Bolsonaro de aumento salarial dos policiais federais. Com reajustes e outras melhorias de carreira, os chefes dos Executivos estaduais se “vacinam” contra uma manifestação ou greve em ano eleitoral — afirma Alcadipani.

Governadores também agem, dizem analistas, em resposta a pesquisas qualitativas que colocam a segurança pública como uma das principais preocupações dos eleitores, ao lado de saúde, educação e desemprego.

Onde não foi possível dar um reajuste maior que o do resto do funcionalismo, os acenos à categoria se dão por meio de bônus, auxílios e melhorias na carreira. Wilson Lima (PSC), governador do Amazonas e pré-candidato à reeleição, promoveu 1.923 policiais militares e bombeiros no fim do ano passado e lançou concursos públicos.

Após vetar trechos do projeto de lei que reajustaria a Gratificação de Regime Especial de Trabalho (Gret) dos praças do Corpo de Bombeiros e dos policias em dois anos, o governador do Rio, Cláudio Castro (PL), que também pretende disputar a reeleição em outubro, cedeu à pressão e publicou um decreto em que concede a bombeiros e policiais militares uma gratificação correspondente a 150% do soldo já na folha salarial de janeiro. O benefício terá um impacto anual de R$ 278,4 milhões.

Quem não pode mais se reeleger também aprovou medidas favoráveis a policiais. Na Bahia, Rui Costa, possível candidato do PT ao Senado, concedeu incremento de R$ 300 para servidores da Segurança Pública, com validade a partir de abril. Além disso, entregou 150 motocicletas e 27 viaturas.

— Estamos construindo dezenas de unidades da Polícia Militar, que funcionavam em casas alugadas, e também da Polícia Civil — afirmou Costa, durante cerimônia com agentes, em fevereiro.

O governo federal também está de olho em reajustes para forças de segurança. Bolsonaro chegou a reservar R$ 1,7 bilhão no Orçamento para dar aumento a policiais federais, rodoviários federais e agentes penitenciários. A reação de outras categorias de servidores, que também pedem um reajuste, emperrou a medida. Na quarta-feira, o presidente lembrou que maio é o limite para que a medida possa ser efetivada, em função da eleição, e reclamou das reações que a atrasaram:

— Por que não podemos ajudar uma categoria? Por todos tem que ser prejudicados?

A Casa Civil também estipulou como prioridade uma proposta, ainda em elaboração, que vai tratar da “retaguarda jurídica para policiais”. Não foram divulgados detalhes, mas o governo já tentou em outras oportunidades aprovar o chamado “excludente de ilicitude”.

— Agora existem condições de apresentar ao Parlamento uma proposição que trate mais detalhadamente dos limites da atuação policial — disse José Lopes Hott Junior, assessor da Casa Civil, em podcast do ministério.

Na lista de projetos que o governo pretende aprovar no Congresso há tentativas de flexibilizar o porte e a posse de armas, que pode permitir que policiais tenham até dez armas de fogo — o limite para o resto da população é de quatro. Pode ir a votação em abril a Lei Orgânica da Polícia Militar, que dá mais autonomia à corporação e, segundo especialistas, pode abrir margem para um aumento salarial em cascata, ao passar a considerá-la como “carreira jurídica”.

— Essa (PM) é a grande base do presidente Bolsonaro, que tem o maior efetivo — diz o presidente da Frente Parlamentar de Segurança Pública, o deputado Capitão Augusto (PL-SP).

O governo também está elaborando um programa batizado de PraViver, que terá o objetivo é “garantir retaguarda social aos profissionais de segurança pública e suas famílias por meio de ações preventivas e de amparo”, segundo a deputada Major Fabiana (PSL-RJ).

— Existe um alinhamento ideológico, que é de um grupo mais conservador. E no momento eleitoral também existe uma tentativa das polícias de serem ouvidas, de abrir interlocução com todas as candidaturas — diz Renato Sérgio de Lima, do Fórum Brasileiro de Segurança, que continua:

— O que Bolsonaro está tentando fazer é saturar essa agenda, ou seja, ele está dizendo: “Olha, não precisa falar com nenhum outro porque eu que vou cuidar de vocês.” Mas não necessariamente ele vai conseguir impor o que quer.

O Globo