PF sob Bolsonaro não é mais a mesma
Foto: Jorge William / Agência O Globo
O embate entre o pré-candidato à Presidência Sergio Moro (Podemos) e a Polícia Federal levou para o centro do debate eleitoral as políticas de combate à corrupção do governo de Jair Bolsonaro. Os números revelam que, desde o início da atual gestão, tanto os inquéritos abertos para apurar esse tipo de crime quanto as prisões de suspeitos de praticá-lo vêm caindo. O volume de operações de combate aos malfeitos, porém, tem aumentado.
Na acusação que deu origem à peleja, Moro disse durante uma entrevista que “hoje não tem ninguém no Brasil sendo investigado e preso por grande corrupção”. O exagero retórico levou a uma resposta contundente da Polícia Federal, que acusou seu ex-chefe de “mentir” e fazer do tema um “trampolim eleitoral”. Para além dos números que esgrimam a disputa, os casos de investigação envolvendo autoridades de alto escalão têm sofrido uma mudança de perfil nos anos recentes.
A Operação Lava-Jato, que levou para a cadeia empreiteiros e alguns dos mais importantes nomes do cenário político nacional, perdeu força coincidentemente no momento em que o país passou a enfrentar a pandemia de Covid-19. A partir de então, as maiores ações policiais anticorrupção tiveram como foco esquemas de desvios de verba de combate à pandemia. Frequentemente, os principais investigados eram personagens de menor calibre ou que ensejaram a acusação de direcionamento a adversários do presidente Bolsonaro, em confronto com governos estaduais pelas medidas de restrição de circulação contra a Covid.
— O fato objetivo é que, na atual gestão, não há notícia de qualquer autoridade ou político graúdo sendo investigado ou preso — reiterou Moro ao GLOBO.
Para especialistas em segurança pública e combate a organizações criminosas, a questão não deve ser diagnosticada apenas com base em rankings de mais ou menos prisões ou operações.
— O ex-ministro erra ao dizer que a PF está trabalhando menos. E a PF não tem razão de dizer que o número de operações significa maior produtividade. Essa briga só enfraquece a Polícia Federal. A politização desse debate é ruim — diz Renato Sergio de Lima, diretor-presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
O número de prisões de pessoas investigadas por corrupção vem caindo desde 2018, o que aconteceu inclusive no primeiro ano do governo Bolsnaro, quando Moro chefiava o Ministério da Justiça. Já as investigações abertas para apurar esse delito aumentaram em 2019, mas passaram a diminuir a partir de então
A Polícia Federal, que vem acumulando no atual governo episódios de tentativa de interferência da Presidência da República, se defende afirmando que aumentou o número de operações, e que a prisão depende fundamentalmente de ordem da Justiça.
Bolsonaro tem seguido a estratégia de não rebater ataques de seu antigo auxiliar e agora adversário, com quem disputa votos do eleitorado mais identificado com a direita. A réplica aos últimos disparos de Moro ficou a cargo da própria Polícia Federal, que emitiu a nota contra o ex-ministro da Justiça. A PF confirmou dias depois que a ordem para a emissão do comunicado oficial partiu do diretor-geral da instituição, Paulo Maiurino, deixando o Palácio do Planalto fora da trincheira.
Ainda que Moro não tenha duelado contra Bolsonaro sobre a eficiência de sua polícia, o debate por si só já beneficia o ex-ministro, já que trata do tema sobre o qual ele mais se sente confortável para discutir. Ao contrário das eleições de 2018, o combate à corrupção, embora ainda relevante, perdeu espaço este ano para temas econômicos.
Especialistas em segurança pública ouvidos pelo GLOBO afirmam que a disputa travada entre Moro e Maiurino é prejudicial, já que, nos dois casos, haveria “muito apego” aos números e poucas explicações sobre como a PF tem conduzido seu trabalho.
— Mais importante não é saber quem fez mais, se Moro ou a PF sem o Moro. Precisamos saber: em que pé está o controle da corrupção no Brasil? — afirma o professor de Direito Lenio Luiz Streck.
O então ministro da Justiça Sergio Moro deixou o governo acusando o presidente Jair Bolsonaro de tentar interferir politicamente na Polícia Federal (PF) e em inquéritos relacionados a familiares. O caso é alvo de um inquérito no Supremo Tribunal Federal (STF). Em depoimento em novembro do ano passado, o presidente negou as acusações.
A PF investiga indícios de desvios de verba pública para o combate ao novo coronavírus. Foram feitas operações em pelo menos 19 estados. As apurações tratam de suspeitas de fraudes em licitações, compras de insumos com empresas de fachada e superfaturamento na aquisição de equipamentos. Governadores, por sua vez, falam em uso político da PF.
Em abril do ano passado, a direção da PF decidiu substituir o então superintendente do Amazonas, delegado Alexandre Saraiva, que havia acabado de enviar ao STF um pedido de investigação contra o então ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles. Saraiva apontava que Salles atuou para obstruir uma investigação que apreendeu madeira ilegal.
A delegada da Polícia Federal Silvia Amélia Fonseca de Oliveira foi exonerada da direção do Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Internacional (DRCI) após ter encaminhado o processo de extradição do blogueiro bolsonarista Allan dos Santos, que está nos EUA. A PF afirma que a exoneração de Silvia Amélia ocorreu pelo fato de “não ter dado ciência” à cúpula do Ministério da Justiça sobre a extradição, pedida pelo ministro Alexandre de Moraes, do STF.
O blogueiro é alvo de inquéritos no Supremo sobre fake news e sobre a atuação de uma milícia digital contra a democracia. Outros dois funcionários do DRCI relataram pressões da cúpula do Ministério da Justiça durante o processo de extradição de Allan dos Santos.
Em dezembro de 2021, a PF cumpriu mandados de busca e apreensão contra o presidenciável Ciro Gomes (PDT) para apurar um suposto esquema de corrupção envolvendo as obras da Arena Castelão, reformada para a Copa de 2014.Ciro classificou a ação de “abusiva” e afirmou que o presidente Jair Bolsonaro “transformou o Brasil num Estado Policial”.
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No alvorecer de 2017, o blogueiro Eduardo Guimarães foi alvo de operação da Polícia Federal não por ter cometido qualquer tipo de crime, mas por ter feito jornalismo publicando neste Blog matéria sobre a 24a fase da Operação Lava Jato, que focava no ex-presidente Lula.
O Blog da Cidadania representou contra grandes grupos de mídia na Justiça e no Ministério Público por práticas abusivas contra o consumidor, representou contra autoridades do judiciário e do Legislativo, como o ministro Gilmar Mendes, o juiz Sergio Moro e o ex-deputado Eduardo Cunha.
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