Podcasts com presidenciáveis atingem eleitorado avesso à política

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Foto: Reprodução/Folha

O formato varia pouco, sem roteiro definido e perguntas sobre temas mais espinhosos. Assim, os podcasts de entrevista que viraram febre no YouTube dão aos candidatos tempo para falar sobre eles, contar causos, fazer piadas e, principalmente, serem vistos por um público que, em sua maioria, não acompanha o noticiário político.

Os programas são alvos dos marqueteiros que cuidam das campanhas dos candidatos em 2022.

Dos primeiros colocados nas pesquisas da disputa para a Presidência da República, apenas Jair Bolsonaro (PL) não esteve em pelo menos 1 dos 2 principais canais do gênero no Brasil, Flow e Podpah, nos últimos meses.

A última controvérsia envolvendo o Flow não diminuiu a simpatia dos estrategistas das campanhas pelo formato. Criador do podcast, Monark defendeu o direito de haver um partido nazista no Brasil, durante entrevista com Kim Kataguiri (DEM-SP) e Tabata Amaral (PSB).

A repercussão negativa e a fuga de patrocinadores o fizeram deixar a apresentação do podcast e a sociedade da empresa, segundo o Flow. Nenhum dos pré-candidatos à Presidência pediu a retirada dos vídeos do canal após o caso.

Marqueteiros ouvidos pela Folha veem o formato de podcasts de entrevista como a principal novidade para a eleição deste ano. A relevância coloca em alerta advogados especialistas em legislação eleitoral.

“Não tem nenhuma norma que regulamente esses canais de YouTube. A lei eleitoral é antiga, fala de rádio e TV”, afirma o advogado Amilton Augusto.

Concessões públicas, rádios e televisões precisam cumprir regras restritas durante o período eleitoral, que começa em agosto. O tempo dado a cada candidato precisa ser o mesmo oferecido aos adversários.

Isso faz com que uma série de entrevistas numa emissora de televisão tenha que destinar o mesmo espaço e tempo para todos candidatos.

“De fato, o que vale para as rádios e TV em termos de controle prévio de eventual propaganda [positiva ou negativa] não se aplica mesmo às plataformas de internet em geral em razão de não serem concessionárias de serviço público”, diz Sérgio Ricardo dos Santos, assessor-chefe do TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

Uma regulamentação para as novas plataformas no período eleitoral chegou a ser discutida no projeto de reforma do código eleitoral, que foi adiado.

Felipe Mendonça Terra, advogado especialista em direito eleitoral, não vê espaço para uma equiparação das regras de rádio e TV para as novas mídias. “A neutralidade, equidistância cobrada de concessões públicas não valem para a internet”, afirma.

Há quem defenda que isso possa ser revisto. Amilton Augusto lembra que a Justiça espera que a situação, uma queixa, aconteça para tomar uma providência. “Ela não está atenta ainda para o tamanho da relevância dessas novas mídias, do engajamento, da audiência”, opina.

É justamente o poder de canhão para atingir as chamadas bolhas, grupos, em sua maioria, de jovens sem hábito de acompanhar as mídias tradicionais, que atrai os candidatos.

“Eles [youtubers] têm uma linguagem intimista com a população que permite uma abordagem diferente”, afirma o publicitário Daniel Braga.

À frente da estratégia digital da campanha de João Doria (PSDB), ele é um entusiasta do formato. Braga destaca que a liberdade de tempo e a interação que é feita com o público pelos apresentadores agradam os políticos.

A edição do Flow com o governador de São Paulo teve 2 horas e 54 minutos. Com Ciro Gomes foram 4 horas e 42 minutos, só não mais longa do que a conversa com Sergio Moro, que durou 4 horas e 54 minutos.

O ex-juiz teve tempo para dizer ser fã de videogame, torcer para o São Paulo e, claro, responder perguntas sobre a Lava Jato e a sua participação no governo Bolsonaro. O vídeo acumula mais de 2 milhões de visualizações no YouTube.

A audiência dos presidenciáveis replica a ordem das últimas pesquisas eleitorais. Ciro Gomes teve 2,6 milhões, colado com Moro e bem à frente de Doria, com cerca de 1 milhão.

Todos muito atrás do ex-presidente Lula, que teve mais de 8 milhões de visualizações na sua conversa de 2 horas e 28 minutos com Igor Cavalari (Igão) e Thiago Marques (Mítico), apresentadores do Podpah, em dezembro.

O petista foi convidado para o Flow, mas preferiu ir ao canal concorrente. A iniciativa de participar do programa foi da equipe do ex-presidente, que procurou o Podpah, até então sem histórico de entrevistas com políticos. Jogadores de futebol, artistas e celebridades são os convidados mais comuns da atração.

O resultado, na avaliação dos petistas, foi positivo. Segundo levantamento do partido, quase 60% do público que assistiu ao programa estava situado fora da bolha petista, isto é, formado por não simpatizantes do partido.

Além da íntegra das entrevistas, os canais publicam os chamados cortes, trechos menores da conversa com títulos chamativos sobre o assunto tratado, como “Lula é ladrão?” e “O lado de Lula que ninguém conhece”.

No de maior audiência, com mais de 354 mil visualizações, titulado como “Pergunta do Igão pro Lula kkkkkk”, o petista responde sobre o dia em que perdeu o dedo numa fábrica.

“Doeu muito?”, questionou Igão. “Deixa eu dar uma marteladinha no seu dedo para ver como dói”, respondeu Lula. “[Doeu] Muito, deu até dor de barriga”, completou o ex-presidente.

A participação representou um ponto de inflexão na presença de Lula nas redes sociais. Comparado com a semana anterior ao programa, o petista teve aumento de 102% nas interações no Facebook, 200% no Instagram e 845% no Twitter, segundo levantamento da Diretoria de Análise de Políticas Públicas da FGV.

Ciro Gomes e Sergio Moro também tiveram mais visibilidade e engajamento nas redes sociais na semana em que participaram do Flow.

“Essas conversas originárias nas plataformas digitais, como Youtube, têm potencial maior de escorrer para outras redes, tais como Facebook, Twitter”, afirma Marco Aurelio Ruediger.

Ele vê a relevância maior desses canais de podcast como a grande diferença em relação ao pleito de 2018. Desde então, os podcasts cresceram, se profissionalizaram e atraíram patrocinadores. O Podpah, por exemplo, exibe marcas como Habibs, iFood, Centauro, Banco Pan.

Após ver Bolsonaro pautar a eleição passada com suas lives no Facebook e disparos no WhatsApp, o PT investirá na campanha digital e tem uma aposta.

“Esses conteúdos em vídeos, sejam de entrevistas longas ou os chamados reacts (quando um youtuber comenta outro vídeo), vão ser a tendência da eleição de 2022”, afirma o jornalista Otávio Antunes, que trabalha na estratégia digital do PT.

O Podpah foi procurado pela Folha, mas não respondeu as perguntas para a reportagem. O Flow informou que seguirá fazendo entrevistas com políticos em 2022.

“Continuaremos tendo um ambiente transparente e plural. Buscamos manter ainda uma conversa sem roteiros, mas cientes da nossa responsabilidade”, afirmou o canal.

Folha  

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No alvorecer de 2017, o blogueiro Eduardo Guimarães foi alvo de operação da Polícia Federal não por ter cometido qualquer tipo de crime, mas por ter feito jornalismo publicando neste Blog matéria sobre a 24a fase da Operação Lava Jato, que focava no ex-presidente Lula.

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