Futuro novo Congresso terá nomes de peso na Câmara e no Senado
Foto: Edilson Dantas/Agência O Globo – 14/10/2020
Um conjunto significativo de mudanças nas regras eleitorais, combinado com inéditas circunstâncias conjunturais, deve induzir os partidos políticos a ampliar a aposta em grandes puxadores de votos nas eleições para deputado federal neste ano.
Sinais dessa tendência já são visíveis com os anúncios de prováveis candidaturas à Câmara de ex-presidenciáveis, ex-governadores e outras figuras conhecidas nacionalmente.
No grupo dos confirmados ou quase confirmados nessa categoria estão nomes que já disputaram a Presidência da República, como Guilherme Boulos (Psol), Heloísa Helena (Rede), José Serra (PSDB) e Marina Silva (Rede); ex-governadores, como Beto Richa (PSDB), do Paraná, e Fernando Pimentel (PT), de Minas Gerais; e personagens que ganharam fama na esteira de eventos com repercussão nacional, como o ex-procurador Deltan Dallagnol (Podemos), projetado pela Operação Lava-Jato.
Há ainda personagens que emergiram como apoiadores ou auxiliares de Jair Bolsonaro, como o ex-assessor Fabrício Queiroz, suspeito de operar um esquema de rachadinha para a família do presidente, o jogador de vôlei Maurício Souza e a médica Nise Yamaguchi, uma das mais conhecidas defensoras da cloroquina para tratamento de covid-19 – medicamento sem eficácia comprovada no combate ao coronavírus.
Vistos como prováveis puxadores de voto, esses personagens deverão disputar contra alguns dos campeões das urnas de 2018 que tentarão a reeleição, como Eduardo Bolsonaro (PL-SP), Carla Zambelli (PL-SP), Kim Kataguiri (União Brasil-SP), Tábata Amaral (PSB-SP) e Tiririca (PL-SP), entre outros.
Conforme analistas ouvidos pela reportagem, fatores conjunturais contribuem para essa tendência. O principal seria a polarização da eleição presidencial entre Bolsonaro e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Com uma eleição nacional tão concentrada em dois nomes, é esperado que as eleições ao Senado, nos 26 Estados e no Distrito Federal, fiquem mais difíceis para candidatos que não estejam diretamente vinculados a um ou outro nome da polarização. É um aspecto, portanto, que empurra políticos conhecidos para a eleição da Câmara, mais barata e menos difícil.
Outro elemento que contribui para a insegurança de possíveis candidatos ao Senado e torna a disputa da Câmara mais atraente é o fato de só haver uma vaga de senador em jogo por Estado, diferentemente do que ocorreu em 2018, quando eram duas vagas por Estado.
Conta ainda o fato de 2018 ter sido um ano de eleição atípica, com alta taxa de renovação e ascensão dos diversos “outsiders”, como Romeu Zema (Novo), eleito governador em Minas, e Wilson Witzel (PSC), eleito governador no Rio e depois afastado. Agora seria o momento de reentrada na política e reacomodação de algumas figuras conhecidas que tinham ambições maiores, mas saíram derrotadas quatro anos atrás.
O consultor e analista político Antônio Augusto de Queiroz lista ainda uma série de mudanças nas regras eleitorais que, na sua avaliação, também têm servido de incentivo para os partidos ampliarem a aposta no lançamento de puxadores de voto nas eleições proporcionais.
Os principais são o fim da coligação em eleição proporcional, o aumento da linha de corte da chamada cláusula de barreira (votação mínima que um partido precisa ter para manter acesso aos fundos partidário e eleitoral e tempo de TV) e uma nova metodologia para cálculo de distribuição das cadeiras na Câmara.
Antes, com a possibilidade de coligação em eleições para deputado, partidos pequenos e médios conseguiam ampliar suas bancadas pegando carona na votação de siglas maiores. A vantagem dos partidos grandes nesse tipo de acordo era somar tempo de TV para seus candidatos a presidente e governador.
Sem isso a partir de agora, os pequenos terão que se esforçar mais para conseguir se manter. É natural, portanto, que busquem auxílio de figuras mais conhecidas.
Além disso, os partidos pequenos também passam a ser mais pressionados pela cláusula de barreira. Entre outros critérios, o patamar mínimo para manutenção do acesso a recursos públicos sobe de 1,5% para 2% dos votos nacionais nas eleições para deputado.
Dessa forma, para garantir a sobrevivência passa a ser mais importante ter um puxador de votos na eleição para deputado do que inscrever essa mesma figura numa disputa para governador, senador ou presidente, ainda que essas três eleições pudessem render mais visibilidade à sigla. É o que ocorre com Boulos no Psol, por exemplo.
Uma mudança no critério de distribuição de cadeiras na Câmara em função da votação de cada partido no Estado é outro fator, segundo Antônio Queiroz, que induz partidos a apostarem em puxadores de voto.
Antes, as vagas eram distribuídas aos partidos que atingiam o quociente eleitoral (uma votação mínima em cada Estado) e que tinham candidatos com votação igual ou superior a 10% desse quociente. Depois disso, havia um cálculo específico para distribuição de “sobras” de cadeiras, conforme a votação de cada partido que excedia o múltiplo do quociente eleitoral.
Todos os partidos eram aptos a receber vagas remanescentes, desde que tivessem um ou mais candidatos com votação nominal igual ou superior a 10% do quociente eleitoral.
Agora, só participam da distribuição final de “sobras” os partidos que alcançarem 80% do quociente eleitoral e tenham candidatos com votação nominal igual ou superior a 20% do quociente.
A mudança resulta em maior dificuldade para os partidos obterem cadeira na Câmara com gente pouco votada. Outro incentivo para priorização de puxadores de votos.