Histórico de brigas de Arthur do Val piora sua situação na Alesp
Foto: Yuri Murakami /Fotoarena/Folhapress
Com histórico de brigas com outros deputados estaduais, Arthur do Val (Podemos) não conta com muitos aliados no momento para lidar com o processo de cassação que deverá enfrentar nas próximas semanas na Assembleia Legislativa de São Paulo após o vazamento de áudios sexistas sobre mulheres ucranianas.
Diversos deputados, de esquerda, centro e direita, já anunciaram que pretendem entrar com representação contra ele e têm defendido publicamente a perda de mandato —em uma onda que pode unir de aliados de Jair Bolsonaro (PL) a petistas e tucanos contra Arthur do Val.
Embora a Assembleia ainda viva sob a sombra de outro caso ofensivo às mulheres, o clima está desfavorável para Arthur do Val, também conhecido como Mamãe Falei.
Ele não conta com a mesma articulação política do deputado Fernando Cury (sem partido), que foi punido com afastamento de 180 dias, mas evitou a cassação após ser flagrado pelas câmeras da Assembleia apalpando Isa Penna (PSOL).
Youtuber, Arthur do Val está em seu primeiro mandato. Foi o segundo deputado estadual mais votado de São Paulo nas eleições de 2018, com 478 mil votos na disputa.
Eleito deputado pelo DEM, foi expulso do partido por críticas ao governador João Doria (PSDB) e sucessivas brigas com os colegas de plenário. Depois, filiou-se ao Patriota para disputar as eleições municipais.
Em 2022, Arthur do Val buscaria o governo estadual pelo Podemos, sendo palanque regional da candidatura de Sergio Moro ao Planalto, mas já anunciou a desistência após as falas vazadas.
O deputado, que visitou a Ucrânia na semana passada, enviou áudios a amigos dizendo que as ucranianas são “fáceis” por serem pobres —e que a fila de refugiados da guerra tem mais mulheres bonitas do que a “melhor balada do Brasil”.
Em 2019, durante análise da PEC da reforma da Previdência na Assembleia, o deputado se envolveu em uma discussão ríspida com outros colegas.
A confusão começou após Arthur do Val chamar os servidores que estavam na galeria do plenário de “bando de vagabundo”. A sessão, que precisou ser suspensa, teve empurra-empurra, ameaça de socos e até mordida. Alguns deputados tiveram que ser contidos.
Segundo Isa Penna, que foi a primeira a protocolar uma representação contra o deputado, Arthur do Val não tem um clima favorável na Casa.
“Toda a possibilidade que o Arthur teve de ofender todos os deputados ele fez. Existe uma inimizade já colocada”, diz.
Ela é um pouco cética em relação à possibilidade de uma cassação, embora acredite em sanções.
“Acho muito difícil. Senão, eu que vou pedir para reabrir o meu processo contra o Cury. Porque eu tive um assédio físico. E tem um áudio desse. Não é possível que a dosimetria seja tão diferente. Tem que existir alguma lógica entre uma punição e outra”, diz.
Presidente do conselho de ética da Assembleia, a deputada Maria Lúcia Amary (PSDB) considera que a situação de Arthur do Val ficou complicada “por conta da repercussão nacional e internacional, em um momento de fragilidade da Ucrânia”.
“Foi uma frase sexista do deputado e também discriminatória em relação à classe social.”
Maria Lúcia disse repudiar, como mulher e deputada, as declarações. “Foi muito dolorido escutar isso sobre essas mulheres que estão em uma situação de vulnerabilidade. E ficamos constrangidos por ser um deputado, um político brasileiro.”
Embora tenha preferido não avaliar quais possíveis punições Arthur do Val pode sofrer na Assembleia, a percepção da deputada Marina Helou (Rede), também membro da comissão de ética, é que o caso gerou um grande impacto dentro e fora da Casa.
“A repercussão é muito grande e muito consistente com a gravidade das afirmações”, diz.
Sobre os áudios, a deputada afirmou que o conteúdo é “absolutamente inaceitável”. “Eu, como mulher em uma situação de poder, tenho o compromisso de garantir que as instituições não compactuem com este tipo de comportamento.”
O presidente da Assembleia, Carlão Pignatari (PSDB), afirmou em nota que “a atitude é inaceitável e que será tratada com rigor e seriedade pelas esferas de investigação do Parlamento”.
Ainda segundo o texto, a Casa “repudia com veemência a fala do deputado”. “A Alesp se solidariza com as mulheres, em especial às ucranianas, e reforça sua luta em defesa e proteção de todas, representadas por conquistas históricas, ações efetivas e leis em vigor.”
Deputados de diferentes legendas expressaram publicamente a intenção de pedir a cassação de Arthur do Val.
Erica Malunguinho (PSOL) afirmou que “já seria digno de nota o teatro encenado pelo deputado Arthur do Val na sua chamada ‘ação humanitária’ na Ucrânia”. “Mas causa asco o teor misógino e classista dos áudios vazados do deputado falando sobre refugiadas de guerra, tanto quanto sua resposta.”
O bolsonarista Douglas Garcia (Republicanos) disse que, diante das diversas representações anunciadas contra Arthur do Val, contatou “os deputados autores para também assiná-las”.
Altair Moraes (Republicanos) também afirmou que entraria com o pedido de cassação.
Já o deputado bolsonarista Gil Diniz disse que está recolhendo assinaturas para protocolar uma CPI para investigar os recursos que financiaram a viagem de Arthur do Val, integrante do MBL (Movimento Brasil Livre).
A deputada estadual Janaína Paschoal e os deputados José Américo, Emídio Souza e Paulo Fiorilo do PT; foram outros parlamentares a reprovar os áudios publicamente.
Fora da Assembleia, Arthur do Val também deve enfrentar isolamento. O governador João Doria (PSDB), o senador Flávio Bolsonaro (PL) e um grande número de deputados federais, incluindo Eduardo Bolsonaro, repudiaram os áudios.
Em seu partido, o Podemos, houve atuação para distanciar o deputado dos projetos políticos do partido neste ano. O presidenciável Sergio Moro disse ainda na sexta-feira (4) que não subiria mais no mesmo palanque do correligionário.
O senador Lasier Martins pediu a “expulsão sumária” dele dos quadros da legenda.
Procurado pela reportagem, o deputado Arthur do Val não respondeu aos questionamentos.