Omissão de juristas do Senado prepara atualização da lei do impeachment

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Foto: Rosinei Coutinho/SCO/STF

Criada pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), dois dias após ele anunciar que não irá se candidatar à Presidência, a comissão de juristas escalada para atualizar a Lei do Impeachment deverá se debruçar, principalmente, sobre os ritos e procedimentos a serem adotados por congressistas nos casos de processos de afastamento de presidente da República, ministros de Estado, ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e o procurador-geral da República.

Presidido pelo ministro Ricardo Lewandowski, do STF, o grupo de 12 membros é formado por juristas, advogados e outros magistrados. O colegiado terá prazo de 180 dias para apresentar um anteprojeto para atualizar a Lei 1.079, de abril 1950, norma que define os chamados crimes de responsabilidade e regula o respectivo processo de julgamento.

O que não falta, segundo um dos integrantes da comissão ouvido pelo Valor, é inspiração para justificar a necessidade de reforma da legislação.

A mais urgente seria reduzir a discricionariedade do presidente da Câmara dos Deputados para determinar a abertura de processos de impeachment de presidente da República.

A situação atual é mencionada como exemplo de questão a ser enfrentada pela comissão. Aliado do presidente Jair Bolsonaro, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), convive em silêncio com mais de 140 pedidos de impeachment protocolados.

Um processo contra Bolsonaro só anda se Lira der aval. Não há norma, porém, que obrigue o presidente da Câmara a sequer se manifestar sobre os pedidos protocolados. Nem norma que faça os pedidos caducarem.

Com isso, Lira fica com o poder de impedir o início de qualquer processo contra Bolsonaro ou desencadeá-lo no momento que lhe parecer mais conveniente.

É uma regra que, na definição de alguns, representa uma “faca no pescoço” do presidente da República, situação que confere enorme poder político ao presidente da Câmara.

A preocupação foi manifestada pelo próprio Rodrigo Pacheco na cerimônia de instalação da comissão de atualização do Lei do Impeachment, no dia 11.

Pacheco afirmou que a revisão da legislação é importante para que o impeachment não siga como um elemento gerador de crise. “Se abalos e sobressaltos fazem parte da dinâmica política, a figura do impeachment não deve operar como fator de seu agravamento”, afirmou.

O diagnóstico comum na comissão é de que, “pouco racional”, a legislação prestes a completar 72 anos transformou-se em indutora de desestabilização.

Tem descrições muito abertas e genéricas de crimes – o que também representa risco constante para o presidente da República – e não resultou em procedimentos similares nas duas experiências brasileiras de impeachment desde sua criação: em 1992, com Fernando Collor, e em 2016, com Dilma Rousseff.

Outra questão a ser enfrentada pela comissão é a de prazos. A ideia é evitar que processos deixem de ser abertos simplesmente porque falta pouco tempo para a conclusão de um mandato.

Seis anos atrás, Lewandowski presidiu a sessão de julgamento do Senado que determinou o impeachment de Dilma Rousseff.

Entre as novidades emanada daquele processo foi o afastamento da presidente sem a cassação de seus direitos políticos por oito anos, como ocorrera com Collor 24 anos antes.

Foi essa diferenciação, resultado de uma articulação política de bastidor desencadeada ao longo do processo, que permitiu que Dilma disputasse eleição para o Senado dois anos depois – pleito em que terminou derrotada.

Outro personagem que atuou no impeachment de Dilma e hoje faz parte do colegiado de reforma da Lei é o ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) Antonio Anastasia, ex-governador de Minas Gerais.

Anastasia era senador em 2016 e atuou como relator do processo de Dilma na Casa.

Entre outros, também fazem parte do colegiado o professor Heleno Torres, da Faculdade de Direito da USP, o ministro Rogério Schietti Machado Cruz, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), o ex-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) Marcus Vinicius Furtado Coêlho e o advogado Pierpaolo Bottini.

Valor Econômico