Todo candidato a presidente que vence em MG, vira presidente

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Foto: Pedro França/Agência Senado

Da política do Café com Leite, na velha República, passando pela construção de Brasília, com Juscelino Kubitschek, até a eleição de Tancredo Neves pós-ditadura, o estado de Minas Gerais sempre teve uma importância histórica no cenário político brasileiro.

A relevância, no entanto, não ficou apenas no passado. Desde 1989, quando ocorreu a primeira eleição direta para presidente desde o fim da ditadura militar, quem venceu em Minas ocupou a Presidência da República. É a única unidade da federação, além do Amazonas, a atingir este feito.

Neste período, o estado também teve políticos que ocuparam o cargo mais alto do Executivo federal, com Itamar Franco (1992 a 1994), vice que assumiu após o impeachment de Fernando Collor, e Dilma Rousseff (2011 a 2016). Além disso, o mineiro José Alencar foi vice-presidente de Luiz Inácio Lula da Silva (2003 a 2010).

Para entender os fatores que tornam Minas Gerais tão importante para a disputa presidencial, a CNN conversou com os cientistas políticos Malco Camargos e Cristiano Rodrigues.

Camargos é doutor em ciência política, professor da PUC Minas e diretor do Instituto Ver; Rodrigues é professor do departamento de ciência política da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

“Minas é uma síntese do Brasil, nas suas virtudes e nos seus problemas, e por isso os temas da eleição presidencial também são os mesmos: as igualdades, a forma de lidar com a economia, as carências”, analisa Camargos.

Rodrigues reforça a visão do colega. Para ele, Minas Gerais é um estado muito heterogêneo, o que se reflete em um eleitorado diversificado.

“O sul de Minas, que é uma região um pouco mais rica e próxima a São Paulo, tende a votar de maneira semelhante aos paulistas; o norte do estado e o Vale do Jequitinhonha, que é uma região empobrecida do semiárido, muito próxima à Bahia, têm o mesmo comportamento eleitoral de algumas partes do Nordeste; já o Triângulo Mineiro, que é uma região mais rica do agronegócio, tem um eleitorado mais típico de Goiás”, pondera o professor da UFMG.

Para Camargos, o peso de Minas Gerais é dado também pela sua importância proporcional em relação ao eleitorado brasileiro. Com 15,5 milhões de votantes, o estado tem o segundo maior colégio eleitoral do país, atrás apenas de São Paulo.

“Ou seja, 10,5% dos eleitores do país estão no estado. Isto, por si só, já dá uma proeminência em relação ao jogo político brasileiro”, afirma o professor da PUC Minas.

Segundo Rodrigues, desde que o Brasil se tornou uma República, Minas sempre teve um poderio político muito grande.

“Até um certo momento da história, a economia mineira era a segunda maior do país (hoje é a terceira). Então, tanto do ponto de vista econômico como político, Minas Gerais tem sido muito importante no cenário nacional há mais de um século”, analisa.

O estado também tem o maior número de presidentes entre as unidades da federação, com nove políticos tendo ocupado o cargo. Na sequência, aparecem São Paulo e Rio Grande do Sul, com sete representantes cada um.

Com um peso tão grande de Minas nas eleições, os principais candidatos devem dar atenção especial ao estado na disputa de 2022.

O Partido dos Trabalhadores (PT) pode ter dificuldades, de acordo com Camargos, por causa do ex-governador mineiro Fernando Pimentel, que deixou o cargo em 2018.

“[Pimentel] Saiu muito mal avaliado e não foi nem para o segundo turno quando disputou a reeleição”, pontua o professor. Segundo ele, uma possibilidade para Lula seria a aliança com Alexandre Kalil (PSD), que renunciou à Prefeitura de Belo Horizonte e confirmou a pré-candidatura ao governo do estado.

Do lado bolsonarista está o atual governador, Romeu Zema (Novo), que deve buscar a reeleição. “O presidente vai tentar reeditar a aliança feita em 2018, que foi muito melhor para o mineiro. Hoje, porém, Zema está mais bem avaliado que Bolsonaro e fica a dúvida se chegou a hora dele retribuir o apoio ou se seguirá um caminho solo, desvinculado”, analisa Camargos.

Pesquisa Quaest/Genial divulgada em 18 de março mostra que 40% dos entrevistados preferem um candidato mais ligado a Lula, contra 21% dos que têm preferência por alguém apoiado por Bolsonaro. Ao mesmo tempo, 36% gostariam que o concorrente não fosse ligado a nenhum dos dois.

Segundo o mesmo levantamento, 49% dos eleitores bolsonaristas dizem que votariam em Zema, e 13%, em Kalil. Do lado lulista, 30% preferem o atual governador mineiro, e 27% optaram pelo ex-prefeito de Belo Horizonte.

Minas também tem refletido nas urnas o desgaste de figuras que, em momentos recentes, dominaram o cenário político, como o deputado federal Aécio Neves (PSDB) e a ex-presidente Dilma Rousseff (PT), ambos ligados a Minas Gerais. Eles foram os principais nomes da eleição presidencial de 2014.

Em 2018, ambos tentaram uma vaga no Congresso. Dilma, que havia sofrido um impeachment dois anos antes, concorreu ao Senado, mas ficou em quarto lugar. Aécio, por sua vez, desistiu de tentar se reeleger como senador e conseguiu uma cadeira na Câmara dos Deputados, mas não ficou nem entre os 15 mais votados no estado.

“Menos de oito anos depois, eles não são protagonistas nem na eleição nacional, nem na eleição estadual, nem nas eleições parlamentares. Aécio vai ter dificuldades para se reeleger, e Dilma provavelmente não será nem candidata”, avalia Camargos.

Rodrigues, no entanto, faz uma ressalva sobre o ex-governador de Minas Gerais. “Aécio Neves tem uma importância nos bastidores. Ele é um sujeito com uma presença e uma influência não explícita”, ponderou o professor da UFMG.

Camargos reforçou que Minas sempre teve “raposas políticas” importantes, que determinavam e direcionavam o caminho dos acordos nos bastidores.

“Atualmente, o nome mais importante de Minas é o presidente do Senado Federal, Rodrigo Pacheco, que tem reconduzido esse espaço de liderança. Entretanto, ele decidiu ficar mais à margem da eleição, cuidando dos seus afazeres no Senado”, avaliou.

Outro mineiro que vai ficar de fora das eleições é o ex-governador Antonio Anastasia, que perdeu a disputa ao governo do estado em 2018 para Zema e deixou o Senado para assumir uma vaga vitalícia no Tribunal de Contas da União (TCU), em fevereiro de 2022.

O único representante do estado que figura na lista de pré-candidatos à Presidência da República é o deputado federal André Janones (Avante). “É um parlamentar novo e que não tem tido desempenho forte no estado a ponto de justificar uma aliança por votos”, disse o professor da PUC Minas.

Nas eleições americanas, um status parecido ao de Minas Gerais era o de Ohio, que atingiu um número ainda mais impressionante que o dos mineiros. De 1964 a 2016, quem venceu no estado se tornou o presidente americano.

A sequência foi interrompida justamente nas últimas eleições, em 2020, quando o republicano Donald Trump obteve 53,27% contra 45,24% do democrata Joe Biden em Ohio, mas foi derrotado na eleição nacional.

Resultado das eleições em Minas
Confira o histórico das eleições presidenciais em Minas Gerais, desde 1989, no turno em que o pleito foi definido:

1989

Fernando Collor (PRN) – 55,52%
Lula (PT) – 44,48%
1994

Fernando Henrique (PSDB) – 64,82%
Lula (PT) – 21,9%
1998

Fernando Henrique (PSDB) – 55,68%
Lula (PT) – 28,06%
2002

Lula (PT) – 66,45%
José Serra (PSDB) – 33,55%
2006

Lula (PT) – 65,19%
Geraldo Alckmin (PSDB) – 34,81%
2010

Dilma Rousseff (PT) – 58,45%
José Serra (PSDB) – 41,55%
2014

Dilma Rousseff (PT) – 52,41%
Aécio Neves (PSDB) – 47,59%
2018

Jair Bolsonaro (PSL) – 58,19%
Fernando Haddad (PT) – 41,81%

CNN Brasil