Todo ditador dá indultos como o de Bolsonaro
Foto: Emily Elconin / Reutes /
Não é apenas no Brasil que o perdão concedido pelo presidente da República gera polêmica, discussão no Legislativo e no Judiciário. Pelo mundo, há uma série de casos em que o indulto presidencial foi alvo de protestos e questionamentos, como é o caso do indulto da graça concedido pelo presidente Jair Bolsonaro ao deputado federal Daniel Silveira (PTB-RJ), condenado a oito anos e nove meses de prisão pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
No Brasil, o perdão gerou reação do Congresso e de juristas, que avaliam que o decreto pode ser constestado no STF. Há casos recentes de discussões sobre o perdão presidencial nos Estados Unidos, na Argentina, no Peru, na Espanha e em Portugal.
Após ser derrotado por Joe Biden para a presidência dos Estados Unidos, em 2020, e prestes a deixar a Casa Branca, concedeu o perdão presidencial a uma longa lista de pessoas, que inclui desde o pai de seu genro Jared Kushner, aliados políticos a condenados na investigação sobre a interferência russa nas eleições de 2016.
A menos de 12 horas do fim de seu governo, Trump concedeu perdão presidencial a Steve Bannon, seu ex-estrategista e autodenominado mentor de um movimento global de extrema direita.
Entre os demais indultados estão Charles Kushner, que se declarou culpado de acusações de evasão fiscal e manipulação de testemunhas em 2004, assim como o ex-diretor de campanha de Trump Paul Manafort e o ex-assessor Roger Stone. Também estavam na lista congressistas republicanos considerados corruptos e guardas de segurança privada condenados pela morte de 14 civis em um massacre de Bagdá em 2007.
No fim, Trump chegou a discutir se auto perdoar. Isso levou os democratas proporem ao Congresso novos limites ao uso de indultos presidenciais.
Também nos Estados Unidos, o então presidente Barack Obama indultou em 2017 Chelsea Manning, militar transgênero condenada em 2013 por vazamento de informações confidenciais ao site Wikileaks. Ela só deixaria a prisão em 2045.
O pedido de liberdade havia sido feito pela soldado em 2013, pouco após ingressar em uma prisão militar do estado do Kansas, onde tentou se suicidar duas vezes.
A comutação da pena de Manning foi duramente criticada por políticos republicanos, como o presidente do Comitê de Serviços Armados da Câmara, Mac Thornberry, e do Senado, John McCain, que disseram que os atos de “espionagem” de Manning colocaram em perigo a vida de soldados americanos e o próprio país.
Ela voltou a ser presa em maio do ano do passado por desacato e por se recusar a depor contra o fundador do site, o australiano Julian Assange.
Em 2007, a Justiça argentina anulou os indultos concedidos em 1990 aos ex-ditadores Jorge Videla e Emilio Massera, condenados à prisão perpétua em 1985 como responsáveis por plano terrorista de Estado.
Entre os crimes cometidos estão o roubo de bebês durante a ditadura (1976-83), sua responsabilidade no Plano Condor e a apropriação de bens de desaparecidos. Todos foram indultados em 1990 pelo ex-presidente Carlos Menem (1989-99).
Em 2017, o então presidente peruano Pablo Kuczynski concedeu indulto humanitário ao ex-presidente Alberto Fujimori, que cumpria pena de prisão de 25 anos por abusos de direitos humanos, corrupção e anuência a esquadrões da morte. O indulto gerou polêmica dentro e fora do Peru.
O decreto foi revogado dez meses depois. Mas, em março deste ano, a Corte Constitucional do Peru aprovou um recurso que permite a libertação.
Em abril deste ano, a Corte Interamericana de Direitos Humanos pediu ao Peru para “se abster de implementar” a libertação de Fujimori. Segundo a corte, a decisão da Corte Constitucional do Peru de restituir um indulto concedido ao ex-presidente, “não efetuou uma ponderação que levasse em conta o efeito que o indulto por graves violações aos direitos humanos tem no direito de acesso à Justiça das vítimas e seus familiares”.
Fujimori governou o Peru entre 1990 e 2000. Fujimori foi condenado pelos massacres em Barrios Altos e La Cantuta, que deixaram 25 vítimas, realizados por um esquadrão da morte integrado por militares durante seu governo. Estes massacres foram qualificados como crimes contra a Humanidade por terem sido considerados homicídios com agravante, lesões graves e sequestro com agravante, segundo sentenças da Corte-IDH de 2001 e 2006.
O governo da Espanha aprovou em 2019 o indulto para os nove líderes separatistas catalães presos por terem participado de eventos ligados à tentativa de separação da Catalunha (foi a maior crise política no país em décadas). Todos os perdoados receberam penas de entre nove e 13 anos de prisão em outubro de 2019.
Foi uma tentativa do governo de melhorar a relação com a região nordeste do país, além de tentar iniciar negociações entre o governo espanhol e as autoridades da Catalunha.
As pesquisas de opinião indicam que cerca de 60% dos espanhóis são contra a libertação dos nove políticos e ativistas e os partidos de oposição ao governo Pedro Sanchez também eram contra à medida.
O governo e o Congresso de Portugal aprovaram em 2020 uma série de indultos por conta do avanço da Covid-19.
O presidente português Marcelo Rebelo de Sousa teve que explicar, porém, que o indulto especial “não se aplica a homicidas e pedófilos”, nem pessoas condenadas por violência doméstica.