Agredido por Aras diz que ele deveria mostrar coragem no cargo

Todos os posts, Últimas notícias

Foto: MPF e ANPR/Divulgação

A cena de Augusto Aras batendo boca e partindo para cima do subprocurador-geral Nivio de Freitas remete a outra exibição do procurador-geral da República, episódio ocorrido na posse do presidente do STF, Luiz Fux. Durante a cerimônia, Aras disse ao ministro, lutador de jiu-jitsu, que também pratica artes marciais.

O constrangimento poderia ter sido maior.

“O PGR dá uma de corajoso onde não deve. Onde deveria demonstrar coragem, não demonstra”, diz Airton Florentino de Barros, procurador de Justiça aposentado, fundador e ex-presidente do Movimento do Ministério Público Democrático (MPD).

Barros lembra que são deveres funcionais do PGR tratar as pessoas com urbanidade.(1) “Poderia haver sanção administrativa por tal conduta, mas não há precedente de punição funcional a PGR”, diz.(2)

É crime de responsabilidade do PGR proceder de modo incompatível com a dignidade e ou decoro do cargo.(3) Na hipótese, ele seria julgado pelo Senado.(4)

Cabe também ao Senado exonerar o PGR, antes do término de seu mandato, ou seja, impeachment.(5)

“Mas não é provável qualquer iniciativa do próprio MPF”, diz Barros.

OMISSÕES DO PGR
Ex-procuradores-gerais da República condenaram a omissão de Aras por não investigar autoridades.

O PGR arquivou pedido para recomendar a Bolsonaro não criticar a política de saúde. Vetou recomendações de procuradores ao gabinete de acompanhamento da Covid-19. Alegou que era prerrogativa sua.

Aras apresentou queixa-crime por calúnia, injúria e difamação contra Conrado Hübner Mendes, professor de Direito da USP, que o acusou de omissão diante de atos e falas de Bolsonaro com relação à pandemia, entre outras críticas. Mendes chamou Aras de “servo do presidente” e “Poste Geral da República”, entre outros termos.

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) encerrou ação penal movida por Aras contra o jornalista André Barrocal, também por calúnia, injúria e difamação. Em artigo, Barrocal se referiu ao PGR como “cão de guarda” de Bolsonaro, “perdigueiro” e “procurador de estimação”.

O cidadão pode perguntar: se não é crime chamar Aras de “cão de guarda”, é crime dizer que o PGR é um “poste”?

Em agosto de 2021, na sabatina no Senado para sua recondução ao cargo, Aras tentou passar a imagem de conciliador. Citou o programa “Respeito e Diversidade”, do CNMP. “É para que tenhamos maior tolerância”, disse.

Aras ofendeu publicamente uma subprocuradora-geral da República.

Em sua gestão, o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) persegue ex-membros de forças-tarefas da Lava Jato. O PGR faz ameaças. Prometeu apresentar no final da gestão provas contra opositores na cúpula do MPF. “Não sou leviano e nem temerário. Sei como cada um agiu”, disse.

O PGR não deve ter esquecido entrevista em que o subprocurador-geral Nívio de Freitas afirmou que Aras e a subprocuradora Lindora Araújo, seu braço-direito, não tinham atribuição para requisitar informações da Operação Lava Jato.

“Os procuradores que têm essas provas são responsáveis pela guarda delas, sob pena de serem responsabilizados criminalmente. Só quem pode autorizar o compartilhamento de provas sujeitas a reserva de jurisdição é o Judiciário”, afirmou Freitas ao jornalista Fábio Fabrini, da Folha.

Freitas foi procurador-chefe da Procuradoria da República no Estado do Rio de Janeiro. Em 2015, foi designado a atuar como membro da força-tarefa da Lava Jato para oficiar nos feitos judiciais e extrajudiciais perante o STJ.

Outro membro do Ministério Público concorda com Airton Florentino de Barros. Diz que Aras pode ser até representado ao Colégio do MPF, para a finalidade de impedimento. Mas tudo indica que a conduta, embora gravíssima, caia no esquecimento.

Segundo ele, o problema maior é a perda do respeito interno do procurador-geral, com reflexos externos. Não dá para o PGR levantar e ir para o conflito físico, isto é falta de decoro, diz.


(1) LC 75/93, 236, VIII e X

(2) LC 75/93, 240

(3) L 1.079/50, 40, 4

(4) CF, 52, II

(5) CF, 52, XI; LC 75/93, 25, parag.único.

Folha