Lula se casa hoje pela terceira vez
Foto: Bruno Santos-21.abr.22/Folhapress
No dia 8 de novembro de 2019, após ter ficado 580 dias preso na sede da Superintendência da Polícia Federal do Paraná, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) anunciou, em seu primeiro discurso em liberdade, que iria se casar.
“Eu consegui a proeza de, preso, arrumar uma namorada e ainda ela aceitar casar comigo. É muita coragem dela”, disse o ex-presidente.
Mais de dois anos depois, o petista irá oficializar a união com a socióloga Rosângela da Silva, a Janja, em cerimônia em São Paulo nesta quarta (18).
Nascida em União da Vitória, no Paraná, Janja, 55, é filiada ao PT desde 1983 e formada em sociologia pela Universidade Federal do Paraná.
Na gestão do petista, foi indicada em 2003 para um cargo na Itaipu Binacional, onde trabalhou por quase 15 anos. De 2012 a 2017, atuou na Eletrobras, no Rio, após ter sido requisitada. E se aposentou em 2020.
Figura constante ao lado de Lula, 76, em agendas que ele tem feito no país e no exterior, Janja deverá assumir um papel de protagonismo ao longo da pré-campanha, segundo membros do PT —ainda que nenhum cargo tenha sido destacado oficialmente.
A expectativa é que ela siga acompanhando o petista em suas viagens neste ano.
Pessoas próximas ao ex-presidente afirmam que, antes de ser companheira de Lula, ela é militante, tem suas opiniões e contribui com ideias nas reuniões das quais participa. Janja tem batido carteirinha nos encontros da coordenação da pré-campanha.
Ela também participa de reuniões na Fundação Perseu Abramo, ligada ao PT, e chegou a dar palpites sobre a escolha do marqueteiro da pré-campanha —ela esteve presente quando foram apresentadas as peças publicitárias.
Presidente do PT, a deputada federal Gleisi Hoffmann (PR) ressalta o perfil militante de Janja e afirma que a socióloga tem levado “de forma muito incisiva” ao ex-presidente e à coordenação temas como a defesa dos direitos dos animais e do meio ambiente, segurança alimentar e pautas feministas.
Foi a socióloga que organizou, por exemplo, um encontro de Lula com mulheres em fevereiro. “Ideia da Janja que queria que ele escutasse diferentes experiências e sugestões que apontassem melhorias e empoderamento para as mulheres”, escreveu a ex-prefeita Marta Suplicy em uma rede social.
Ela também foi uma das idealizadoras de evento do Dia Nacional dos Direitos Animais realizado na Fundação Perseu Abramo.
“Ficou claro para mim que a Janja trouxe essa causa para o Lula. Saí bem confiante que isso vai ser uma prioridade se Deus quiser nesse novo governo”, diz a ativista Luisa Mell, que participou do encontro.
Para a chef Bela Gil, que se tornou amiga de Janja, a socióloga traz “uma certa atualização para Lula” nas pautas pelas quais atua.
Gleisi destaca ainda que Janja defende a cultura e que ela tem uma grande articulação com o mundo artístico, algo que tem contribuído em agendas do petista.
O músico Caetano Veloso e a empresária e produtora Paula Lavigne, sua mulher, estiveram na casa de Lula e Janja na semana passada. Segundo ela, Janja afirmou que tem o desejo de reeditar o papel de uma primeira-dama, mas não entrou em detalhes.
A empresária diz ainda que achou a socióloga “muito preparada” e a par da situação da classe artística, “que foi alvo inicial da milícia digital bolsonarista”.
“Me deu tranquilidade. A questão digital às vezes é um assunto mais longe do Lula, mas senti que ela sabia exatamente o que eu estava falando”, diz a empresária.
Foi iniciativa de Janja reeditar o jingle da campanha presidencial de 1989, que foi mostrado com um videoclipe no ato de lançamento da candidatura de Lula no último dia 7.
No dia, após ser apresentada por Bela Gil como “‘maravilinda’, mulher incrível, feminista, empoderada e amiga”, a socióloga se virou a Lula, a quem chamou de “amor”, e disse que iria compartilhar o “seu presente de casamento”.
No vídeo, Janja aparece cantando ao lado de artistas como Pabllo Vittar, Martinho da Vila e Maria Rita. Desde então, nos eventos em que acompanha Lula, ela tem soltado a voz com o jingle e incentivado a plateia a cantar antes de o ex-presidente discursar.
A participação ativa de Janja, por outro lado, tem causado ciúmes e incômodo em petistas, que acreditam que ela comete “excessos”. Esse desconforto não é tratado publicamente e não tem sido levado ao ex-presidente.
No lançamento da chapa, por exemplo, apenas Lula e o ex-governador Geraldo Alckmin estavam previstos para discursar. Com presidentes dos partidos da coligação e aliados no palco, entre eles a ex-presidente Dilma Rousseff (PT), ex-governadores e ex-prefeitos, foi Janja quem conseguiu ter o microfone nas mãos.
Interlocutor de Lula próximo ao núcleo da pré-campanha ressalta ainda, sob reserva, que é preciso que Janja não contrarie discursos de outros petistas ao falar em eventos com Lula.
Secretária nacional de mulheres do PT, Anne Moura minimiza críticas direcionadas à socióloga e afirma que as pessoas não “estão acostumadas” com esse perfil. “A figura da primeira-dama sempre foi mais discreta, de não dar opinião e não participar”, diz.
O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) diz que não enxerga nela o perfil de “primeira-dama bibelô”. “Ela tem política na cabeça e irá contribuir.”
Figurinha carimbada da Vigília Lula Livre, montada em frente à sede da Superintendência da Polícia Federal em Curitiba enquanto Lula esteve preso, Janja visitou o ex-presidente com frequência.
Segundo relatos, ela escrevia cartas diariamente a Lula (que estão guardadas) e, às vezes, preparava refeições que eram levadas ao petista.
Foi em uma das visitas que eles teriam oficializado o relacionamento. A notícia do romance foi divulgada pela primeira vez pelo ex-ministro Luiz Carlos Bresser Pereira em 18 de maio de 2019.
“Está apaixonado e seu primeiro projeto ao sair da prisão é se casar”, escreveu nas redes sociais após ter visitado Lula.
Apesar disso, o ex-presidente e a socióloga já vinham mantendo uma relação —discreta e sem conhecimento até de pessoas próximas a Lula.
O petista chegou a confidenciar a poucos amigos sobre o novo relacionamento em dezembro de 2017, no dia da partida de futebol que marcou a inauguração de um campo em escola do MST em Guararema (SP).
Lula e Janja, no entanto, se conheciam antes disso.
Como a Folha mostrou em reportagem de novembro de 2019, durante sua passagem na Itaipu, a socióloga ficou conhecida como apadrinhada de Lula, de quem fazia questão de mostrar proximidade nas visitas feitas a Foz do Iguaçu durante o período em que ele ocupou a Presidência da República e também depois.
Desde que o ex-presidente deixou a cadeia, o casal vive junto. No começo do ano, mudaram-se para a capital paulista, onde moram com suas duas cachorras de estimação, Paris e Resistência.
Esse será o terceiro casamento do petista. Ele também foi casado com Maria de Lourdes, que morreu em 1971, e com a ex-primeira dama Marisa Letícia Lula da Silva, morta em fevereiro de 2017.
Após o casamento, Lula deverá ter “alguns dias de folga”. Ele deve retomar sua agenda na próxima segunda (23), em reunião com o núcleo da pré-campanha e Alckmin.