Lupi promete levar Ciro até o matadouro
Foto: Alexandre Cassiano / Agência O Globo
Cortejado por Luiz Inácio Lula da Silva desde o final do ano passado, o presidente do PDT, Carlos Lupi, garante que não cogita a possibilidade de retirar a candidatura à Presidência do seu correligionário, Ciro Gomes, para reforçar o palanque do petista, líder das pesquisas de opinião. Entre elogios ao cabeça de chapa petista, Lupi também aproveita para criticar a estratégia adotada por ele na construção de alianças Brasil afora:
— O Lula tem a estratégia da música dos Tribalistas: “Eu sou de todo mundo e não sou de ninguém”. Esse é o Lula, ele quer ser de todo mundo, mas não é de ninguém. É uma técnica de esperteza, mas que tem um limite que esbarra na realidade.
Em entrevista ao GLOBO, o cacique do PDT também minimiza os efeitos do conhecido temperamento de Ciro Gomes. Além disso, deixa claro que apoiará Lula num eventual segundo turno contra o presidente Jair Bolsonaro, diz que não gosta do que se conhece por terceira via e escancara as portas para uma aliança com Luciano Bivar, pré-candidato do União Brasil, partido com o caixa mais invejável do país, de cerca de R$ 1 bilhão.
— Sinceramente, eu não gosto do nome da terceira via, que já começa mal, já começa em terceiro. Tudo que começa em terceiro já não é muito bom. Nós temos um diálogo muito bom com o União Brasil, com o Bivar, com ACM Neto e com o Rueda, que são os dirigentes.
O ex-presidente ligou para o senhor. Sobre o que conversaram?
Eu não conversei com o Lula esse ano especificamente em nenhum momento sobre eleição nacional. Nós tínhamos conversado no final do ano passado. Nós temos um bom diálogo, mas ele respeita muito as decisões do partido. A decisão do partido está tomada em uma candidatura própria. Ele nunca voltou nesse assunto.
Mas alguma possibilidade de vocês dois sentarem antes da eleição?
Eu converso com todo mundo, só não converso com Bolsonaro. Agora, converso com clareza dizendo que a nossa candidatura do Ciro Gomes é irreversível. Eu não discuto mais esse assunto porque a decisão já está tomada, tivemos duas pré-convenções. Então, sobre o assunto o Ciro Gomes não tem mais o que quer conversar, a decisão já está tomada.
Teve pedetistas, que concorrem a governos nos estados, falando sobre a candidatura de Lula e deixando Ciro de lado…
Eu também falo muito bem do Lula. Eu gosto muito do Lula. Mas uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa. O partido existe para ter projeto, para ter candidatura. Por isso que é dois turnos. Não precisava ter dois turnos, né? Primeiro é como cada um apresenta o seu projeto, a sua proposta, para que no segundo turno, aí sim, ver quem está mais afim, que tem mais programas parecidos, projetos parecidos. Em nenhum momento eu discuti retirada do Ciro Gomes com ninguém. Até porque o partido não é uma propriedade particular, é uma decisão coletiva. Nós já tivemos duas pré-convenções.
A candidatura do Ciro realmente é irreversível?
Nós já tivemos algumas reuniões no ano passado, este ano já foram duas. O partido está unido em torno da candidatura do Ciro de uma maneira irreversível. Agora, nós entendemos, é claro, que cada estado tem a sua peculiaridade, suas alianças locais. Isso faz parte do processo político democrático.
A gente sabe que a estratégia do Lula é ter o máximo de palanques possíveis nos estados.
O Lula tem a estratégia da música dos Tribalistas: “Eu sou de todo mundo e não sou de ninguém”. Esse é o Lula, ele quer ser de todo mundo, mas não é de ninguém. É uma técnica de esperteza, mas que tem um limite que esbarra na realidade. Isso está começando a estourar lá em Minas, isso vai estourar em São Paulo. Como ele vai fazer o palanque do Haddad e do Márcio França? Não tem como dar certo isso. Uma coisa é dois palanques sendo um candidato ao governo e outro a Senado. Agora, como é que Lula vai ter dois palanques de governador? Na prática, isso não acontece, porque ou alguém está traindo alguém, ou todo mundo está traindo todo mundo.
Na prática, o que temos visto hoje é que os pré-candidatos do PDT estão mais próximos do Lula. Por exemplo, o Miguel Corrêa, em Minas Gerais, e o Weverton Rocha, no Maranhão…
O Miguel Corrêa ainda não é candidato. E ele se filiou agora, então ainda muitos vícios na sua origem [Corrêa se filiou ao PDT neste ano, mas já foi do PT]. E o Weverton tinha duelo lá no Maranhão muito forte com o Flávio Dino pelo apoio do PT. E o Flávio Dino resolveu escolher Brandão, que é o vice dele, e o PT está lá. O que que Weverton investe? Investe na base, na militância do PT que tem muita afinidade com ele. Ele já fez até um ato recentemente com esses militantes fazendo apoio a ele, de dirigentes municipais. Então isso é apoio. E repito a você, eu sou getuliano. Getúlio dizia, apoio não se discute, se aceita. Ninguém seleciona voto. Não conheço nenhum candidato no planeta que diga “não, esse voto eu não quero”.
Tem também o caso do Rodrigo Neves no Rio, que já se encontrou com Lula.
Ele se encontrou uma vez lá em São Paulo. Outra vez quando Lula se veio no Rio, numa festa do PCdoB, ele também estava. Agora, o Rodrigo pode ser tudo, menos burro. O palanque do Lula aqui é declaradamente do Freixo. Ele vai ser mais um para o Lula? Não tem a menor dúvida que ele não fará. Ele quer Lula no palanque dele, mas esse palanque ele vai dividir com o Freixo? Ele jamais faria isso. Ele é tudo, mas não burro.
É possível, nem que seja no segundo turno, uma aliança do PDT com o Lula?
No segundo turno, com certeza, estaremos contra Bolsonaro. De preferência, nós lutando contra Bolsonaro, mas aí só o tempo vai dizer.
Mas existe algum mal estar dentro do partido pelo posicionamento desses pré-candidatos aos governos no estado favoráveis a Lula?
Nenhum. Como acontece no Ceará, como acontece no Maranhão, há a possibilidade de ter dois palanques. Até porque há o candidato a governador do PDT e o candidato a senador do PT, por exemplo. Aí o candidato a senador faz a campanha do Lula, e o nosso candidato a governador faz a campanha do Ciro. Isso já foi assim na eleição de 2018, e em alguns estados será assim esse ano.
No Ceará, há um nó na aliança entre o PDT e o PT.
O diálogo que eu tenho, para ser absolutamente sincero, é que o Roberto Cláudio é o candidato mais forte em todas as pesquisas para evitar o Capitão Wagner. Ele é o nome mais conhecido, foi prefeito de Fortaleza durante dois mandatos, fez o seu sucessor. E qual é o problema com Roberto Cláudio? Porque nessas duas eleições que ele ganhou e na terceira com o próprio sucessor, o adversário era do PT, era a Luizianne Lins. Ela lidera a corrente do PT que não quer, não o apoio ao PDT, mas o apoio ao Roberto Cláudio. E aí começa essa questão. Nós vamos fazer uma aliança, vocês vão escolher o nosso candidato? É aí que está dando problema.
E tem solução esse nó?
O tempo vai mostrar a solução. A minha amiga Izolda, que é uma mulher muito preparada, não é muito conhecida. Será que ela consegue em 3 meses ter esse conhecimento antes da convenção para se tornar favorita? Não sei. Acho pouco provável.
O Ciro Gomes disse recentemente uma das lives dele que todos os candidatos, de todos os partidos, conforme ele frisou, devem se unir para evitar um eventual golpe do presidente Bolsonaro. O que isso quer dizer?
Essa nossa união já acontece na prática. Nós estamos com as oposições unidas. O líder das oposições hoje é, inclusive, um deputado federal nosso, o Wolney Queiroz. Nós tomamos várias ações esse ano conjuntas, ações judiciais, ações de plenário, de CPI. Então, essa unidade contra o Bolsonaro das oposições já está formada. O que não está formado é unidade em torno de uma candidatura. Nós temos mais de uma candidatura e cada um respeita a sua, isso é normal.
Mas há possibilidade nessa altura da disputa de criar uma aliança eleitoral contra Bolsonaro?
A aliança contra Bolsonaro é política. Eleitoral, cada um vai com o seu candidato.
O PDT diminuiu o tamanho no Congresso…
Ao contrário, ele vem crescendo. Se você pegar as quatro últimas eleições, o partido só cresceu. Agora na janela, perdemos alguns deputados. Mais ao mesmo tempo que alguns saem, outros entram. A nossa previsão é fazer mais de 35 deputados federais nessa eleição. Na última, nós fizemos 28. Na penúltima, de 2014, fizemos 23. Na antepenúltima, em 2010, fizemos 21. Acho que agora vamos fazer 35, é a nossa previsão.
Então é possível, em relação a verba partidária, tocar uma candidatura presidencial e as candidaturas para o Congresso ao mesmo tempo?
Isso aí, nós já temos decidido isso desde a última eleição um percentual para cada tipo de candidatura. Candidatura majoritária na última eleição, por exemplo foi 40% do total do fundo eleitoral. Isso foi para presidente, governadores e senadores. Já 30%, pela lei, é das mulheres, e os outros 30% dividimos entre os proporcionais. E é isso que nós vamos fazer de novo, essa mesma proporcionalidade.
Ciro disse recentemente que aceitaria Simone Tebet numa possível chapa. O senhor vê a possibilidade de aliança com MDB, com a Simone ou com os partidos da terceira via?
Sinceramente, eu não gosto do nome da terceira via, que já começa mal, já começa em terceiro. Tudo que conversa em terceiro já não é muito bom. Nós temos um diálogo muito bom com o União Brasil, com o Bivar, com ACM Neto e com o Rueda, que são os dirigentes. Com o PSD do Kassab, com o Paes, no Rio e o Kalil, em Minas. E estamos todos nós ainda avaliando, conversando, esperando o processo eleitoral evoluir para ver essas possibilidades. O diálogo está aberto.
O União Brasil hoje discute uma chapa pura com Moro no lugar de vice de Bivar. O Ciro já falou que com Moro ele não conversa.
A informação que eu tenho do União Brasil é que Moro será no máximo candidato ao Senado por São Paulo.
E o PSD no Rio, por exemplo, também não foi para frente aliança entre o partido e PDT.
Mas também foi para trás. Nós continuamos conversando. O Eduardo Paes quer um tempo para incentivar a candidatura própria do Felipe Santa Cruz, que é legítimo. Vai colocar ele na televisão. Então continuamos conversando para saber se ali na frente tem condições para estarmos juntos.
Em Minas, o Alexandre Kalil falou que quer uma aliança formal com o Lula.
Mas ao mesmo tempo ele elogiou muito o Ciro. Isso daí, às vezes as pessoas acham que pesquisa substitui a eleição. Pesquisa não substitui eleição. Eleição será só 2 de outubro. E até lá muitas pesquisas aconteceram, muita água vai rolar, alianças prováveis deixam de ser, improváveis podem ser. É do processo da vida. Política é igual a vida, tudo pode acontecer.
O Ciro vem falando que vai indicar o vice ou a vice dele só em julho.
É isso mesmo. A intenção é negociar essa posição de vice com um partido que esteja alinhado com a gente e que a gente possa fazer uma ampliação maior do arco de aliança, essa é a nossa intenção.
Além do União Brasil e do PSD, quais outros partidos podem vir para a aliança do Ciro?
Esses são com que a gente conversa com mais frequência. Mas tem diálogo também com parte do PSDB. Com o Tasso (Jereissati, senador do PSDB), com o Rodrigo Maia, que hoje é PSDB. Temos diálogo com o Cidadania, com Roberto Freire, com o Comandante Bittencourt, aqui do Rio de Janeiro. O diálogo existe com várias posições políticas. Agora, ninguém vai decidir nada agora, né? Todo mundo está esperando as coisas evoluírem.
E caso não consiga uma aliança, é possível uma chapa pura?
Pode, por que não? Nós estamos apresentando um projeto para o Brasil chamado Projeto Nacional de Desenvolvimento desde 2018. E nós temos na nossa decisão de que uma eleição presidencial em dois turnos permite que no primeiro turno cada um apresente o seu projeto para que, no final do segundo turno, aí sim, a gente veja quem está mais de cada projeto.
O temperamento do Ciro pode atrapalhar possíveis alianças?
Se comportamento implicasse qualquer tipo de conotação eleitoral, o Bolsonaro jamais seria presidente da República. Ele é ignorante, é grosso, xinga a mãe de todo mundo e hoje é o presidente da República. É uma péssima referência, mas é a realidade. Então, o temperamento não é um indicativo, é uma bússola para voto. Temperamento é uma reação que se tem para cada momento, em cada é situação. Em Ribeirão Preto, quem estava lá viu e eu tenho isso filmado, quando esse pessoal, na minha opinião, instruído pelo esquema dos bolsonaristas, foi lá e começou a ofender a mulher do Ciro, chamado a mulher dele de uma maneira desclassificada. Qualquer homem digno reage quando a sua esposa está sendo agredida, e foi que Ciro fez. A gente tem que analisar todo enredo. Não é só o capítulo final da novela, tem que saber como começou, o que aconteceu no meio para chegar ao final. O Ciro teve uma reação natural, legítima de qualquer ser humano quando se sente a agredido.
A campanha, que tem João Santana como marqueteiro, tem alguma estratégia para reverter essa imagem ou, pelo menos, aproveitar esse temperamento do Ciro?
Nós já estamos fazendo isso. Esse temperamento da sinceridade, da autenticidade, de ser verdadeiro não pode ser considerado como um temperamento negativo. Negativo na política deve ser de corrupto, de não ter projeto, de não ter coerência. Eu não vejo ninguém falar isso do Ciro. Quando vem algum tipo de reclamação do Ciro, é sempre sobre alguma rispidez da sua palavra, alguma palavra mais forte contra o adversário. E nunca sobre se ele é honesto, se ele é competente, se ele é preparado ou se ele tem uma incoerência política. É isso que importa, é isso que a gente vai realçar na campanha.
Mas é a rispidez, essa questão de ter uma palavra mais bruta?
Cada um tem um temperamento. A gente tem que trabalhar com uma realidade e o temperadamente de cada um.