Tribunal Militar condena racismo de superior contra subordinado

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Foto: Reprodução / Superior Tribunal Militar

O Superior Tribunal Militar confirmou sentença que condenou um soldado do Exército a dois meses e 20 dias de detenção, em regime inicialmente aberto, por injúria contra um terceiro-sargento negro. Segundo denúncia do Ministério Público Militar, o crime ocorreu em 8 de junho de 2020, na seção de cães do 5º Regimento de Cavalaria Mecanizado, em Quaraí, no Rio Grande do Sul. Na ocasião, o réu afirmou: “Garanto que aquele nego já foi fazer fofoca, que nego bem fofoqueiro”. Depois, em áudio enviado a outro militar, disse: “Este negão tá toda hora, toda hora se metendo nas baias, toda hora achando que manda aqui”.

As declarações ocorreram após o terceiro-sargento informar a uma oficial que havia presenciado uma discussão entre dois soldados. A oficial interpelou um dos soldados e este alegou que ‘nada de especial’ havia acontecido, registrando que o tom da conversa havia sido normal. No entanto, ao virar as costas, ela ouviu o réu proferir as ofensas. A oficial então questionou o acusando, indicando que ele estava sendo ‘descortês’, mas ouviu como resposta a frase: ‘Te liga não, já estou dando baixa mesmo’.

O caso chegou ao STM após o Ministério Público Militar e a Defensoria Pública do União entrarem com recursos contra decisão dada pela Justiça Militar da União, na Auditoria de Bagé (RS), em agosto de 2021. Na ocasião, réu foi condenado por unanimidade, mas não pelo crime imputado pelo MPM, de injúria racial. O Conselho Permanente de Justiça mudou o enquadramento do crime para injúria.

À corte superior militar, a defesa do soldado alegou que não ‘intenção de ofender a honra do 3º Sargento’. A Defensoria também alegou que as ‘palavras sequer foram proferidas diretamente ao ofendido, nem mesmo com o intuito de que fossem posteriormente direcionadas a ele’. “Jamais teve o intuito de que suas palavras chegassem ao conhecimento do ofendido”, disse a defesa do soldado.

Com relação à qualificadora de injúria racial, a defesa argumentou que havia provas de que o terceiro-sargento ‘era chamado de ´negão´ publicamente por outras pessoas’ – “nem por isso todos que o chamavam de ´negão´ estão sendo processados pelo delito de injúria racial”, sustentaram os defensores do soldado.

Já o Ministério Público Militar queria que o soldado fosse condenado por injúria racial, ‘na presença de várias pessoas, por duas vezes, com aumento de pena’.
Ao analisar o caso, o ministro Francisco Joseli Parente Camelo negou tanto o recurso do MP como o da defesa. Com relação ao primeiro, o ministro lembrou que o Supremo Tribunal Federal equiparou o crime de injúria ao racismo, considerando o mesmo imprescritível, mas entendeu que, no caso, não é possível afirmar, ‘com a certeza exigida, que o acusado teve a intenção de ofender a vítima em razão de sua raça ou sua cor’.

“De fato, como se ficou provado nos autos, ouve a ofensa, a injúria, em um momento de insatisfação e raiva por parte do ex-militar em relação ao sargento, todavia, afirmar que isso envolveu questões raciais já se mostra profundamente preocupante, afinal, é fundamental a existência do dolo com o elemento subjetivo especial de discriminar o ofendido em razão de sua raça ou cor, por exemplo”, ponderou.

Já quanto às alegações da defesa, Francisco Joseli Parente Camelo ponderou que as provas testemunhais são ‘são incontestes’ quanto à confirmação do crime.

“Injuriar significa ofender ou insultar (vulgarmente, xingar), todavia, para a caracterização do delito, não basta só isso, é necessário que a injúria atinja a dignidade ou o decoro da pessoa ofendida. Portanto, é um insulto que macula a honra subjetiva, arranhando o conceito que a vítima faz de si mesma , o que ficou caracterizado no presente caso. Nesse ínterim, não vislumbrando quaisquer excludentes de ilicitude ou de culpabilidade, não há motivos para reformar a Sentença condenatória”, registrou.

Estadão