Presidente do PDT diz que gênio de Ciro “atrapalha”

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Foto: Wenderson Araújo/Valor

Apesar de um cenário cada vez mais polarizado para a corrida ao Palácio do Planalto, o presidente nacional do PDT, Carlos Lupi, segue confiante em uma eleição em dois turnos e vê “salto alto” na campanha do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

“Meu amigo Lula está correndo um risco danado. Carmen Miranda, se estivesse viva, teria um salto de sapato menor que o do Lula. Estão se achando”, afirmou Lupi, em entrevista ao Valor

Na sua avaliação, a crise econômica e a pobreza vão empurrar o presidente Jair Bolsonaro para fora do segundo turno, dando lugar ao candidato do seu partido, Ciro Gomes. Para Lupi, a explosão dos preços dos alimentos tem mais impacto sobre a eleição do que os mortos na pandemia.

Lupi também admite que o temperamento de Ciro atrapalha em alguns momentos e avalia que ele errou ao viajar para Paris durante o segundo turno das eleições de 2018. A seguir, os principais trechos da entrevista:

Falta de apoio político
“As pessoas trabalham muito com a perspectiva de vitória, de poder. E prefeito é muito dependente do poder do governador e do presidente. O processo eleitoral é que nem partida de futebol. O Fluminense dominou o Flamengo e perdeu de 2×1. Não é quem joga melhor, é quem consegue fazer o gol. Acho que esse jogo não está jogado ainda. Nunca vi com tanta antecedência as pessoas decidirem uma eleição.”

Favoritismo do PT
“Meu amigo Lula está correndo um risco danado. Carmen Miranda, se estivesse viva, teria um salto de sapato menor que o do Lula. ‘Tem que desistir porque eu vou ganhar no primeiro turno.’ Ele não fala isso pra mim, mas fala no Maranhão, no Ceará, no Rio… Qual o papel de quem quer ganhar uma eleição? É ter humildade pra ganhar.”

Economia e eleição
“Brizola dizia que o que dói no bolso dói mais do que no coração. É fogo. Sou arrimo de família de novo e vou no supermercado até hoje. Vou porque sinto muito o que as pessoas estão sentindo e é impressionante o que estão pensando em relação aos preços. Moro no Leme, zona sul, classe média e pela primeira vez vi uma cliente pedir metade do pacote de carne moída. Isso é muito forte, infelizmente mais forte do que 660 mil mortes. Comida, combustível, botijão. Isso para Bolsonaro vai ser fatal. Em quatro meses mudam isso? Não conseguem. Pode segurar uma coisinha aqui, outra ali. Isso vai pesar muito. A rejeição dele vai acentuar muito por causa do preço da comida, do aluguel. Sou um dos poucos – eu, Ciro e João Santana – que acreditam em um segundo turno entre Lula e Ciro.”

Decisão em 1º turno
“Ao contrário do que dizem, eu acho inviável decidir essa eleição no primeiro turno. O eleitor que vota por exclusão não tem muita consistência. Ele é volátil. Se a gente botar uma opção, ele muda. E se você tirar 10% a 15% de Lula ou Bolsonaro, muda todo o quadro. Esse perfil da Simone Tebet, por exemplo, acredito que é mais próximo do eleitor do Bolsonaro que do Lula.”

Frente ampla
“Cada eleição é uma fotografia diferente da outra. Nessa, ele entra como favorito fora do poder. Lula é um homem que ficou muito machucado, foi preso. Não é fácil, não. Não desejo isso para o meu pior inimigo. Aliás, desejo: o Bolsonaro eu quero ver na cadeia. Quero e vou ver. Lula ficou muito machucado, perdeu irmão, neto, a mulher. Então, não queira vê-lo solene, a vida não é assim. E a vida muda ele num sentido que se reflete no seu entorno. Eles [PT] botaram que a prioridade é o Lula. Então, vamos abrir palanques em todos os Estados, para todos os aliados do Lula. Por que eles não fazem isso em São Paulo? Márcio França (PSB) é um candidato viável. Pra falar a verdade, o único lugar onde eles abriram pra valer foi em Pernambuco. É o discurso, mas não é a prática.”

Palanques estaduais
“Nós temos um partido. Com cerca de 3 mil vereadores, 70 deputados estaduais, 21 deputados federais e quatro senadores. Não somos um partido de aluguel, acabamos de completar 42 anos. E terá palanque [para o Ciro] em todos os Estados.”

Polarização
“Não é do estilo do Ciro agradar ninguém. Quem conhece sabe que ele não fala uma palavra pra agradar. Agora, quem quer furar uma polarização não pode bater só em um. Pra você furar, tem que ser diferente dos dois. Às vezes ele acentua mais a diferença com o PT, mas nunca deixou de bater no Bolsonaro. De cada duas diferenças fortes que ele apresenta em relação ao Bolsonaro, faz uma com o Lula. Mas tem que fazer. Se não fizer, por que ele é candidato?”

Temperamento
“Não quero que casem com ele, quero que votem. Temperamento típico padrão de político brasileiro ele não tem e nunca terá. Provocado, reage. Não espera dois minutos. Isso atrapalha no meio político? Atrapalha.”

Terceira via
“A gente está fazendo o que é possível, a gente resiste. Já tivemos Huck, Moro, Pacheco, Mandetta, Doria e o Ciro tá aí. Resistir já é uma façanha.”

Vice
“Tendo aliança, a prioridade é o nome da aliança. Na última eleição nós inventamos o nome da Kátia Abreu no dia convenção ou na véspera. Mulher, agronegócio, Centro-Oeste etc. Foi excelente, uma personalidade muito boa. O ideal para Ciro é um vice de São Paulo ou Minas. Continuamos conversando com o União Brasil, que agora lançou o Luciano Bivar, e com o PSD, do Kassab. A tendência majoritária do PSD é ter neutralidade. Tá bom. Deixa o Ciro aparecer com 12%, 15% que a coisa muda.”

Perspectivas para a bancada
“Na eleição passada o Ciro estava no mesmo patamar e fizemos 28 deputados federais. Hoje são 21. Alguns viraram prefeitos e outros botamos pra fora. Não fazemos menos de 35 deputados federais [em 2022].”

Paris
“Não achei correto ter feito isso. Cada um é dono do seu livre-arbítrio. Aqui, eu fui para a TV dizer que faria apoio crítico, não subi em palanque, não pedi voto, mas dei apoio. Acho ruim ter ido, deu discurso para o adversário. A cada tempo seu sofrimento. [Se Ciro não for ao segundo turno este ano] vou deixar para pensar mais à frente [no que fazer]. Mas votar em Bolsonaro, jamais.”

Petrobras
“É uma conquista do trabalhismo. É o coração de um projeto nacional que a gente tem, um símbolo da autodeterminação do povo brasileiro, da competência da engenharia nacional. Nós vamos rever a política de preços, isso é certo.”

Autonomia do BC
“Como você vai dar a regulamentação dos bancos para os próprios bancos? Isso é absurdo. O governo tem que ser mediador desse processo. Com 100% de certeza vamos rever.”

Teto de gastos
“Penso que despesa de custeio de saúde e educação não pode estar sob o teto. É principalmente sobre visão estratégica de Estado. Teto de gasto que envolva setores essenciais acho que não.”

Ruptura democrática
“O que o Bolsonaro quer é que a gente pense assim, Discuta o supérfluo e deixe de discutir governo. A rejeição do Bolsonaro prova que pão e circo têm limite. Esse tipo de pensamento é fora da realidade. Qual a ameaça que um cara que tem 56% de rejeição faz ao processo eleitoral? Bolsonaro vai ser rejeitado, vai sair pela porta dos fundos e para a cadeia. Então, vamos enfrentá-lo. Se o povo, como foi da outra vez, decidir dar a vitória para ele, o que eu posso fazer? Lamentar, chorar e me conformar”.

Valor Econômico