Reduto bolsonarista carioca já foi lulista
Foto: Evaristo Sá/AFP
Se as pesquisas de intenção de voto indicam as probabilidades de os candidatos vencerem as eleições, os mapas de votação obtidos em pleitos passados mostram com clareza a referência geográfica do que se acostumou a chamar de “redutos eleitorais”, bem como a evolução destes. Segundo maior colégio eleitoral do País e reduto bolsonarista desde 2018, o Rio, por exemplo, já foi quase 80% petista, na disputa de 2002, representando hoje um território a ser reconquistado pela campanha do ex-presidente.
Na disputa deste ano, uma parceria entre o Estadão e a agência Geocracia, especialista em geoinformação, vai permitir ao eleitor pesquisas detalhadas sobre como os mais de 5 bilhões de votos válidos e nominais foram distribuídos geograficamente no País desde 1996 a partir de dados oficiais da Justiça Eleitoral. A plataforma Geografia do Voto permite a geração de mapas interativos que podem ser compartilhados via redes sociais.
Com acesso gratuito e simples navegação, a ferramenta apresenta as possibilidades de pesquisa por ano, cargo disputado, Estado, município e zona eleitoral. No caso de disputas para o Executivo, como governador e presidente, é possível escolher ainda entre primeiro e segundo turnos, além de criar mapas que opõem adversários a fim de comparar seus desempenhos.
“A rastreabilidade do voto nos faz entender as estratégias dos políticos e ainda permite ao eleitor conhecer o histórico de votação dos candidatos. Agora, com a Geografia do Voto, essa pesquisa ganha uma plataforma mais amigável”, disse o geógrafo e advogado Luiz Ugeda, que criou a ferramenta de geoinformação a partir de dados abertos dos Tribunais Regionais Eleitorais (TREs). “As pesquisas tentam prever o futuro, mas pouco dizem sobre o passado.”
O passado eleitoral do atual presidente e pré-candidato à reeleição, Jair Bolsonaro (PL), mostra, por exemplo, que os votos que alcançou para ocupar uma cadeira na Câmara dos Deputados por 30 anos sempre teve como origem redutos militares no Rio, especialmente no sul fluminense – e muito antes de formar um governo com a participação de oficiais.
O mapa dos votos na região destaca amplo apoio nos municípios de Resende e Itatiaia, onde se localiza a Academia Militar das Agulhas Negras (AMAN), e Mangaratiba, onde está o Colégio Naval, de formação de aspirantes à Marinha. Redutos que se mantiveram fiéis a Bolsonaro, com diferentes proporções, quando seu principal concorrente na eleição deste ano, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), chegou ao poder.
Em 2002, o então deputado Bolsonaro conseguiu se reeleger. Ele obteve uma votação menor na capital (50 mil ante 74 mil em 1998) e uma transferência de votos significativa para São Pedro da Aldeia, outra importante base aeronaval da Marinha.
Nesse mesmo ano, não por acaso, a região metropolitana do Rio teve papel significativo na eleição do petista. Cidades como Duque de Caxias, Niterói, São Gonçalo e Magé deram a Lula mais de 80% dos votos. E mesmo em Resende, o porcentual de apoio superou 70% dos votos. Em 2018, as mesmas zonas eleitorais se tornaram antipetistas e apoiaram em massa a eleição de Bolsonaro, contra Fernando Haddad (PT).
“O Rio é, tradicionalmente, uma cidade com forte concentração de militares, mas os mapas mostram que o auge eleitoral de Bolsonaro se deu após as vitórias eleitorais do PT. A rejeição a Lula e Dilma, principalmente depois de 2010, fez com que a região caísse no colo dele”, afirmou o editor da Agência Geocracia, Carlos Vieira.
Como Bolsonaro e Lula não foram adversários em nenhuma eleição, não é possível comparar o desempenho direto entre eles. Entre os presidenciáveis que se apresentam neste ano, é possível comparar, por exemplo, a disputa entre Ciro Gomes (PDT) e Jair Bolsonaro, que se enfrentaram em 2018, e a de Luciano Bivar (União Brasil) e José Maria Eymael (DC), que concorreram à Presidência na eleição de 2006.
Os mapas de votação da Geografia do voto mostram, por exemplo, que Eymael superou Bivar por exatos 1.230 votos no ano em que Lula foi reeleito. Já no caso de Ciro e Haddad, as pesquisas reforçam o reduto eleitoral do pré-candidato do PDT. Mesmo perdendo na capital Fortaleza para o petista, em 2018, ele venceu no estado do Ceará, com 1,9 milhão de votos, contra 1,6 milhão de Haddad e cerca de 1 milhão para Bolsonaro.
Já em relação a Simone Tebet (MDB), os mapas são todos regionais e possíveis de serem acessados de 2002 para cá, quando a atual senadora estreou na política. Naquele ano, a presidenciável foi eleita deputada estadual pelo Mato Grosso do Sul como a mulher mais votada para o cargo, com mais de 25 mil votos – desses, 8.540 vieram da sua cidade natal, Três Lagoas, e de cidades vizinhas, como Paranaíba, Servília, Brasilândia e Água Clara.
Com o apoio do pai, o ex-senador Ramez Tebet (que morreu em 2006), Simone venceu a eleição para a prefeitura local e, em 2008, foi reeleita com 75% dos votos. Dali em diante, foi eleita vice-governadora e depois, senadora, já contabilizando 640 mil votos.