Ciro Nogueira defende generais e ataca banqueiros por eleições
Foto: Isac Nóbrega/PR
Se o senador Ciro Nogueira (PP-PI), chefe da Casa Civil da presidência da República, tem credenciais para falar pelo governo Bolsonaro, seria o caso de lhe perguntar: general, ministro da Defesa, pode defender a democracia, mas banqueiros não podem?
O general Paulo Sérgio Nogueira afirmou nesta terça-feira (26) que respeita a Carta Democrática Interamericana e seus princípios. Foi no discurso de abertura, em Brasília, da 15ª Conferência de Ministros de Defesa das Américas. O documento citado diz:
“Os povos da América têm direito à democracia e seus governos têm a obrigação de promovê-la e defendê-la”.
Na ocasião, o secretário de Defesa dos Estados Unidos, Lloyd Austin, presente ao encontro, defendeu que as Forças Armadas dos países da América devem estar sob “firme controle civil”, e o ministro da Defesa do Brasil não discordou, ou se o fez calou-se.
De Austin:
“Uma dissuasão confiável exige forças militares e de segurança que estejam prontas, capazes e sob firme controle civil. E exige que os Ministérios de Defesa atendam seus cidadãos de forma transparente e sem corrupção.”
“Nossos países não estão apenas unidos pela geografia. Também nos aproximamos por nossos interesses e valores comuns —o profundo respeito pelos direitos humanos, o compromisso com o Estado de Direito e a devoção à democracia”.
Mas logo cedo, no Twitter, o outro Nogueira, no caso o chefe da Casa Civil, um dos líderes do Centrão que despacha diariamente com Bolsonaro e nada faz sem antes combinar com ele, partiu para cima de banqueiros que assinaram carta em defesa da democracia.
Gestada na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), a carta reúne mais de 3 mil assinaturas de banqueiros, industriais, empresários de todas as áreas, juristas, ex-ministros do Supremo Tribunal Federal, professores e artistas.
Ela diz que o Brasil passa por um momento de “perigo para a normalidade democrática” e compara os ataques ao sistema eleitoral ao que chama de “desvarios autoritários” que puseram em risco a democracia nos Estados Unidos em janeiro de 2021.
No dia 6 daquele ano, quando o Congresso americano se preparava para confirmar a eleição de Joe Biden, o presidente Donald Trump, derrotado por ele, instigou seus devotos a invadirem o prédio do Congresso, e assim foi. Era o golpe que acabou frustrado.
Nogueira, o senador, não o general, viu na carta da USP uma manifestação contra Bolsonaro, que nenhuma vez é citado, e insinuou que os banqueiros a assinaram por terem perdido R$ 40 bilhões por ano como resultado do sucesso do PIX.
Alegou ainda que as personalidades que assinaram a carta só puderam se manifestar “porque estão livres de perseguição”. Seria também o caso de lhe perguntar: oi, existem pessoas no Brasil que não podem se manifestar porque poderiam ser perseguidas?
Nogueira disse mais:
“Sabe porque os banqueiros hoje podem assinar cartas inclusive contra o presidente da República, ao invés de se calarem com medo dos congelamentos de câmbio do passado?”
“Porque hoje, graças ao desprendimento do poder do Senhor (Bolsonaro) e à visão de país do ministro Paulo Guedes, o Brasil passou a ter um Banco Central independente. Antes, o Banco Central podia ser o chicote ou o bombom dos governos para os banqueiros”.
“Então, presidente, se o senhor faz alguém perder 40 bilhões por ano para beneficiar os brasileiros, não surpreende que o prejudicado assine manifesto contra o senhor”.
Roberto Setúbal e Candido Bracher (Itaú Unibanco) são dois dos banqueiros subscritores da carta. O Pix é uma invenção do governo Michel Temer, instituído pelo Banco Central por meio de portaria em maio de 2018, e finalmente implantado em 2020.
Em maio último, servidores do Banco Central criticaram o “uso eleitoral” do Pix por Bolsonaro e alegaram que o tema não estava presente em seu plano de governo desenhado para as eleições de 2018. Indiretamente, Nogueira, agora, lhes dá razão.
Lula e Dilma Rousseff, quando presidentes da República, cooptaram o senador Nogueira que os apoiou com entusiasmo. Bolsonaro não precisou cooptá-lo. Nogueira identifica-se com ele.