Cresce a pressão para legalizar “lobby” no país
Foto: Marina Ramos/Câmara dos Deputados
Há décadas em tramitação no Congresso, a proposta que regulamenta a atividade do lobby no Brasil ganhou novo fôlego recentemente. A Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) recomenda, entre outras medidas, a implementação das normas para a atividade, com o objetivo de viabilizar a participação do país na entidade, o que colocou a medida na lista de prioridades do governo no Parlamento neste ano.
Apesar de não ter sido regulamentada, a atividade foi reconhecida pelo Ministério do Trabalho em 2018 e recebeu o nome de relações institucionais e governamentais (RIG).
Em abril, o deputado Lafayette de Andrada (Republicanos-MG) apresentou requerimento de urgência para a apreciação da matéria. Coordenador da Frente Parlamentar Mista sobre a regulamentação do lobby, ele defendeu a prática, em que grupos organizados buscam pressionar ou influenciar a decisão de parlamentares para pautar e votar projetos de interesses dos respectivos segmentos.
“É óbvio que é necessário você conversar com quem é afetado pela lei. Se eu estou fazendo uma lei que trata de saúde, é natural que hospitais venham me procurar, que associações de médicos e enfermeiros venham me procurar e mostrar coisas que são boas ou que não são”, defendeu Andrada. “É importante essa interlocução. Não pode parecer que essa interlocução é de alguém levando vantagem sobre alguém, mas ficou na cabeça das pessoas que lobby é levar vantagem. Não é isso.”
Este mês, o relator da proposta, deputado Augusto Coutinho (Republicanos-PE), divulgou seu parecer. Foram apensados dois projetos: o do deputado Carlos Zarattini (PT-SP) e outro procedente do Executivo, mais recentemente.
Para a elaboração do relatório, Coutinho debruçou-se sobre a legislação já aplicada em outros países, como os Estados Unidos e o Chile.
“Recebi muitas entidades interessadas nessa questão e, com as análises, chego à conclusão de que, hoje, o projeto dos EUA ficou muito rígido. Acho que a gente tem de fazer uma coisa que torne transparente, mas que seja executável, exequível. Foi isso que procurei fazer”, disse.
O relator destacou que a atividade existe claramente no Congresso, há muitos anos, e que, por isso, há ainda maior necessidade de regulamentá-la.
A tramitação deve ser simples, sem necessidade de o texto ir a plenário. “Não é uma matéria nem de governo nem de oposição, é do país, o Parlamento tem de construir. O governo passa. Não tem por que questionar”, frisou. “É uma matéria que tem um rito que pode não precisar ir a plenário, pode ser só de comissão. Vai para a Comissão de Desenvolvimento Econômico e, depois, para a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). É terminativa, só vai a plenário se houver requerimento.”
Não é apenas o Executivo que se interessa pela aprovação da proposta. Entidades da sociedade civil que atuam na área entendem como positiva a regulamentação. “A gente vê com um olhar muito positivo a iniciativa de se regulamentar o lobby. A atividade do lobby existe e, ao não ser regulamentada, acontece de uma forma muito heterogênea”, afirmou Luciana Barbetta, diretora-geral da Powell Tate no Brasil. “Nem sempre há prestação de contas, isso impacta a transparência, e, uma vez que você pega uma atividade que existe e cria uma regulamentação para ela, passa a ficar mais padronizada, a seguir certos parâmetros mínimos para funcionar”, acrescentou. A Powell Tate no Brasil acompanha a tramitação da proposta há quatro anos e contribuiu com as discussões nas comissões.
Na avaliação da presidente da Associação Brasileira de Relações Institucionais e Governamentais (Abrig), Carolina Venuto, a regulamentação será positiva, não apenas para “desmistificar” a ideia de que a prática está atrelada à corrupção, mas para tornar mais democrático e igualitário o acesso às autoridades públicas no Congresso.
“Em meio a muitas notícias que ligavam supostos lobistas a práticas criminosas, nós fundamos a Abrig em 2007. O primeiro marco-temporal desse apoio à regulamentação é de 2016, quando a Abrig aprovou em assembleia-geral, por unanimidade, que ia defender a regulamentação da RIG. Assim, coloca por terra o argumento de que os profissionais da área não teriam interesse na regulamentação, muito pelo contrário”, enfatizou. “Ficou claro que era bom ter regras definidas para distinguir os profissionais que trabalham de forma ética e, assim, promover transparência e combate à corrupção. Quando a gente põe regras claras, consegue separar o joio do trigo dessa relação público e privado.”
Como o projeto ainda não foi votado, Carolina Venuto explicou que, em 2020, a Abrig lançou — em parceria com a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) — um manual de Prática Recomendada RIG, para funcionar como uma espécie de “autorregulamentação”.
A regulamentação também poderá contribuir para o crescimento do mercado, segundo avaliação de James Meszaros, um dos consultores globais da Powell Tate. “Certamente fará o mercado crescer, mas outra coisa que contribui é quando o governo cresce também. E quanto mais o governo cresce, mais influência tem nos negócios, na sociedade, na economia e nos direitos civis”, argumentou. “Consequentemente, você tem mais organizações que querem influenciar nesses contextos. A indústria também acaba por crescer”, emendou ele, que nota tal elevação nos Estados Unidos, desde a implementação da medida.
Um dos principais objetivos da aprovação da proposta é fornecer mais transparência aos processos de participação da sociedade civil no Legislativo. Para a diretora-executiva de Assuntos Corporativos da Unilever América Latina, Suelma Rosa, quanto maior o nível de transparência, maior o controle social e o entendimento de quais são as finalidades da defesa de interesse. “Além disso, garante que atores da sociedade possam, de fato, participar do processo de formulação de políticas públicas, como pressupõe a democracia representativa, com isonomia nessa participação”, explicou.