Castro usa escola na campanha ilegalmente e alunos reagem
Foto: Rafael Campos/Divulgação
O governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL), candidato à reeleição, usou na última sexta-feira (12) a biblioteca de uma escola pública como estúdio de gravação para sua campanha.
Ele reuniu por 1h30 alunos e profissionais do Colégio Amaro Cavalcanti, no Largo do Machado, numa roda de conversa. É a escola estadual mais próxima do Palácio Guanabara, a sede do governo, distante 1,2 km.
Entre os participantes da gravação a ser veiculada na propaganda de TV estava a diretora da unidade, Maria da Penha Lira. Ela também segurava, durante a produção, o termo de autorização do uso de imagem para a campanha, a ser assinado pelos participantes.
A lei eleitoral proíbe aos agentes públicos o uso de bens do estado em benefício de candidatos. Também veda a utilização do serviço de servidores para comitês de campanha. De acordo com a legislação, a prática tende “a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos” na eleição.
Especialistas ouvidos pela Folha avaliam que Castro violou a lei eleitoral. A pena prevista é multa de até R$ 400 mil, e o responsável fica sujeito à cassação do registro de candidatura ou do diploma.
Abordado após a gravação, Castro negou irregularidades. “Se o jurídico da campanha autorizou, com certeza é [legal].” O governador também considerou adequada a participação de servidores na gravação. “Eles não ajudaram a campanha em nada. Não pediram voto. Foi só uma gravação.”
Em nota, a Secretaria de Educação disse que as atividades escolares não foram interrompidas e que a indicação dos alunos à gravação foi feita pela assessoria de imprensa, como em “qualquer filmagem”.
Quando Castro chegou à escola, às 9h40, os alunos o aguardavam nas janelas e nas escadarias da unidade. Ao entrar, foi vaiado e alvo de gritos de “bandido” e “fora, Bolsonaro” —ele tem o apoio do presidente Jair Bolsonaro (PL). O governador foi direto para a biblioteca. Logo atrás, os jovens que participariam da gravação o acompanharam. Um bufê estava à disposição na entrada da sala.
A equipe na biblioteca já o aguardava com iluminação especial preparada para a gravação. As cadeiras foram dispostas em círculo para a roda de conversa —cena habitual em programas eleitorais.
Antes do início da gravação, Castro conversou rapidamente com os jovens. Ele recebia orientação da equipe de filmagem, que num momento se queixou do barulho de celulares na sala e de ruídos externos.
Castro teve de repetir ao menos quatro vezes o início do vídeo em que fala sobre o projeto Mãe (Mulheres apoiando a educação). “Eu sou o Cláudio Castro. Eu governo o Rio há apenas dois anos. Nesse pouco tempo, se eu tivesse impedido uma única criança de abandonar a escola, já teria valido a pena.”
Durante o período de gravação, diversos alunos permaneceram nos corredores da escola, sem assistir às aulas. A reportagem viu quatro estudantes deixando a unidade no horário escolar.
Depois de 1h30 na biblioteca, Castro filmou na área aberta em frente à escola. Em seguida, fez, durante 13 minutos, o que chamou de vistoria. Visitou algumas salas de aula de um dos andares do colégio.
O governador negou ter interferido na rotina escolar. “Não atrapalhei em nada. Ficamos num cantinho. Acabei de gravar e fui fazer uma vistoria que os alunos pediram, sem câmera. Aí fui como governador.”
Alguns especialistas ponderam que gravações em bens públicos são permitidas. Mas avaliam que as imagens devem captar uma visita sem alteração da rotina do local e sem preparação prévia.
“O que não pode é utilizar o espaço como um cenário, um estúdio. O problema é interferir nas atividades que estão sendo realizadas”, afirma Ricardo Vita Porto, presidente da Comissão Eleitoral da OAB-SP.
O advogado Eduardo Schiefler avalia que a legislação impede a captação de imagens em escolas por não serem um bem público de acesso irrestrito. “O fato de ele ser governador impacta na igualdade de oportunidades entre candidatos. Não é tão simples para um outro candidato ter acesso à Secretaria de Educação, pedir essa autorização, organizar essa ida para a escola e fazer uma gravação”, afirma ele.
A campanha de Castro afirmou, em nota, ter seguido “todas as determinações do TSE durante a gravação do vídeo”. “Não houve interrupção de aulas nem do expediente dos professores e de profissionais de educação. A gravação, inclusive, foi realizada em um espaço isolado e sem uso naquele momento.”
De acordo com a campanha, “a indicação dos estudantes e dos profissionais que participaram da filmagem foi feita pela Secretaria de Estado de Educação, como de praxe”. “No final, a pedido do Grêmio Estudantil, o governador fez uma vistoria no colégio, sem a presença da equipe de gravação”, diz a nota.
A equipe de campanha de Castro afirma que o bufê foi custeado pela produtora de vídeo.
A Secretaria Estadual de Educação, por sua vez, diz que “acompanha, por meio da sua assessoria de imprensa, a gravação de vídeos e reportagens em escolas e espaços do órgão”. “As atividades no colégio, sejam em sala de aula ou em outros locais, não foram interrompidas em decorrência da gravação. Para não atrapalhar as aulas, a filmagem aconteceu em uma sala de leitura “, afirmou a pasta em nota.
“Vale ressaltar que a escolha dos alunos e dos profissionais da pasta para qualquer tipo de filmagem é feita por indicação da assessoria de imprensa, que já possui um levantamento sobre os beneficiados por projetos e ações da secretaria.” A secretaria afirma ainda que não teve conhecimento do bufê, mas declarou não ter ocorrido gasto de dinheiro público com alimentação durante a gravação.