Especialista diz que Bolsonaro baixará bola no JN
Foto: TV Globo
O presidente Jair Bolsonaro (PL) concede entrevista ao Jornal Nacional, da TV Globo, nesta segunda-feira, 22. O candidato à reeleição inaugura a série de entrevistas, que receberá os principais presidenciáveis ao longo da semana, marcada ainda pelo início da propaganda eleitoral no rádio e na TV, dia 26. Já no domingo, 28, os eleitores poderão acompanhar o primeiro debate entre os principais concorrentes ao Palácio do Planalto.
Segundo interlocutores do chefe do Executivo, Bolsonaro vê no convite uma oportunidade para se comunicar com a faixa mais pobre do eleitorado, que, segundo as pesquisas, tem se mostrado mais propensa a votar em Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Um dos programas de maior audiência do País, o Jornal Nacional registrou 26,6 pontos no Kantar Ibope Media na segunda-feira passada, dia 15. Cada ponto equivale a 205 mil espectadores na Grande São Paulo. Nos bastidores, o presidente indicava que se recusaria a dar a entrevista, não fosse o tamanho expressivo do público que pode ser atingido. Ele demorou a confirmar a participação nos termos definidos pela emissora, de que a entrevista fosse presencial, nos estúdios do telejornal, no Rio de Janeiro.
O noticiário recente sobre o Poder Executivo e a campanha eleitoral, bem como a postura de Bolsonaro de questionar a segurança das urnas eletrônicas, sem provas, reiteradamente, indica que temas incômodos ao presidente serão abordados. Entre eles, o orçamento secreto, esquema revelado pelo Estadão em 2021; as denúncias de corrupção envolvendo o Ministério da Educação e a Codevasf, também reveladas por este jornal; a gestão do governo federal diante da pandemia de covid-19, que foi criticada abertamente em editoriais da TV Globo e a proximidade do presidente com o Centrão, bloco político ao qual ele prometia não se aliar; entre outras pautas.
O cientista político Marco Antônio Carvalho Teixeira, professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), aponta que Bolsonaro é uma “caixa de surpresas”, mas certamente tentará seguir a linha da moderação na entrevista, dado que pesquisas mostram que ele perde apoio quando radicaliza. A estratégia mais provável do presidente, segundo Teixeira, será vender feitos de seu governo, como a recente redução do preço dos combustíveis e o aumento do valor de benefícios sociais. Bolsonaro também deve se apresentar como o pai do auxílio emergencial, embora ele tenha sido contra a medida no início da pandemia.
A participação do presidente no programa “revela um momento de risco para Jair Bolsonaro, justamente porque ele chega no processo eleitoral em um momento indefinido sobre se vai haver segundo turno ou não”, segundo Teixeira. “Por outro lado, revela que o presidente está numa linha muito delicada: ele não pode radicalizar, porque as pesquisas mostram que ele perde apoio quando radicaliza, mas, ao mesmo tempo, ele certamente vai ser indagado sobre questões que vai ter dificuldade de responder. Como ele vai sair dessas armadilhas, só no momento é que vamos saber”, afirmou.
“Ele fará um esforço de moderação que, dependendo da pergunta, talvez ele não resista e comece a mostrar algum tipo de agressão verbal”, completa. O professor presume ainda que o presidente deve evitar questões de cunho religioso na televisão, restringindo esse assunto aos atos de campanha e às visitas aos templos.
A campanha do presidente insistiu para que ele se preparasse para a entrevista e passasse por um media training, isto é, um treinamento com assessores antes da conversa com William Bonner e Renata Vasconcellos, apresentadores do jornalístico. Ele não quis. Dessa recusa, existe a possibilidade de o presidente acabar mostrando o “Bolsonaro raiz”, sem continência verbal, como em sua participação no mesmo programa em 2018, embora esse comportamento não seja recomendado por seus conselheiros de campanha.
Assim como outras empresas de comunicação, a Globo é alvo frequente de críticas e reclamações por parte do chefe do Executivo, o que confere tensão à sua participação no programa. Em 2018, durante a campanha presidencial, Bolsonaro confrontou os apresentadores do Jornal Nacional com um editorial de 1984 do jornal O Globo que chamava o golpe militar de “revolução”. O Grupo Globo rebateu o artigo em 2013 e publicou um mea-culpa classificando-o como um “erro”.
Foi também na participação em 2018 que Bolsonaro reforçou uma fake news que já circulava nas redes sociais. Segundo o então candidato à Presidência, o livro “Aparelho Sexual & Cia” faria parte de um “kit gay” distribuído nas escolas durante os governos petistas. A alegação ganhou notoriedade e foi um dos grandes temas da campanha daquele ano. Na ocasião, o então deputado federal fez, ainda, questionamentos a respeito do salário de Renata Vasconcellos, provocou Bonner sobre seu divórcio com Fátima Bernardes e alegou que a TV Globo sobrevivia de “recursos da União”.