Uso de robôs bolsonaristas é desmascarado

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Foto: Eduardo Anizelli/Folhapress

Apoiadores do presidente Jair Bolsonaro (PL) utilizaram bots (robôs) para impulsionar no Twitter o lançamento de sua candidatura à reeleição, indica a ferramenta Pegabot, algoritmo desenvolvido pelo ITS-Rio (Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro), formado por pesquisadores de universidade como UERJ (Universidade Estadual do Rio de Janeiro), FGV (Fundação Getulio Vargas) e MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts) Media Lab.

O PL oficializou o lançamento da reeleição de Bolsonaro durante convenção partidária realizada no Maracanãzinho, no Rio, no dia 24 de julho. No dia seguinte, o Pegabot analisou por 24 horas no Twitter o comportamento da tag #CapitaoDoPovoVaiVencerDeNovo.

“Essa hashtag mobilizou um volume relevante de compartilhamentos em um curto espaço de tempo”, diz o ITS-Rio sobre os bots.

Como funcionam os bots e o que o Pegabot descobriu?

Esse robôs funcionam retuitando de forma automática e em sequência posts de pessoas reais que utilizam uma determinada hashtag. Isso faz com que ela apareça em mais post, elevando seu desempenho no Twitter e figurando entre os assuntos mais comentado na rede social.

O instituto explica que, em média, um mesmo usuário mencionou até três vezes a hashtag #CapitaoDoPovoVaiVencerDeNovo. Para o levantamento, foram selecionados os usuários que publicaram pelo menos cinco vezes, “e analisamos a existência de comportamento automatizado entre eles usando o Pegabot”.

A conclusão é que 46% dos 17.068 usuários analisados “apresentaram probabilidade de comportamento automatizado com valor igual ou maior a 70%”, respondendo “pelo compartilhamento de 26.760 tuítes e retuítes, 58,8% do volume total de tuítes coletados [45,5 mil]”.

Alguns usuários chegaram a compartilhar tuítes e retuítes mais de 200 vezes. Um deles chegou a realizar 219 publicações.” Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro

Como o Pegabot encontra os robôs no Twitter? Responsável pelo departamento de Democracia e Mídias no ITS-Rio, Karina Santos conta que o instituto monitora hashtags diariamente, “identificando quais despontam de forma potencialmente suspeitas”, como foi o caso da #CapitaoDoPovoVaiVencerDeNovo.

“A velocidade de compartilhamento e o tipo de engajamento em torno de um tema indica uma possibilidade de comportamento inautêntico”, afirma. “O algoritmo analisa características do perfil, o tipo de engajamento na plataforma, linguagem utilizada na conta e a rede de seguidores ao redor do usuário.”

Por que o uso de robôs é perigoso? A especialista alerta que, nas redes sociais, a inteligência artificial sem transparência “pode ser usada para inflar um discurso específico, construir e espalhar narrativas, criar bolhas de conteúdo e disseminar desinformação”.

Vemos um forte uso de bots pra viralizar informações com o objetivo de enganar a opinião pública, falsificando uma sensação de importância e apoio. São utilizados para que um conteúdo pareça ter sido comentado por todos sem o ser, para descredibilizar determinadas personalidades ou enaltecer outras figuras.” Karina Santos, do ITS-Rio

O que diz a lei? A lei eleitoral só permite que conteúdos sejam impulsionados nas redes sociais se o autor pagar para que a plataforma, como o Twitter, espalhe a informação.

O uso de robôs, no entanto, é proibido, afirma o advogado especialista em direito público Roberto Piccelli, que cita a lei 9.504/97, alterada em 2017. Um dos trechos diz que que “Não é admitida a veiculação de conteúdos de cunho eleitoral mediante cadastro de usuário de aplicação de internet com a intenção de falsear identidade”.

Em outro, afirma que “é vedada a utilização de impulsionamento de conteúdos e ferramentas digitais não disponibilizadas pelo provedor da aplicação de internet”.

E se o responsável pelo robô for pego? O TSE (Tribunal Superior Eleitoral) só interfere no assunto se receber alguma denúncia formal “de qualquer cidadão, incluindo dos adversários”, explica Piccelli, que estuda a relação entre Constituição e mídias digitais.

A lei prevê multa de R$ 5.000 a R$ 30 mil ao autor, caso identificado, e também ao candidato beneficiado “quando comprovado seu prévio conhecimento”. Já a rede social estará sujeita a multa apenas se descumprir ordem judicial para retirar o conteúdo do ar.

“Por mais que possamos supor que a iniciativa tenha partido de usuários sem o conhecimento da campanha, o uso de robôs fere a lógica do controle das despesas eleitorais”, diz o advogado. “Afinal de contas, é uma contribuição inoficiosa à campanha do candidato beneficiado, provavelmente de uma fonte ilícita.”

O que diz a campanha do presidente? Procurada, a campanha de reeleição do presidente não respondeu até a publicação desta reportagem. O UOL também procurou o TSE, mas não recebeu resposta.

O Twitter disse por meio de nota que “não identificou comportamento automatizado generalizado na amplificação da hashtag por robôs”.

“Menos de 10 contas envolvidas na hashtag foram identificadas como em violação à nossa política anti-spam e devidamente suspensas”, diz.

A plataforma diz que ferramentas de terceiros “acessam informações públicas das contas, dados muito limitados para essa análise”.

Em 2020, o tribunal firmou uma parceria com WhatsApp, Twitter, Facebook, Instagram, Google e TikTok, que prometeram desenvolver ferramentas para rastrear os perfis falsos.

Questionado sobre o projeto, o Twitter não respondeu. Disse que “o TSE tem um canal direto e permanente de contato com o Twitter para discutir iniciativas, melhores práticas e ações necessárias para proteger a integridade das conversas sobre as eleições”.

“Este é um trabalho adicional à imposição regular e frequente de nossas regras, incluindo as para combater spam e manipulação da plataforma, e à detecção cada vez mais proativa de potenciais violações a elas.”

Segundo dados divulgados recentemente pela plataforma, dos 238 milhões de perfis ativos na rede, 5% são automatizados. O dado é contestado pelo bilionário Elon Musk, que decidiu cancelar a compra da plataforma ao alegar falta de transparência do Twitter sobre perfis falsos.

Karina defende uma regulação “ao estilo folow the money”, que é seguir o dinheiro de quem financia essas campanhas coordenadas “porque o mercado da desinformação no Brasil é muito bem estruturado”.

“Em cenário eleitoral, esse uso pode ter um impacto direto na decisão de voto do eleitor, o que é muito preocupante”, conclui.

Uol