Agitar bandeiras de candidatos vira saída para desempregados
Foto: Márcia Foletto/Agência o Globo
Moradora do bairro São Mateus, em São João de Meriti, na Baixada Fluminense, Jéssica Santos acordou às 5h na última quarta-feira. Desempregada e sem dinheiro para o ônibus, ela caminhou cinco quilômetros até o comitê de um candidato a deputado estadual para tentar uma vaga de “bandeirete”, como são chamadas as mulheres que atuam como cabos eleitorais remuneradas nas ruas da região. Diárias que variam de R$ 50 a R$ 80 por uma jornada que vai das 8h ao cair da noite são disputadas por quem tenta fugir do desemprego e da fome. Depois de duas horas numa fila com cerca de 30 pessoas, porém, Jéssica descobriu que as vagas para aquele dia já estavam preenchidas. Fez um cadastro e ouviu a promessa de ser chamada na reta final da campanha.
— Esperava conseguir ao menos hoje para voltar com alguma comprinha. Agora é rezar para me chamarem — disse Jéssica, enquanto observava, resignada, cabos eleitorais que saíam para um dia de bandeirada.
De acordo com o IBGE, 9,9 milhões de brasileiros buscavam uma vaga de emprego no trimestre encerrado em julho. A este cenário se soma a inflação, sobretudo dos alimentos, que corrói a renda dos mais pobres . Por outro lado, os partidos políticos estão com mais dinheiro para gastar este ano com a campanha, depois que o Congresso turbinou o fundo eleitoral para R$ 4,9 bilhões. Assim, a situação de Jéssica não é um fato isolado.
Coordenador de campanha na Baixada, Marcelo Filho diz que a procura pelo trabalho nas eleições deste ano surpreendeu. E não tem diminuído mesmo com as campanhas nas ruas.
— Nos primeiros dias, a gente se assustou. Chegávamos no comitê e tinha 100, 200 pessoas esperando. Como encontramos outras campanhas na rua, vimos que não é só aqui. A gente procura ajudar ao máximo, mas infelizmente não dá para atender todo mundo.
A aposentada Regina dos Santos conseguiu uma vaga. Com uma família composta de cinco filhos e 16 netos, boa parte sem trabalho, ela se disse feliz com a oportunidade de balançar sua bandeira na Praça da Matriz, em São João de Meriti. E já fazia planos de compras para R$ 250 que receberia no fim da semana:
— Vou ao mercado assim que receber. Vou comprar arroz, feijão, um macarrão, salsicha, ovo e o meu cafezinho. Depois a gente vê o que sobra e durante a semana administra.
Em Belford Roxo, também na Baixada, a disputa por uma vaga é ainda mais acirrada, principalmente se for na campanha de reeleição da deputada federal Daniela do Waguinho (União Brasil). Casada com Waguinho, prefeito da cidade, ela parece investir muito no seu time de “bandeiretes”. Elas têm um perfil parecido: geralmente mulheres entre 18 e 30 anos com um tipo físico propício para ser destacado pelo uniforme, um macacão de lycra azul e amarelo. Elas costumam preceder a candidata nos eventos eleitorais, executando coreografias com bandeiras nas mãos. Nas ruas são conhecidas como “wagnetes”.
— Treinamos algumas coreografias entre nós. Parece fácil ficar bandeirando, mas não é. Temos de estar sempre ativas para chamar atenção dos eleitores e conquistar o voto — conta Karoline Xavier, mãe solo de três filhos.
As condições de trabalho são bem melhores que as das outras campanhas. Elas ganham R$ 1.100 a cada 15 dias de trabalho. A jornada vai das 8h ao anoitecer, mas com direito a café da manhã, almoço e lanche. As que moram longe são transportadas numa van da campanha. Mas muita gente reclama dos critérios da seleção, que privilegia o mesmo perfil feminino. Procurada, a campanha de Daniela do Waguinho não se pronunciou.