Ciro agora fala em “estelionato eleitoral”
Fotos: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press
Para o presidenciável Ciro Gomes (PDT), o eleitor está diante de um grande estelionato eleitoral caso prevaleça a polarização entre Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL), conforme vêm apontando as pesquisas de intenção de votos. De acordo com Ciro, os dois não têm propostas para o país, daí porque o pedetista enfatizar ser o único na atual disputa que tem um plano para mudar a “tragédia econômica, e a tragédia de governança política, que só faz a corrupção mandar sempre no Brasil”.
Na entrevista que concedeu à jornalista Denise Rothenburg, ontem, no CB.Poder — parceria entre o Correio e a TV Brasília —, Ciro insurgiu-se contra a campanha do voto útil em favor de Lula e a comparou a um projeto de aniquilação política. “Me sinto como um cara objeto de extermínio. Não tem respeito nem pudor, são nazistas mesmo”, afirmou, criticando também o PT. Para ele, o eleitor está desorientado “pelo ódio e pela paixão a votar contra o comunismo e contra o fascismo”. E deixou claro que o debate ideológico “não vai botar comida no prato”.
Na apresentação do seu projeto para a economia, defendeu a taxação de grandes fortunas, de lucros e dividendos de empresas e acionistas e propôs a renegociação das dívidas dos cidadãos. “Vou pegar uma parte disso para diminuir os impostos da classe média e do povão, e vou aumentar os impostos sobre os super-ricos. Aqui está a chave para resolver a equação fiscal dos brasileiros”, prometeu. Leia a seguir os principais trechos da entrevista.
O senhor promete resolver a vida de quem está com o nome no Serasa. Como o senhor vai fazer isso? E essa proposta vem acompanhada de uma educação financeira?
Tenho um projeto nacional de desenvolvimento e as pessoas, às vezes, pensam que isso é uma proposta à parte. Não, nossa economia não cresce mais. Faz 11 anos que nós estamos crescendo quase zero. E o crescimento da economia vem de alguns fatores: o investimento privado, o investimento público e os caminhos da industrialização. Mas, fundamentalmente, 60% do crescimento da economia quando acontece vêm do consumo das famílias. Se as famílias consomem, o comércio vende mais, contrata mais gente, encomenda mais da indústria; a indústria contrata mais gente, compra mais matéria-prima, a traquitana da economia gira. De onde é que vem o consumo das famílias? Vem de emprego, renda, crédito. Emprego e renda vêm depois que a economia cresce e estão no pior momento de baixa. A renda brasileira está na pior série histórica, nosso salário mínimo é o pior das Américas — só ganha do da Venezuela — e o emprego está aí atolado em 10 milhões de pessoas desempregadas e 5 milhões no desalento. Fui lá no Serasa, foi lá estudar no SPC, etc., e encontrei 63 milhões de pessoas como legado do nacional-consumismo do PT. Que dívida é essa? R$ 4 mil por cabeça. Com o desconto que eu consigo, reduz essa dívida em 90%. Sabe o que é que dá isso? R$ 400. Chamo o Banco do Brasil e vou financiar via Banco do Brasil. Com isso restauro a condição do crédito popular e começo a ativar a economia para dizer de onde vêm os empregos que eu vou gerar.
Todo mundo diz que é necessário um ajuste fiscal, que ainda não veio, e o Congresso tem um orçamento secreto, que consome os recursos que deveriam ir para as grandes obras. Como tratar disso, uma vez que o PDT é um partido pequeno?
O ajuste fiscal disponível para o povo brasileiro estudar e apoiar, ou não, o único que tem é o meu. Só em linha com a melhor literatura, tem R$ 300 bilhões por ano para botar no caixa. R$ 70 bilhões acabam o déficit primário. E os R$ 230 bilhões, vou pegar uma parte disso para diminuir os impostos sobre a classe média e o povão, e vou aumentar os impostos sobre os super-ricos. Aqui está a chave para resolver a equação fiscal brasileira. O imposto sobre lucros e dividendos empresariais já cobrei quando fui ministro da Fazenda — e só Brasil, Estônia e Colômbia não cobram.
E tem um projeto lá no Senado que o reestabelece…
Vou cobrar, já propus, já cobrei quando fui ministro da Fazenda. Uma progressividade maior no Imposto de Renda, um corte de 20% nas renúncias fiscais. No Brasil, salmão, queijo suíço, filé mignon não pagam PIS/Cofins na cesta básica do povo. Tudo na base da fraude e da propina. Vou fazer um pente fino nessas renúncias fiscais e acho mais R$ 70 bilhões, cortando só 20%. Depois vou fazer um tributo sobre grandes fortunas moderado, 0,5% sobre os grandes patrimônios, na pessoa física, maiores do que R$ 20 milhões. Só 58 mil brasileiros, tamanha é a concentração de renda, serão afetados por esse tributo.
Mas não corre o risco de essas pessoas levarem o que têm para fora do país e não pagar?
Aí é que está: querem ver o satanás e não querem me ver na Presidência da República. Por que? Porque sei cobrar. A alíquota moderada de 0,5%, regulo o IOF que é 0,38%. Então, o camarada, para ir embora, tem que trocar real por dólar. Quando ele faz isso, paga 0,38 de alíquota no IOF. Eu regulo para 0,51 e, portanto, fica muito mais viável ficar aqui do que ir embora. Arrecado mais R$ 70 bilhões, R$ 80 bilhões. Aqui está a saída fiscal do Brasil, o problema é político. Têm duas alternativas do Brasil: fazer o que o (Fernando) Collor, o Fernando Henrique (Cardoso), Lula, Dilma (Rousseff), e (Michel) Temer fizeram. Foram cassados, presos ou saíram desmoralizados, como é um caso do PSDB. Collor governou com essa gente e foi cassado; FHC governou com essa gente e foi desmoralizado; Lula governou com essa gente e foi parar na cadeia; Dilma governou com essa gente e foi cassada; Temer governou com essa gente e foi preso; e Bolsonaro governou com essa gente e está desmoralizado. Não vou por esse caminho, só quero ser presidente do Brasil se for para outro caminho. Qual é o caminho? Propor, fazer com que o voto que é dado a mim seja dado às minhas ideias. Vou fazer um grande e generoso acordo com os governadores e prefeitos. Eu sou muito vivido, muito experiente.
Já foi governador, já foi ministro da Fazenda, ministro da Integração Nacional…
Conheço como é que funciona. Os deputados querem sobreviver, e isso é legítimo. Tem a parte da corrupção, que eu vou enfrentar com a polícia — isso aí é simples. Mas quero dizer que a maioria não quer roubar, quer sobreviver. E, infelizmente ou felizmente, nosso povo julga o bom deputado não pelo voto dele a favor da reforma, mas pela escolinha para a comunidade, um ponto de calçamento — e compreendo isso.
Mas fazem isso com emendas.
Vou acabar com as emendas. A emenda do relator acaba no primeiro dia; acaba a roubalheira, acaba o “toma lá dá cá”, acaba a transformação da Presidência da República em esconderijo de ladrão, como é hoje, esses presidentes todos. E vou negociar um generoso acordo de governadores e prefeitos. Porque os deputados sabem que a sobrevivência deles pode ser garantida pelos prefeitos e governadores. O que que dou em troca? Vou renegociar todas as dívidas dos estados e municípios — e, hoje, 23 dos 27 estados estão quebrados. Sabe quanto é? R$ 600 bilhões é a dívida total dos estados. Sabe quanto é a dívida pública toda? R$ 7,8 trilhões, menos de 10%. Não estou propondo perdoar. Estou propondo o que os americanos chamam de asset liability management, que é para poder eu falar para a Faria Lima e tal. Vou rolar essa dívida. Nos quatro anos do meu governo, pego o que vai vencer nesses quatro anos e capitalizo para o fim. Vou deixar essa prestação na mão do governador em troca de um projeto de investimentos, que vai gerar emprego, que vai ativar a economia, e vai me permitir negociar no atacado e não no “toma lá dá cá” com os deputados. Persistindo o impasse, plebiscito popular. O deputado está se sentindo muito desconfortável, tem muita pressão? Me dá a autorização e consulto diretamente o povo, o que o mundo inteiro faz.
O senhor vai enfrentar os bancos e as taxas impossíveis para o cidadão, para o trabalhador, para o empreendedor, para o empresário?
Vou, não pelo prazer de brigar. Essa é a chave para a gente entender, e o problema é que esse sistema financeiro comprou, subornou o processo político. Você vê uma briga violenta de Lula e Bolsonaro, e os dois têm compromisso com o mesmo modelo de governança política. Acham que estou criticando; estou examinando as coisas, que é o papel do político em campanha. O Lula deu o Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes) para o Valdemar Costa Neto roubar. Ele foi preso e condenado no Mensalão. E, hoje, o Valdemar é presidente do partido do Bolsonaro. Esse modelo de governança política é desastroso e já examinamos. E na economia? Câmbio flutuante, meta de inflação, teto de gastos, autonomia do Banco Central, política de preços da Petrobras. Lula se comprometeu a manter a diretoria do Banco Central do Bolsonaro. Ora, isso quer dizer que juro, imposto, câmbio, tudo vai ficar igual. Ele já disse que não vai fazer reforma tributária e quer mudar o Brasil. Mudar como?
Ele não apresentou a proposta econômica ainda.
Tem proposta nenhuma. Mas aquilo que interessa, que é o comprometimento dele, estava lá o (Henrique) Meirelles. Entre Meirelles e (Guilherme) Boulos, você acha que qual dos dois está sendo enganado? Claro que o Boulos, que é um patinho, manipulado. O Meirelles é o homem do modelo econômico, do teto de gastos. Está se produzindo o maior estelionato eleitoral da história. Como fazer para resolver esse problema dos bancos? São dois movimentos, um de curto e um de médio prazo. O de curto é um trato de descartelização. Enquanto faz retórica de esquerda, o PT concentrou na mão de cinco bancos 85% das transações financeiras. Só para o brasileiro saber: nos Estados Unidos, cinco mil bancos concorrem entre si. E quem ganha? O freguês. A tarifa é baixa, os serviços são qualificados, respeita o usuário, respeita o consumidor e o juro cai. No Brasil são cinco bancos e quatro deles estão entre os mais lucrativos do planeta. Preciso descartelizar isso. Tira a Caixa Econômica e o Banco do Brasil no primeiro dia. Porque, hoje, o BB e a Caixa fazem parte do cartel porque é promiscuidade o tempo inteiro.
E continuam bancos públicos?
Vão competir em bases profissionais, vão ganhar dinheiro. Vou agravar a competição no primeiro dia, estimular muito as fintechs, facilitar a normatização disso e aumentar muito fortemente a concorrência bancária. Por que os juros brasileiros são, há 30 anos, o mais alto do mundo? Fundamentalmente, essa coisa de cartel, mas a outra razão é que o governo brasileiro é desequilibrado. Se tenho uma grande demanda para financiar a dívida pública, o preço da dinheiro, que é o juro, sobe. Se fizer um conserto da conta pública, de forma que o governo não precise mais ir ao mercado todo dia para fechar sua conta, o preço do dinheiro — que é o juro — cai consistentemente.
Em relação aos servidores públicos, o que eles podem esperar de um possível governo Ciro?
Primeiro, respeito e diálogo. Fui prefeito e governador e o que fiz? Mostrei que não era patrão de ninguém, que era apenas um gerente de uma grande orquestra e tinha que qualificar, ao máximo, o serviço que o nosso povo, pagante dos impostos, espera de nós. Eles querem aumentar salário, querem melhorar as condições de trabalho, e isso é humano para um cara que tem histórico de classe média como eu. Mas o dinheiro nem sempre dá. Então, em vez de reprimir, criei um fórum permanente de negociação. Todas as entidades dos servidores vão fazer parte disso. As primeiras reuniões, eu, pessoalmente, como presidente da Republica, vou dirigir. E estabelecer critérios, porque se não dá para resolver a vida de todo mundo de uma vez só, e isso tem razoabilidade, vamos fazer uma escala de prioridade. Vai a polícia agora, vai o médico depois, vai o professor antes. Porém, a grande questão do servidor é que nós temos que fazer um esforço de digitalizar o governo. O Brasil é um governo analógico: muito papel, burocracia, fragilidade, desapreço ao usuário. Vou digitalizar radicalmente o governo. Todo relacionamento possível que a sociedade precisar ter com o governo vai ser simplificado e vai ser feito de casa, pela internet. O usuário será convidado a avaliar o desempenho do serviço público e, com bom desempenho, será premiado.
Mas, antes o senhor tem que vencer as eleições. Como o senhor fará para levar as pessoas a acreditarem na sua campanha?
Sou um abolicionista numa terra de uma elite escravocrata. Não sou candidato porque é fácil ou simples. Sou um candidato contra o sistema, concretamente. O Brasil é um paraíso fiscal dos super ricos, é o país que mais paga juros. Quatro dos 10 bancos mais lucrativos do mundo são do Brasil e eles compraram o sistema político. Se você botar a briga do Lula com Bolsonaro é para ver quem pega na manivela. Bolsonaro é um malcriado, bruto, grosseiro, facistóide. Lula é uma pessoa mais afável, mais delicada. Porém, passou daí, é tudo igual. Modelo de governança política, modelo de economia, rigorosamente a mesma coisa. Quero mudar, sou o único que está contestando o sistema, que tem uma proposta com começo, meio e fim; o único que diz de onde vem o dinheiro, o único que dá ao povo a cara para bater. A turma vai querer o meu fígado. Prefere o sistema, o satanás, do que eu ser o presidente do Brasil. Estou propondo uma revolução. Espero, ainda, muito, ter o apoio da imensa maioria do povo brasileiro. Estou fazendo o que faz um bom centroavante: me desloco, atraio o marcador, chamo a bola, saio do impedimento. Se me passar a bola, o gol vai ser de placa. Se não passar, vou dar aquela tradicional entrevista: “Dei o melhor de mim, para o time, a nossa equipe”.
Tudo seria nos primeiros seis meses?
Tudo. Vou energizar a política da eleição. Será uma revolução. Contra tudo e contra todos, contra pesquisa, contra não sei o quê. Daqui para o dia 2 todos os endividados levantarão, todos os humilhados, todos os que consideram a corrupção um câncer. “Vou dar uma chance para esse cara aí”. Imagina a revolução que vai acontecer.
Mas, antes disso, tem o voto útil. Há essa pregação aí e como o senhor vai explicar que não é assim?
O poder corruptor do Lula é uma coisa que não tem limite, ficou uma pessoa que não conheço mais. Um cara que tenho uma amizade respeitosa há 30, 40 anos, mas virou um corruptor sem reserva nem limite. Vamos raciocinar juntos: por que botamos na Constituição o sistema de dois turnos? Porque o constituinte conhece o Brasil. O Brasil tem muitas ideias, muitas escolas políticas, muita liderança fragmentada. O primeiro turno é para quê? Para que cada corrente se apresente no debate e a democracia revele o tamanho dessa ou daquela corrente. Suponha que o grande critério seja “não aceito corrupção na política”. “Não aceito esse modelo econômico que faz os juros serem os mais caros do mundo” — é outro critério. Represento essas grandes maiorias, desorientadas pelo ódio, pela paixão, para votar contra o fascismo contra o comunismo. Lula e Bolsonaro são as duas faces da mesma moeda. É o sistema nos colocando para brigar para ver quem segura a manivela. Lula é o cara da boa conversa, da simpatia; Bolsonaro é o truculento, o bruto, o facistoide. Eu sei diferenciar, mas não é isso que vai colocar comida no prato. Adorar político é coisa de povo idiota; nenhuma nação do mundo adora político. Político tem que ser olhado com desconfiança. Bota o pezinho atrás, faz o cara fazer uma análise, olha de onde ele veio. Isso é o primeiro turno, os que são mais votados vão para o segundo. E os outros, fazem o quê? Cobrar as promessas, criticar as mentiras e incoerências. O fascismo petista que esmagar esse debate, aniquilar a oposição, aniquilar a voz — e é a minha voz. Repare: não fazem essa campanha sórdida com os eleitores da Simone (Tebet). Por que? A Simone, sendo uma pessoa respeitada, é comprometida com o modelo também.
Eles tentam fechar a eleição no primeiro turno.
Democracia, se você acerta o voto, é ganho de voto; se erra, você se ferra. Disse em 2018: “A solução para a tragédia do Lula e do PT não é o (Fernando) Haddad, que acabou de perder a reeleição em São Paulo. Esse é mais do mesmo, tem compromisso com a corrupção orgânica, com a quadrilha que se transformou a direção do PT. E o Bolsonaro é mentira, nunca foi moralizador de nada. Roubava dinheiro da gasolina do gabinete”. O sistema conseguiu empacotar o Bolsonaro como moralizador da esculhambação do PT e eu estou aqui, limpo, respeitado. Nunca respondi a inquérito. E o povo que decida se é melhor repetir mais do mesmo.
Na conversa que o senhor teve com os embaixadores, qual é a principal preocupação da União Europeia?
Perguntam se creio que é possível acontecer um golpe militar no Brasil. Disse a eles que não, que isso está na paranoia do Bolsonaro — e o Lula usa para que ninguém discuta corrupção ou por que 70% dos brasileiros votaram no Bolsonaro. Bolsonaro tirou 70% dos votos no Centro-Oeste, onde está o Distrito Federal. Sudeste e Sul, quase 70%. Foi porque tinha uma obra? Não. Porque tinha uma proposta? Não. Votou para protestar contra a corrupção generalizada que virou modelo de poder de Lula e do PT, mais a gravíssima crise econômica que produziram. Falo das propostas de renegociação da dívida: isso nasceu com a política de expansão do consumo do Lula. Expandiu o crediário de 15% para 52% do PIB, todo mundo foi para o crediário. Todo mundo lembra que podia comprar um microondas no tempo do Lula. O que as pessoas esquecem é que a letrinha pequenininha era o Lula mandando a mais alta taxa de juros do mundo. Veio a ressaca do governo do PT com a Dilma e aquele crédito farto e generoso virou humilhação das pessoas no SPC. Mais do mesmo só dá o mesmo.
O que o senhor vai fazer para a cultura?
Para mim é essencial, porque define muito mais coisa do que o mecenato e a estética. Define a identidade nacional. Por isso, vou recriar o Ministério da Cultura e vou fazer do orçamento de fomento à cultura o maior da história. Essa é a minha tradição. Fiz o Complexo do Dragão do Mar, no Ceará, e o (senador) Tasso (Jereissati) inaugurou. Fiz com uma estrutura de fomento de escola de artes, de ofícios, etc., além de formação de plateia. Tenho muita intimidade com esse assunto. E, basicamente, precisamos dar um passo adiante nas leis de fomento porque foram adulteradas ao longo do tempo — e, praticamente, só financiam as expressões estéticas e culturais de retorno comercial. Precisamos fomentar o experimentalismo estético, artístico e cultural. Temos que chegar na periferia, onde há uma explosão de iniciativas — hip hop, grafite, coisas que tenho visitado. Quero fazer um fundo nacional de cultura adaptado para que uma fração desse dinheiro seja para essas expressões, e não de retorno comercial. Essa é a meta do meu projeto e será o maior orçamento de fomento à cultura da história do Brasil, que está se desestruturando como identidade nacional. Nossos hábitos de alimento, de vestir, nosso sotaque está se pasteurizando. Quero, inclusive, fazer com que as redes nacionais comecem a, forçosamente, por lei, a abrir nichos crescentes e graduais de produção local. Tanto de noticiário quanto de produção cultural para restaurar as nossas diversas identidades nacionais, a expressão de um Brasil regional, que é extraordinariamente lindo. Estive nas comemorações do acampamento Farroupilha: aquilo é uma preciosidade que vai ser extinta se a gente não proteger essas coisas todas. Parintins, uma festa que o mundo inteiro admira, poucos brasileiros conhecem… Quero criar essa dinâmica de regionalização da produção cultural e jornalística, como também vou financiar cooperativas culturais de jornalistas para disseminar a democratização da informação. A regulação da mídia que Lula propõe é uma aberração que não aceito.
Para que a população possa ter acesso à bebida, à carne de qualidade para o churrasco, o que o senhor vai fazer concretamente?
Cerveja e picanha não é conversa fiada do Lula, é consequência de uma pequena sobra no rendimento do trabalho. Estou com uma proposta que é muito audaciosa, mas também diz de onde vem o dinheiro. Primeiro, quero banir a pobreza do lar de 24 milhões de famílias, que é onde ela está hoje. Como fazer? Qual é a definição de pobreza sobre política individual? Rendimento igual ou inferior a R$ 471 por cabeça dentro do domicílio, por mês. Achei 24,3 milhões de famílias e criei, então, o Programa de Renda Mínima, que dei o nome do (ex-senador) Eduardo Suplicy porque não gosto de copiar proposta dos outros e fazer homenagem. O Suplicy é o campeão desse programa de renda mínima e, por causa dele, me dediquei a estudar e a viabilizar esse programa que estou propondo agora. A ideia é que, dentro de uma família, vamos supor, uma pessoa ganha um salário mínimo com carteira assinada — R$ 1,2 mil. Porém, tem mulher e três filhos. Significa que quem ganha R$ 1,2 mil e três bocas não ganham nada. R$ 1,2 mil dividido por quatro dá R$ 300. Portanto, R$ 172 para cada pessoa dessa atingir a linha de pobreza. O programa vai dar esses R$ 172 e, portanto, ele é flexível. Não é como o Bolsa Família nem como o Auxílio Brasil, porque vale para todo mundo dentro do Cad-Único. Como se financia isso? Pegando todos os programas de transferência de renda — Auxílio Brasil, aposentadoria rural, BPC, sempre garantindo que ninguém perde nada. Quero vincular a arrecadação do imposto sobre grandes fortunas de 0,5% sobre os patrimônios, na pessoa física, iguais ou maiores a R$ 20 milhões, de maneira que cada super rico no Brasil vai financiar o fim da pobreza de 871 brasileiros no mês. Isso permite que fome e necessidades básicas sejam extintas. Tudo mais que o cidadão ganhar, aí será para a cervejinha.
Gustavo Petro, presidente da Colômbia — país grande produtor de cocaína — conclamou os países da América Latina, na Assembleia Geral da ONU, a acabar com a guerra contra as drogas. O senhor entrará nisso se eleito?
Sim, porém entro com as cautelas necessárias da brasilidade que amo e a qual pertenço. Esse é um assunto que a humanidade não conseguiu resolver. Tolerância zero não funcionou, a guerra contra as drogas virou uma tragédia. Quando Lula tomou posse, o Brasil tinha 280 mil pessoas no sistema penitenciário. Ele inventou uma lei, copiada nos americanos, a Lei 13.343, que é a guerra contra as drogas no Brasil. Criminaliza o “avião”, um menino que não cometeu nenhuma violência e caiu na ilusão de pegar uma renda para levar um pacotinho de cocaína, uma trouxinha de maconha ou uma pedra de crack. Sabe qual é a população carcerária brasileira a partir desta lei? Um milhão e 200 mil pessoas, quase todos pobres, negros e jovens. Está errado porque essa meninada não cometeu violência no primeiro ato, mas foi condenada para fazer de conta que as autoridades estão atuando no território. O traficante não mora na periferia: mora nos salões ricos da zona sul do Rio, na Paulista, nos Pinheiros, em São Paulo, na Aldeota, em Fortaleza. Moram nos grandes condomínios. Esse menino não cometeu violência, mas entrou no presídio, tem que se filiar às facções criminosas, que hoje dominam as periferias do Brasil. Vou fazer o que: transformar em federal o enfrentamento às facções criminosas — e da ferramentaria de lavagem de dinheiro, com algoritmo, com tecnologia, que vem basicamente do tráfico de armas e de drogas. Porém, vou participar desse debate mundial de que esse enfrentamento tosco, reprimindo a meninada, falhou. A gente tem que fazer esse diálogo com muita paciência, muita humildade, muito respeito, ouvir os especialistas, ouvir os líderes religiosos, ouvir as vítimas. As mães estão apavoradas com a destruição das famílias pelo narcotráfico, pela dependência química — é um debate que não tem ponto de chegada, só de partida. Portugal pegou especialistas e definiu quanto é a quantidade de cada droga que um dependente químico precisa para usar por uma semana. Se alguém for pego na rua com essa quantidade, que os especialistas definiram como a necessária e suficiente para o adicto, aquilo é problema de saúde pública.
Mas não tem que livrar a pessoa da dependência?
Tem uma grande discussão, que é a dependência e a vontade voluntária de sair e a internação compulsória. Sou contra a internação compulsória e fiz muita internação voluntária, eu mesmo, como voluntário nas madrugadas. Nunca falei isso para ninguém. Por uma decisão pessoal, resolvi, em muitas madrugadas em Fortaleza, sair com meu carro, sozinho, e pegar pessoas arrebentadas na rua e dar de comer, levar para tomar um banho e perguntar se queria sair. Levei muitos para comunidades terapêuticas, muitos. Consegui ajudar muitos e fracassei em muitos outros também. Tenho intimidade: o assunto é grave, é delicado e não tem solução mágica.
O que o senhor fará caso perca as eleições, já que disse que será a última campanha presidencial que disputa?
Brinquei, ontem (quarta-feira), com uma colega sua, que falava em defender em trança e linha, e atacar em ziguezague. Disse que era segredo, mas não é — é uma brincadeira que faço. Vou trabalhar, acordar cedo. Hoje (ontem), acordei às 5h, peguei um avião em São Paulo, desci em Brasília, me encontrei com embaixadores, vim aqui, vou dar uma entrevista daqui a pouco, e vou dormir em São Paulo. Amanhã (hoje), me preparo para o debate e vou fazer o que posso fazer com paz no coração. Estou muito chocado com a falta de escrúpulo do Lula e do PT, estou muito chocado, é impressionante. Me sinto como um cara objeto de extermínio. Eles não querem me derrotar: querem me exterminar. Quase 40 anos de ajudar de vagabundos, quase 40 anos de ajuda para eles e não houve uma parada. Quando o filho do Lula se enrolou no esquema da GameCorp — nunca contei isso pra ninguém —, fui lá ver o que podia fazer. Não tem respeito, nem pudor. São nazistas mesmo e ficam acusando o Bolsonaro de fascista, que é também.
O que esperar desta reta final de campanha?
Temos mais 10 dias. Eleitor: bote a mão na cabeça, bote a mão na cabeça, e pare para pensar. Qual é o prejuízo que tem para você, que é brasileiro, que está humilhado no SPC, que está humilhado com o desemprego, está humilhado na informalidade? Qual é o prejuízo para você, de dar um voto a quem você se identifica, que está falando dos seus problemas? Que está propondo, concretamente, soluções? O Centrão está dizendo que não tem chance? Estão dizendo que você não pode sonhar. Ele quer que você abra mão do seu sonho, porque o seu sonho é difícil. O meu sonho é mudar o Brasil. Me ajuda.