Congresso teme “linha-dura” de Rosa Weber
Foto: Fellipe Sampaio/Divulgação/STF
Um dia depois da cerimônia que marcou o início da gestão de Rosa Weber no Supremo, as lideranças do Congresso passaram a monitorar de perto o sistema eletrônico da corte, de olho em um processo em especial: a ação do PSOL que pede a extinção do orçamento secreto.
Rosa Weber é a relatora do caso. Tradicionalmente, quem assume a presidência do Supremo passa o acervo de processos a quem assume o seu antigo gabinete — no caso, o ministro Luiz Fux, que acaba de deixar o comando do tribunal.
Mas Rosa, que já se mostrou contrária à existência desse mecanismo de liberação de recursos, decidiu que não vai passar o caso adiante. Além dessa ação, ela também pretende manter em seu gabinete alguns outros processos delicados, como a ação que trata da descriminalização do aborto, também movida pelo PSOL.
A decisão pôs as lideranças do Centrão em alerta – especialmente os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Ambos torciam para que Fux assumisse o caso e contavam com essa possibilidade.
No início deste ano, enquanto ainda chefiava a corte, Fux se reuniu com senadores preocupados com o fim do orçamento secreto e os tranquilizou. Contou que Rosa o pedira para pautar a ação do PSOL, mas afirmou que não levaria o caso para julgamento durante a sua gestão.
Fux disse considerar que se tratava de um tema muito polêmico para ser discutido antes das eleições. Era justamente o que os políticos queriam ouvir.
Conforme informou a coluna, de olho na região Nordeste, que concentra o segundo maior colégio eleitoral do país – e seus maiores índices de rejeição -, o governo Jair Bolsonaro carimbou 42,4% das emendas do relator, que compõem o chamado orçamento secreto, desde que esse tipo de emenda foi criada, em 2020.
Na presidência do Supremo, Rosa Weber tem o controle do calendário de julgamentos, e pode pautar o caso para julgamento quando quiser. O fato de ser relatora do processo lhe dá condições de escolher o melhor momento para fazer isso – de preferência, um momento propício para que o plenário corrobore sua posição sobre o tema.
Preocupados em garantir que nada aconteça antes do segundo, Pacheco e Lira entraram em campo para sondar os ânimos de Rosa Weber.
A ministra já sinalizou a interlocutores que vai evitar temas polêmicos até o fim das eleições, conforme informou O GLOBO.
Até a oposição concorda. Senadores que se opõem ao governo Bolsonaro e ao orçamento secreto avaliam que o melhor é deixar o julgamento para depois da disputa eleitoral.
Para esse grupo, o ideal seria que a questão fosse decidida entre novembro e dezembro deste ano – timing que seria perfeito no caso de uma eventual vitória de Lula, que propõe o fim do orçamento secreto. Assim, o Supremo resolveria o assunto sem que o petista tivesse que se desgastar com o parlamento.
Como Rosa Weber não costuma receber parlamentares e dar pistas do que pretende fazer, tanto o governo quanto a oposição tentam sondar e influenciar seu humor conversando com outros ministros e integrantes do tribunal.
Os presidentes da Câmara e do Senado controlam a distribuição dos 16,5 bilhões de orçamento secreto previsto para 2022, dos quais ainda faltam liberar R$ 8 bilhões. Essa verba é considerada essencial pelas lideranças do Centrão para azeitar as articulações políticas na corrida pelo Palácio do Planalto e na disputa pelo comando da Câmara e do Senado, no início de 2023.
A ação do PSOL, que quer implodir o mecanismo de distribuição de emendas sem transparência e controle público, foi apresentada ao Supremo em junho de 2021, na esteira de uma série de reportagens publicadas pelo jornal “O Estado de S. Paulo”.
Na última segunda-feira (12), o PSOL pediu ao Supremo para impedir o repasse de verbas pelas emendas do orçamento secreto até o fim das eleições deste ano. O pedido, feito no âmbito da ação movida pela legenda, ainda não foi analisado.
Em novembro do ano passado, Rosa Weber chegou a suspender o pagamento das emendas RP9.
Na ocasião, escreveu que esse mecanismo de liberação de recursos “mostra-se em tudo incompatível com a forma republicana e o regime democrático de governo a validação de práticas que, estabelecidas à margem do direito e da lei, promovam segredo injustificado sobre os atos pertinentes à destinação dos recursos públicos, com evidente prejuízo do acesso da população aos instrumentos necessários à fiscalização da gestão financeira do Estado”.
A ministra liberou depois o pagamento das emendas depois de intensas articulações entre os presidentes da Câmara e do Senado e o próprio Fux, entre outros ministros. Ao final, o Congresso aprovou uma resolução definindo critérios para sua aplicação e determinando que fosse dada ampla transparência sobre a aplicação dos recursos.
Ainda assim, apenas R$ 11 bilhões de um universo de R$ 36,4 bilhões foram integralmente mapeados, identificando os responsáveis pelas destinações e as cidades beneficiadas.
Agora que assumiu o comando da corte, Rosa vai ter mais chances de ditar o rumo que considerar mais adequado ao assunto. Quem não está muito satisfeita com isso é a classe política.