Desafio de Lula é vencer resistências ao voto útil

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Foto: Maria Isabel Oliveira

Ao deixar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) com pouco mais da metade dos votos válidos (51%), o resultado da última pesquisa Ipec/TV Globo deu novo fôlego ao debate sobre a possibilidade de o petista vencer a disputa presidencial no primeiro turno. Para atingir o objetivo e evitar mais quatro semanas de eleição contra o presidente Jair Bolsonaro (PL), a campanha de Lula já se movimenta e mira o chamado voto útil, fenômeno que, para pesquisadores, foi observado na reta final de pleitos anteriores, mas deve enfrentar o desafio de convencer segmentos do eleitorado, como aqueles de camadas de renda média e alta, com menor adesão ao ex-presidente e nos quais o antipetismo é mais forte.

O Ipec e Datafolha indicam que, embora 80% e 77%, respectivamente, dos eleitores brasileiros digam estar decididos em quem irão votar para presidente, a alta convicção está restrita a quem já apoia Lula ou Bolsonaro. Os dados apontam que mais da metade (52%, no levantamento Ipec e 54% no Datafolha) dos eleitores de Ciro, que tem 7% dos votos, dizem que ainda podem mudar de candidato. Nos casos dos demais nomes, sem considerar Lula e Bolsonaro, o índice chega a 60% no Ipec.

A pesquisa espontânea, modalidade de pergunta em que não são apresentados os nomes em disputa, aponta ainda que 12% dos eleitores não têm um candidato na ponta da língua e afirmam não saber em quem votar, no caso do Ipec. No último Datafolha, esse índice foi estimado em 17%.

— Faz parte do comportamento do eleitor brasileiro se voltar para um voto útil. Essas pessoas querem sentir que estão participando do processo votando em alguém que tenha chances — explica a cientista política Luciana Santana, professora da Universidade Federal de Alagoas (UFAL).

Decisão de voto segundo Ipec e Datafolha — Foto: Arte

Na ciência política, a opção dos eleitores em abandonar o candidato por quem têm maior preferência pessoal por outro que apresente mais chances de vitória é conhecida como efeito bandwagon (ou manada).

Professora de ciência política da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Mayra Goulart defende que quanto mais polarizada uma eleição, maior a tendência de voto útil. Um dos principais fatores, na avaliação dela, para esse fenômeno é a rejeição aos candidatos. Mayra chama a atenção para desafios de Lula, especialmente com eleitores que estão com Ciro. Embora o candidato do PDT dialogue com a centro-esquerda e tenha sido ministro de Lula, seu eleitorado tem perfil mais distante da base política do petista:

— O desafio de Lula é o antipetismo. O discurso de Ciro se dirige mais a um perfil de camadas do eleitorado que têm afinidade com Bolsonaro. Da mesma forma que Bolsonaro não consegue reverter a dificuldade com classes populares, nem mesmo com o pagamento do Auxílio Brasil, Ciro tem dificuldade de falar com eleitores que são de uma classe média escolarizada.

Segunda opção de voto — Foto: Arte

A última pesquisa Datafolha traz alguns indícios sobre essa dificuldade. Entre os eleitores de Ciro, Lula é citado como segunda opção tanto quanto Bolsonaro (veja acima).

Em eleições anteriores, uma comparação entre o resultado da pesquisa Datafolha na véspera do pleito e os votos contabilizados nas urnas aponta para movimentos que podem sinalizar, ao menos em parte, o efeito do voto útil. Em 2018, enquanto Bolsonaro e Fernando Haddad (PT) tiveram, respectivamente, seis e quatro pontos a mais no primeiro turno que o apontado na pesquisa um dia antes da votação, Ciro Gomes (PDT), Geraldo Alckmin (PSDB) e Marina Silva (Rede) somaram juntos quase oito pontos a menos. Em 2014, Aécio Neves (PSDB) teve 7,5 pontos a mais nas urnas do que o apontado pelo Datafolha na véspera da eleição, enquanto Marina teve 2,6 a menos.

Membro da Associação Americana para Pesquisa de Opinião Pública (AAPOR, na sigla em inglês) e diretor no Institute for Social Research da Universidade de Michigan, o estatístico Raphael Nishimura pondera, porém, que as diferenças podem ser explicadas pela dificuldade de capturar a decisão do voto feita mais próximo ao pleito. Ele explica que não há dados no país sobre o comportamento do voto útil, mas que é pertinente questionar se é um contingente capaz de alterar de fato o resultado do pleito:

— Pesquisas não são prognósticos. Mesmo a pesquisa divulgada na véspera começa a ser feita dias antes. Entre um dia e outro, muitos eleitores estão talvez ainda se decidindo e esse levantamento pode não capturar o processo. Por isso, vemos diferenças entre as pesquisas e o resultado.

O candidato do PT defendeu ontem, durante encontro reservado com mais de seis mil apoiadores, que seja feito um esforço para que ele possa conquistar a vitória no primeiro turno.

Votos válidos de Lula e Bolsonaro segundo Ipec — Foto: Arte

— Tem gente que tem vergonha… “Ah, não vamos falar que vai ganhar no primeiro turno porque parece soberba”… Não, gente. Eu nunca fiz eleição para ganhar no segundo turno.

No entorno do ex-presidente, a avaliação é que a pesquisa reforça o entendimento de que a melhor estratégia no momento é buscar o voto útil, especialmente de pessoas que hoje optam por Ciro Gomes (PDT) e Simone Tebet (MDB). Juntos, os eleitores que escolhem algum candidato sem ser Lula ou Bolsonaro, no momento, representam 14% do total. Esse grupo se mostra, diz as pesquisas, mais disposto a mudar o voto.

De olho nessa fatia do eleitorado, o PT e seus apoiadores turbinarão uma série de ações planejadas para a reta final da campanha, focadas em atrair o voto útil e de eleitores de centro, informou a colunista do GLOBO Bela Megale.

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Além de explorar o apoio firmado com a ex-ministra Marina Silva (Rede), a campanha de Lula investirá na gravação e distribuição de vídeos com personalidades, como o ex-jogador Raí e a ex-jogadora de basquete e medalhista olímpica Marta Sobral.

Em paralelo, a campanha prepara mobilizações de rua nos 13 dias que antecederão o primeiro turno.

O Globo