Lula e Bolsonaro atuam como puxadores de votos
Foto: Marlene Bergamo/Folhapress e Mauro Pimentel/AFP
O cenário de voto cristalizado entre eleitores de Luiz Inácio Lula Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL) na disputa pela Presidência impulsionou a estratégia de voto casado entre candidatos a governador.
Ao contrário de 2018, quando a esquerda foi tímida em se associar a Fernando Haddad (PT), e a direita embarcou na candidatura de Bolsonaro somente na reta final da campanha, os candidatos em 2022 tentam surfar na popularidade dos presidenciáveis nos estados onde eles têm boa avaliação.
A estratégia é resultado de uma consolidação precoce dos votos na disputa presidencial. Conforme a pesquisa Datafolha divulgada na quinta-feira (1º), 76% dos eleitores já sabem em quem vão votar no cenário espontâneo, quando não são mostrados os nomes dos candidatos. Destes, 40% estão com Lula, e 29% com Bolsonaro.
Também há nível alto de convicção no voto de lulistas e bolsonaristas. Entre os eleitores que declaram voto no petista, 83% dizem estar convictos de sua escolha, taxa semelhante aos 84% entre eleitores do presidente.
O cenário contrasta com o das eleições estaduais, onde ainda é grande o número de indecisos e são poucos os eleitores com o nome de seus candidatos na ponta da língua e que se dizem totalmente decididos sobre quem vão votar.
Em São Paulo, por exemplo, 50% dos eleitores não sabem dizer em quem vão votar para governador na pesquisa espontânea, índice que se repete no Rio de Janeiro e é de 48% em Minas Gerais, segundo o Datafolha.
“A eleição presidencial, em geral, é muito mais magnética que a estatual. E, neste ano, a disputa nacional se antecipou, houve uma consolidação das preferências muito mais cedo que o normal”, diz o cientista político Cláudio Couto, professor da FGV-Eaesp.
No caso das eleições para governos estaduais, diz ele, a definição do voto dos eleitores começa a se concretizar mais tarde, tornando as disputas mais imprevisíveis e sujeitas a mudanças nas semanas próximas à eleição.
Nesse cenário, os presidenciáveis assumiram ares de protagonistas no material de campanha, jingles e programas eleitorais de candidatos a governador, sobretudo aqueles menos conhecidos do eleitorado.
Na Bahia, por exemplo, a popularidade de Lula está no centro da estratégia do candidato a governador Jerônimo Rodrigues (PT), que ainda é desconhecido de 59% dos eleitores baianos.
No primeiro programa de TV do petista, o nome do ex-presidente foi citado 18 vezes em pouco mais de três minutos, incluindo um jingle cujo refrão diz: “Lula é Jerônimo e Jerônimo é Lula”.
Os candidatos a deputado federal e estadual do PT são apresentados ao eleitor como o “time de Lula”, estratégia que contrasta com a de 2018, auge do antipetismo, quando os candidatos a deputado foram apresentados como o “time da correria”, em referência ao governador Rui Costa (PT).
A ampla presença de Lula no programa eleitoral de Jerônimo fez com que a oposição acionasse a Justiça Eleitoral, já que a legislação diz que apoiadores só podem ocupar até 25% do tempo do programa.
O cenário se repete em estados como Pernambuco, Paraíba, Amazonas e Rio de Janeiro, onde há ampla presença de Lula, seja em depoimentos gravados, seja em discursos em atos da pré-campanha.
Mesmo nomes conhecidos, caso do senador Eduardo Braga (MDB), que concorre pela quinta vez ao governo do Amazonas, apostam em Lula para atrair eleitores. O emedebista lançou um jingle que diz: “É Dudu cá e Lula lá”.
Em Minas Gerais, o candidato Alexandre Kalil (PSD) também iniciou sua campanha com forte vinculação com o ex-presidente e o mote: “Do lado do Lula, do lado do povo de Minas Gerais”. A estratégia, contudo, ainda não surtiu efeito, e o governador Romeu Zema (Novo) segue com larga vantagem.
A estratégia de voto casado também tem sido usada por aliados de Bolsonaro, mesmo em estados onde o presidente tem índice de rejeição mais alto.
Candidato a governador da Bahia, João Roma (PL) se anuncia como “o único candidato de Bolsonaro” no estado e repete o lema: “Quem vota 22 para Bolsonaro vota 22 para João Roma”.
Mesmo tendo comandado o Ministério da Cidadania na gestão Bolsonaro, Roma ainda é desconhecido por 69% dos eleitores baianos, segundo pesquisa Datafolha divulgada em 24 de agosto.
Por isso, a estratégia de vinculação com a eleição nacional é vista como crucial para que ele saia dos atuais 7%, segundo o Datafolha, e chegue próximo ao patamar de Bolsonaro, que tem 20% das intenções de voto entre os baianos.
Também há forte presença de Bolsonaro nas campanhas de Tarcísio de Freitas (Republicanos), candidato em São Paulo, Carlos Viana (PL), em Minas Gerais, e Fernando Collor (PTB), em Alagoas.
Candidatos sem uma referência competitiva na eleição nacional, por outro lado, buscam esfriar a polarização da eleição presidencial e seus impactos nas campanhas estaduais. Em geral, vendem-se como uma espécie de candidato de unificação e consenso.
É o caso de Rodrigo Garcia (PSDB) em São Paulo, Romeu Zema (Novo) em Minas Gerais e ACM Neto (União Brasil) na Bahia.
Em seus programas de televisão e rádio, Garcia passa ao largo da eleição nacional e se apresenta como um candidato que vai além das disputas partidárias: “Estou aqui para defender São Paulo dessa briga política que só atrasou o Brasil”.
Na Bahia, ACM Neto vai na mesma linha. Em seu primeiro programa, ele destacou que foi prefeito tendo Dilma Rousseff (PT), Michel Temer (MDB) e Bolsonaro na Presidência.
Ao contrário de seus adversários, tem uma taxa de conhecimento de 92%. Dessa forma, sua campanha está centrada em evitar que potenciais eleitores de Lula que o apoiam migrem para Jerônimo Rodrigues.
O PT critica a estratégia de neutralidade. Ora associa ACM Neto a Bolsonaro, ora diz que o adversário deve descer do muro: “A Bahia tem lado, e não é o do tanto faz”, disse o governador Rui Costa.
O cientista político Cláudio Couto destaca que a decisão de voto nacionalmente nem sempre se reflete nas escolhas nos estados. Mas há momentos em que a vinculação das candidaturas tem mais força.
Foi o caso do pleito de 2018, quando a antipolítica ajudou a criar uma onda em favor de Bolsonaro e aliados desconhecidos, como Romeu Zema, em Minas, Carlos Moisés, em Santa Catarina, e Wilson Witzel, no Rio.
A eleição deste ano, diz Couto, ainda não será convencional, com as disputas nacional e estadual correndo em alas distintas. Mas também não será uma eleição crítica como a de 2018.
“As eleições estaduais começaram agora, ainda estão sujeitas a volatilidade. Mas o efeito da disputa nacional sobre os estados será atenuado”, afirma.