
Bolsonarismo fará oposição sistemática
Foto: O GLOBO
Indo direto ao ponto: Lula assumirá a Presidência numa situação inédita para ele. Primeiro, porque deve um naco de seus votos não à esperança que sua plataforma ou figura inspiraram, mas à aversão que parte do eleitorado tem a Jair Bolsonaro. Lula vai governar um Brasil mais à direita do que pegou em 2003. Um país rachado. Mas o contexto é novo para ele, sobretudo, porque enfrentará uma oposição de verdade: aguerrida, organizada e sem problemas de consciência com a falta de escrúpulos. Uma oposição que o PSDB jamais conseguiu ser entre 2003 e 2010.
O líder da tropa, Bolsonaro, foi derrotado, mas continuará liderando quase metade do país em termos de votos (e com a maioria do eleitorado de São Paulo e Rio, os dois estados com os maiores PIBs). Seu partido, o PL, tem a maior bancada na Câmara. No Senado, elegeu 20 dos 27 senadores.
Sua força, entretanto, não está apenas nos canais tradicionais da política. O arsenal de que dispõe inclui uma poderosa artilharia fincada nas redes sociais. Ali, apesar dos esforços do PT, o bolsonarismo ainda é hegemônico. Tem ao seu lado também as igrejas evangélicas. Ainda que seja óbvio que algumas se bandearão para o colo lulista (na verdade, permanecerão no mesmo colo largo, o do governo, tal qual o Centrão, que há décadas age desta maneira), o discurso conservador do capitão nos costumes está mais casado com as pregações dos neopentecostais do que Lula jamais terá condições de ser — até porque deve satisfação a outros setores da sociedade que Bolsonaro despreza.
O capitão passa agora à posição de estilingue, podendo apontar os erros do adversário. O governo Lula 3 assumirá depois de uma orgia fiscal que foi executada neste ano na desesperada tentativa de Bolsonaro reeleger-se. O novo governo terá que aplicar uma política fiscal rigorosa para ter chance de, por exemplo, reduzir as taxas de juros e de inflação. Ninguém sabe ainda o que Lula fará. Ele nunca deu mais que pistas genéricas na campanha sobre os caminhos que tomará. É consenso, entretanto, que a solução terá que ser dura. E a frustração de parte dos seus eleitores será inevitável. Há um largo e confortável espaço para Bolsonaro fazer oposição.
Há uma discussão ainda em estágio inicial sobre 2026. Parte da elite paulista aposta desde já em Tarcísio de Freitas como o novo líder da direita. Seria uma direita mais moderada, mais civilizada, sem o histrionismo e os rompantes do seu padrinho político. Neste caso, é bom antes combinar com os russos. Na vida real Jair Bolsonaro será o líder do exército de antipetistas. Daqui a quatro anos, terá 71. E, assim como Lula agora era o único petista que poderia disputar a eleição com chances, Bolsonaro chegará em 2026 em situação semelhante. Até onde a vista alcança, deve ser ainda o único político da direita com liderança para uma disputa presidencial.
Pouco antes do 1º turno, Lula disse que a frente ampla que ele estava organizando tinha como desafio não apenas vencer Bolsonaro, mas derrotar o bolsonarismo. Este é o ponto. Bolsonaro foi batido neste domingo. Mas nada no horizonte indica que o que ele representa tenha sido derrotado.