Bolsonaro vê pobres só no ano eleitoral
Foto: Igo Estrela/Metrópoles
Empenhado na missão de ser reconduzido ao Palácio do Planalto por mais quatro anos, o presidente Jair Bolsonaro (PL) adotou uma série de medidas de governo na campanha eleitoral, que teve início em 16 de agosto. Em números, o pacote de bondades do candidato à reeleição já ultrapassa a casa dos R$ 5 bilhões.
Em linhas gerais, as ações com cunho eleitoral são voltadas para a população de baixa renda, mulheres e nordestinos, perfis considerados pela campanha de Bolsonaro como primordiais para uma vitória em segundo turno.
Nesta semana, o governo turbinou o pacote e anunciou que vai antecipar as últimas duas parcelas do auxílio pago a caminhoneiros e taxistas. Inicialmente, as quinta e sexta parcelas do benefício seriam creditadas nos dias 26 de novembro e 17 de dezembro, respectivamente. Agora, o pagamento foi anunciado para 19 de novembro e 10 de dezembro. A quarta parcela do benefício de R$ 1 mil, depositada nessa terça-feira (18/10), também havia sido antecipada pelo governo federal (leia mais abaixo).
Também na terça, o Conselho Curador do Fundo de Garantia do Tempo e Serviço (FGTS) aprovou uma proposta apresentada pelo governo Bolsonaro que regulamenta o uso de recursos futuros do trabalhador no fundo em prestações de financiamento de imóveis para a população de baixa renda. A medida é mais uma tentativa da campanha de potenciliar uma virada de votos às vésperas das eleições.
Logo no primeiro dia de campanha, o governo federal deu início à primeira etapa do “Benefício Taxista”. O programa teve início em agosto e será pago até dezembro, após autorização do Congresso Nacional, que aprovou a PEC dos Auxílios e autorizou gastos de até R$ 42 bilhões fora das regras fiscais em pleno ano eleitoral.
A mesma PEC também viabilizou o “Benefício Emergencial aos Transportadores Autônomos de Carga (BEm Caminhoneiro)”, voltado a motoristas de carga autônomos. Considerando os três primeiros lotes pagos a um total de 360.712 caminhoneiros, o governo já desembolsou R$ 1,03 bilhão. O número de profissionais com registro ativos, porém, ficou abaixo do esperado pelo governo, o que fez com que o Ministério do Trabalho e da Previdência ampliasse, já durante a campanha, o prazo para os motoristas enviarem a chamada autodeclaração para receber o benefício.
Nos dias seguintes ao resultado do primeiro turno, que revelou uma disputa acirrada entre Bolsonaro e Lula (PT), o governo federal anunciou a antecipação do benefício pago a caminhoneiros e taxistas, e ainda do Auxílio Brasil.
O programa social que substituiu o Bolsa Família teve os depósitos do benefício de R$ 600 de outubro antecipados em uma semana, para as datas de 11 a 25 de outubro. O calendário original previa pagamentos entre os dias 18 e 31 de outubro. O mesmo foi feito com o pagamento do vale-gás, que auxilia famílias de baixa renda. O benefício é pago usando o mesmo calendário de repasses do Auxílio Brasil.
Na pesquisa Datafolha divulgada na quinta-feira (19/10), Bolsonaro conseguiu aumentar as intenções de voto entre a população que recebe Auxílio Brasil. Em relação ao levantamento anterior, o presidente subiu de 33% para 40% enquanto Luiz Inácio Lula da Silva (PT) caiu de 62% para 56%.
Dois dias após o primeiro turno, o atual chefe do Executivo federal anunciou o pagamento de um 13º salário para mulheres que recebem o Auxílio Brasil. Se confirmado, o depósito, no entanto, só deve ser feito em 2023. A proposta orçamentária do governo para o ano que vem não prevê o pagamento do benefício.
As medidas de governo não se limitaram apenas ao pagamento de recursos. No último mês, o presidente Jair Bolsonaro usou uma brecha na legislação para nomear 561 aprovados no último concurso da Polícia Federal.
Pela lei eleitoral, ficam proibidas nomeações de servidores públicos neste ano nas esferas federal e estadual nos três meses que antecedem o primeiro turno até a posse dos eleitos, ou seja, de 2 de julho a 1º de janeiro de 2021.
Uma exceção, porém, permitiu a medida de Bolsonaro. Ela prevê que caso a nomeação seja “necessária à instalação ou ao funcionamento inadiável de serviços públicos essenciais”, poderá ser realizada.
Na época, a Secretaria-Geral da Presidência da República reconheceu que a lei eleitoral proíbe a nomeação de servidores no período eleitoral, mas alegou que a “decisão considera que a não nomeação imediata comprometeria o funcionamento inadiável da Polícia Federal”.
A mesma exceção foi utilizada para autorizar a nomeação de 625 aprovados no concurso mais recente da Polícia Rodoviária Federal (PRF).
Ao justificar a medida, o Palácio do Planalto disse que “a não nomeação imediata de pessoal para a Polícia Rodoviária Federal comprometeria o funcionamento inadiável das atividades de segurança pública e segurança viária”.
Além das medidas de governo, Jair Bolsonaro ainda tem usado a Caixa Econômica Federal para relançar programas sociais e criar linhas de crédito por meio do banco público.
Desde o primeiro turno, em 2 de outubro, a Caixa anunciou três grandes medidas. A primeira delas diz respeito ao relançamento de uma campanha do banco para renegociar dívidas com desconto de até 90%. A estimativa da Caixa é arrecadar, por meio das negociações, até R$ 1 bilhão até o fim deste ano.
O consignado do Auxílio Brasil e do Benefício de Prestação Continuada (BPC), criticado por especialistas financeiros, foi outra medida anunciada pelo governo federal junto à Caixa. Em apenas três dias, a ação já repassou R$ 1,8 bilhão em recursos para 700 mil beneficiários dos programas sociais.
A terceira e mais recente medida anunciada pela Caixa mira em um milhão de mulheres empreendedoras. Por meio de uma linha de crédito de R$ 1 bilhão, Bolsonaro tenta conquistar o voto do eleitorado feminino.
A especialista em direito eleitoral Renata Castilhos lembra que o pacote de bondades é historicamente comum em ano eleitoral. O que falta, porém, explica, é uma fiscalização das medidas.
“Não é uma ferramenta exclusiva do governo Jair Bolsonaro. Ela é usada por todos os presidentes que tentam a manutenção do cargo. Assim como Bolsonaro, Dilma e Lula também tiveram um ‘pacote de bondades’ quando tentavam se reeleger. É uma tática comum para se conseguir votos”, afirma.
“Por outro lado, essas medidas são anunciadas durante um período ‘cinzento’ que é o período das eleições. É preciso que os órgãos de controle fiscalizem os atos para averiguar casos de uso da máquina pública. Se um prefeito fizesse o mesmo que Bolsonaro durante um ano eleitoral, certamente perderia o mandato”, prossegue.
Kássio Gomes, também especialista em direito eleitoral, lembra que as medidas, apesar de beneficiarem a população a curto prazo, têm potencial para criar uma bomba fiscal para o próximo governo.
“Essas medidas causam um impacto menor neste primeiro momento, porém, a longo prazo, são um risco, podendo gerar uma bomba fiscal. Cedo ou tarde, o custo dessas iniciativas vão aparecer e vão pesar os cofres públicos”, observa.