Caso das meninas venezuelanas atingiu Bolsonaro
Foto: Ricardo Stuckert
A campanha do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) traçou uma estratégia para manter vivo o episódio em que o presidente Jair Bolsonaro (PL) disse que “pintou um clima” com adolescentes venezuelanas durante um passeio de moto em Brasília. Como o ministro Alexandre de Moraes, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), proibiu o petista e aliados de veicularem o vídeo que contém tal declaração, a militância tem sido estimulada a continuar comentando o assunto nas redes sociais.
Para o QG de Lula, o caso marcou a primeira vez em que os petistas conseguiram atingir a imagem de Bolsonaro entre seu eleitorado mais fiel, o conservador. Prova disso, na avaliação dos petistas, foram as reações do presidente. Ele abriu uma live no início da madrugada de domingo, logo após o assunto vir à tona, e disse que as 24 horas anteriores estavam sendo “as piores da vida”. Ontem, voltou ao assunto e gravou um vídeo em que se desculpa pela frase a que se refere a meninas de 14 e 15 anos de idade.
A ordem do PT é insistir no debate sobre a conduta do presidente à exaustão, sem republicar o vídeo vedado pelo TSE. Nesse cenário, personagens como o youtuber Felipe Neto, que tem 15 milhões de seguidores só no Twitter, passaram a explorar o tema. Eleitor declarado de Lula, Neto resgatou uma gravação em que Bolsonaro elogia o ex-ditador paraguaio General Stroessner ao classificá-lo como “estadista” e “homem de visão”. Stroessner foi acusado de ser estuprador e pedófilo. A publicação no Twitter teve 2 milhões de visualizações. O youtuber chamou Bolsonaro de “adorador de pedófilo”.
Procurada pelo GLOBO, contudo, a assessoria do influenciador afirmou que Neto define todas suas ações por conta própria. Acrescentou que ele só discute com a campanha petista gravações para o horário eleitoral gratuito e inserções na TV de Lula.
Durante reunião com 18 mil comunicadores digitais na terça, o senador e integrante da campanha petista Randolfe Rodrigues (Rede-AP) fez um apelo aos apoiadores de que é preciso “focar no que ataca no front adversário”
— Vamos focar aquilo que ataca no front do adversário, o “pintou um clima”, que surgiu na semana passada. Aquela cena horrenda, dele aliciando, ofendendo adolescentes, não pode desaparecer das redes. Nós temos que reiterar, voltar a insistir nesses temas. Esse tema tem que continuar repercutindo porque esse tema foi diagnosticado como um ponto falho deles — justificou.
Aferições internas do núcleo duro petista apontam que o tema ainda não perdeu “prazo de validade” nos meios digitais. Aliados de Lula consideram importante não desistir do caso, que, na opinião deles, é capaz de desconstruir a imagem de Bolsonaro.
Na esteira da estratégia petista, a mulher de Lula, a socióloga Rosângela da Silva, a Janja, publicou na segunda e na terça-feira outros vídeos em que Bolsonaro fala sobre venezuelanas, diferentes daquele vedado pelo ministro do TSE. No primeiro deles, o presidente afirma ao Podcast “Collab”, feito por evangélicos, em 12 de setembro deste ano:
— Todas muito bem arrumadas, tinham tomado banho, estavam fazendo o cabelo. Venezuelanas. Estavam se arrumando para que? Alguém tem ideia, quer que eu fale? Para fazer programa —disse.
Protagonismo: Janja amplia papel na articulação da campanha e é incentivada a ter agenda solo voltada para mulheres
Lula no Flow: ex-presidente sobe tom de ataques e diz que Bolsonaro se comporta como se fosse pedófilo
Janja publicou o trecho da entrevista e escreveu: “Inacreditável q o ‘Presidente’ já tenha exposto essas meninas venezuelanas, anteriormente em outra entrevista. A minha indignação só aumenta. O ‘cidadão de bem’ deveria ter denunciado se houvesse qq indício de exploração de menores. É essa proteção das famílias que ele prega?” Até a tarde de terça, o vídeo já tinha 760 mil visualizações.
O próprio Lula segue empenhado em manter o assunto em alta temperatura. Durante a gravação do podcast “Flow”, nesta terça-feira, ao ser questionado se achava que Bolsonaro era pedófilo, o ex-presidente afirmou o adversário “se comporta como se fosse” e depois continuou:
— O comportamento no caso das meninas da Venezuela é o comportamento de um pedófilo. E ele percebeu isso. Por isso é que ele ficou apavorado e tentou se explicar o mais rapidamente possível.
A afirmação de Bolsonaro que originou as críticas se deu durante uma entrevista concedida ao canal do Youtube “Paparazzo rubro-negro” na sexta-feira à noite. Ele disse que “pintou um clima” com adolescentes venezuelanas durante um passeio de moto em São Sebastião, no ano passado. Na ocasião, ele foi à casa das meninas e gravou um vídeo, segundo o presidente, para mostrar a situação em que viviam.
— Eu parei a moto numa esquina, tirei o capacete e olhei umas menininhas, três, quatro, bonitas, de 14, 15 anos, arrumadinhas num sábado numa comunidade. E vi que eram meio parecidas. Pintou um clima, voltei. “Posso entrar na sua casa?” Entrei. Tinham umas 15, 20 meninas sábado de manhã se arrumando. Todas venezuelanas. E eu pergunto: meninas bonitinhas de 14, 15 anos se arrumando no sábado para que? Ganhar a vida. Você quer isso para a sua filha que está nos ouvindo agora? — relatou o presidente em entrevista.
No domingo, o presidente do TSE decidiu pela remoção de vídeos postados por perfis da campanha de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em redes sociais que reproduziram fala de Jair Bolsonaro sobre venezuelanas. Ele proibiu novas manifestações sobre “os fatos tratados” em representação protocolada pelos aliados de Bolsonaro, “tanto em concessionárias do serviço público como nas redes sociais, sob pena de multa diária” de R$ 100 mil. Ou seja, o PT está impedido de usar o material na TV, no rádio ou em qualquer plataforma digital.
Moraes ordenou ainda que TikTok, Instagram, Linkedin, Youtube, Facebook e Kway tirem do ar conteúdo postado pela campanha de Lula relacionado ao tema.
“A divulgação de fato sabidamente inverídico, com grave descontextualização e aparente finalidade de vincular a figura do candidato ao cometimento de crime sexual, parece suficiente a configurar propaganda eleitoral negativa, na linha da jurisprudência desta CORTE, segundo a qual a configuração do ilícito pressupõe ‘ato que, desqualificando pré-candidato, venha a macular sua honra ou a imagem ou divulgue fato sabidamente inverídico'”, escreveu Alexandre de Moraes.