Explode assédio de patrões bolsonaristas sobre empregados
Foto: Gabriel de Paiva/Agência O Globo
O Ministério Público do Trabalho (MPT) recebeu ao menos 197 denúncias de assédio eleitoral — quando o empregador age para coagir os trabalhadores a votarem em determinado candidato — até esta segunda semana de disputa do segundo turno. Além de infringir a legislação trabalhista, a prática de oferecer vantagens ou fazer ameaças a empregados para obter votos a algum candidato é considerada crime eleitoral.
Na eleição de 2018, durante todo o período eleitoral, ou seja, até o fim da disputa em dois turnos, foram feitas 199 denúncias do tipo, segundo a procuradora Adriane Reis de Araújo, coordenadora nacional de Promoção de Igualdade de Oportunidades e Eliminação da Discriminação no Trabalho do MPT. Ela avalia que a tendência é que a eleição deste ano supere esse patamar.
Nas últimas semanas, uma série de vídeos de empregadores coagindo funcionários a votarem em candidatos têm viralizado. Já houve, inclusive, a assinatura de termos de ajustamento de conduta (TACs) em ao menos dois casos, na Bahia e no Pará.
A maior parte das denúncias foi protocolada nas regiões Sul (103) e Sudeste (43). Paraná (42) e Santa Catarina (31) são os estados com mais casos de denúncias relacionadas ao delito.
A procuradora diz que o órgão percebeu uma série de textos similares divulgados por empresas para pressionar trabalhadores a votarem em determinados candidatos, o que sugere ação coordenada.
— Temos visto uma prática que se iniciou em 2018, e se repete, que é a de forçar o uso de camisetas em apoio a candidatos, ainda que indiretamente, o que é ilegal. É assédio moral, do ponto de vista trabalhista, e também é crime eleitoral — afirma ela.
Segundo Adriane, a prática é irregular mesmo se realizada com quem presta serviço, mas não tem vínculo formal, caso de autônomos e estagiários. Denúncias podem ser feitas no site do MPT.
Na semana passada, o MPT divulgou nota técnica com recomendações aos procuradores sobre como coibir esse tipo de assédio em ambientes de trabalho. “A interferência do empregador nas orientações pessoais, políticas, filosóficas ou eleitorais do empregado vai contra a Constituição”, segundo o órgão.
A coação é crime eleitoral e pode ser punida com pena de até quatro anos e multa para condutas como “dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber, para si ou para outrem, dinheiro, dádiva, ou qualquer outra vantagem, para obter ou dar voto e para conseguir ou prometer abstenção, ainda que a oferta não seja aceita”.
A nota lembra que não é permitida a distribuição ou exibição de qualquer peça de propaganda eleitoral dentro de empresas, especialmente com a exigência d uso de vestimentas em referência a algum candidato.
— A Constituição dá a todo cidadão o direito à livre manifestação política. O empresário pode apoiar determinado candidato, mas na vida privada. Não pode constranger, não pode reunir funcionários para fazer qualquer pressão — diz o advogado Otavio Pinto e Silva, professor de Direito do Trabalho da USP.
Um episódio recente ocorreu no interior do Pará. O empresário Maurício Lopes Fernandes Júnior, dono da Cerâmica Modelo, em São Miguel do Guamá, reuniu funcionários e prometeu pagar R$ 200 a cada um se o presidente Jair Bolsonaro fosse reeleito. As imagens viralizaram.
Os procuradores do MPT propuseram um TAC. O empresário precisa pagar R$ 2 mil a cada um dos trabalhadores, com ou sem vínculo formal. Deve fornecer equipamento de proteção individual e indenização de R$ 150 mil para reparar o dano moral coletivo. O empresário divulgou vídeo de retratação:
“Vim pedir desculpas à sociedade brasileira (…) Eu simplesmente pedi aos meus funcionários para que votassem no meu candidato. Ocorreu um erro e quero falar para vocês o seguinte: estou me retratando”, diz no vídeo.
Na sexta-feira passada, o MPT do Rio Grande do Sul (MPT-RS) ingressou com ação civil pública contra uma fabricante de máquinas agrícolas, a Stara. Ela tinha enviado carta aos fornecedores dias antes informando que reduzirá a base orçamentária em 30% caso Lula vença.
O MPT pede a condenação da Stara ao pagamento de R$ 10 milhões a título de danos morais coletivos e de danos morais individuais, válidos para cada funcionário registrado no mês de setembro. A Stara é controlada pela família Trennepohl, simpatizante de Bolsonaro.
O presidente do conselho de administração, Gilson Trennepohl, doou R$ 350 mil à campanha do presidente e outros R$ 300 mil à do ex-ministro da Cidadania Onyx Lorenzoni (PL), candidato bolsonarista ao governo gaúcho.
O presidente da empresa, Átila Trennepohl, afirma que o documento não era direcionada ao público externo e não configura ameaça, e sim uma projeção. Diz, ainda, que a companhia não planeja demissões mesmo se Lula vencer as eleições:
— O comunicado era dedicado ao time de fornecedores estratégicos, não deveria ter saído ao mercado. É alinhamento sobre previsões orçamentárias, acontece com frequência, foi mal interpretado.