Novo vai “pedir penico” a Bolsonaro
Foto: Geraldo Bubniak
O Partido Novo liberou seus filiados no segundo turno da eleição presidencial, mas entrou em ebulição no último sábado, quando João Amoêdo, fundador da sigla pela qual foi candidato à Presidência em 2018, declarou voto em Luiz Inácio Lula da Silva (PT) contra a reeleição de Jair Bolsonaro (PL), opção de boa parte de seus correligionários. A decisão de Amoêdo aprofundou divisões e a crise da sigla, instaurada com seu encolhimento nas urnas este ano.
A bancada federal do Novo caiu para menos da metade. Elegeu apenas três deputados — bem menos que os oito de 2018 —, não atingiu a cláusula de barreira e ficou sem fundo eleitoral. Por uma regra de seu estatuto, os candidatos do partido já não usam recursos públicos em campanhas, mas ficará à margem da propaganda eleitoral gratuita e de debates na TV, que só são obrigados a convidar candidatos de legendas com pelo menos cinco deputados federais. O único sucesso foi a reeleição do governador de Minas Gerais, Romeu Zema, no primeiro turno.
Em entrevista à colunista do GLOBO Bela Megale, na semana passada, Amoêdo disse que escolheu Lula após o fortalecimento da base de Bolsonaro no Congresso e das investidas dele contra do Supremo Tribunal Federal (STF), que considera ameaças à democracia:
— Acredito que, com Lula, no dia seguinte vou ter mais liberdade para fazer oposição. Não farei o “L”. Sigo com minhas críticas a Lula e ao PT.
A declaração de voto de Amoêdo provocou uma onda de desfiliações e pedidos de dirigentes para que o ex-presidenciável seja expulso. Na avaliação de algumas lideranças do Novo, o incômodo demonstra a guinada do partido na direção de Bolsonaro. Registrada em 2015, a legenda de cunho liberal manteve certa distância do governo, mas passou agora a investir mais na aproximação com o bolsonarismo e no antipetismo como estratégia de sobrevivência.
Membros do Novo ouvidos reservadamente pelo GLOBO atribuem essa articulação a Zema e à bancada no Congresso. O governador declarou voto em Bolsonaro dois dias após o primeiro turno e tem participado de eventos com ele.
O alinhamento a Bolsonaro também é defendido por expoentes da legenda como o deputado federal reeleito Marcel van Hatten (Novo-RS), um dos mais votados em seu estado este ano. O também deputado federal Vinicius Poit (Novo-SP), que disputou o governo paulista e ficou em quarto lugar, logo declarou apoio ao candidato de Bolsonaro no segundo turno, Tarcísio de Freitas (Republicanos).
A adesão ao bolsonarismo também está por trás da debandada de jovens que não conseguiram se eleger, como Lucas Pavanato, egresso do Movimento Brasil Livre (MBL) que diz ter se filiado agora ao Republicanos a convite de Tarcísio, que poderia abrigar nomes do Novo sem mandato em um eventual governo em São Paulo, caso vença Fernando Haddad (PT).
— O apoio do Amoêdo a Lula vai contra todas as bandeiras do Novo. Bolsonaro é infinitamente mais próximo dos valores do partido — diz Pavanato, que ficou dois anos na sigla.
Apesar da pressão, Amoêdo diz que não pretende ceder às pressões e abandonar o partido do qual foi um dos fundadores. Há mal-estar por parte de lideranças da ala bolsonarista com o fato de a imagem de Amoêdo estar muito vinculada à do partido. Em 2018, o empresário teve quase 2,7 milhões de votos (2,5% do total) na corrida presidencial com sua pregação de redução do Estado. Foi um desempenho melhor que o de Luiz Felipe d’Ávila, nome lançado pelo Novo neste ano, que teve pouco menos de 560 mil (0,5%).
Afastado da cúpula do Novo, Amoêdo atribui o fracasso eleitoral deste ano a falhas da atual direção do partido na formação de candidatos competitivos. Ele chegou a tentar voltar à direção da sigla em setembro de 2021, mas foi rejeitado pelo diretório nacional, sob influência da ala bolsonarista.
— O Novo deveria ter ficado em oposição ao Bolsonaro e equidistante ao PT. E talvez, por cálculos eleitorais, o Novo se aproximou mais do bolsonarismo — disse Amôedo ao podcast 2+1, do GLOBO e da CBN, que foi ao ar ontem. — O principal diferencial do Novo era sua identidade, o seu propósito. No momento em que isso não ficou claro na mídia e, consequentemente, para os eleitores, aí o resultado acho que é um reflexo disso: a indefinição da identidade. Afinal de contas o que vocês representam de verdade?
Oficialmente, o Novo culpa a polarização Lula e Bolsonaro pelo mau desempenho de suas candidaturas neste ano. “O partido já começou a se organizar para as eleições de 2024 de modo a expandir seus mandatários”, afirmou a sigla em nota. Também diz que “não está em discussão a possibilidade de fusão com outro partido”, mas dirigentes dizem que, internamente, defendem a união com outras siglas.