Pela primeira vez um presidente larga atrás no 2o turno
Foto: Edilson Dantas / Agência O Globo
Para impedir a reeleição de Jair Bolsonaro e vencer pela terceira vez a disputa pelo Palácio do Planalto, a campanha de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) terá de passar por ajustes, avaliam especialistas, cientistas políticos e até mesmo integrantes do núcleo duro petista ouvidos pela equipe da coluna.
Caso contrário, Lula corre o risco de não atrair o eleitorado que optou por Simone Tebet (MDB) e Ciro Gomes (PDT) no primeiro turno, pavimentando o caminho para uma reviravolta de Jair Bolsonaro.
Desde as eleições de 1998, os ex-presidentes que disputaram a reeleição largaram na frente e confirmaram o favoritismo nas pesquisas, seja vencendo no primeiro ou no segundo turno. Pela primeira vez, o atual chefe do Executivo larga atrás.
Mas o PT não só não acha que essa desvantagem torna Lula favorito absoluto, como considera um erro ter acreditado que se poderia liquidar a disputa já no primeiro turno.
No final das contas, o ex-presidente teve 48,43% dos votos válidos, ante 43,20% de Bolsonaro – uma diferença de 5.23 pontos percentuais, muito menor do que apontavam as pesquisas dos principais institutos do país.
Conforme informou a coluna, aliados de Lula avaliam que o desempenho bem abaixo do esperado em São Paulo minou as chances de o petista ter se consagrado vitorioso no último domingo (2).
Para alguns aliados, a votação nas grandes cidades, em especial em São Paulo, foi prejudicada pelo discurso excessivamente genérico do petista na campanha.
“Lula não falou para a classe média olho no olho, não falou com os católicos! O que o Lula prometeu nessa campanha? Acabar com sigilo de 100 anos?”, afirma um aliado de Lula que participa de discussões sobre a estratégia da campanha.
O comentário do sigilo é uma referência à promessa sempre reiterada por Lula de levantar o sigilo de 100 anos decretado por Bolsonaro em uma série de assuntos delicados para o presidente, como telegramas do Itamaraty e convidados que visitaram a primeira-dama Michelle Bolsonaro no Palácio da Alvorada.
Um integrante do núcleo duro da campanha petista concorda com a análise e elenca três grupos prioritários com os quais a campanha de Lula precisa dialogar melhor para derrotar Bolsonaro – católicos, mulheres e jovens.
“Tem que cuidar de todos os detalhes. O lado de lá não vai ficar parado”, diz.
Outro erro importante, para um marqueteiro que atuou nesta campanha para um dos candidatos derrotados: “O PT deixou de dar sinal de conforto sobre o combate à corrupção para o eleitor médio para que ele pudesse ir pra candidatura de Lula com mais tranquilidade.”
“Não é pedir desculpa, não esconder o fato de que Lula foi preso.É dar garantia de que não vai ter bandido no governo dele”, acrescenta.
Na reta final do primeiro turno, Bolsonaro apostou na “pauta do medo”, reforçando a memória dos escândalos do PT e os ataques contra Lula, chamado de “ex-presidiário” e “ladrão” no horário eleitoral e no debate da TV Globo.
Para o cientista político Sérgio Praça, da Fundação Getulio Vargas (FGV-SP), o PT “não entendeu que é necessário dar uma resposta decente à população sobre os atos corruptos” praticados nas gestões Lula e Dilma, especialmente os escândalos do mensalão e do petrolão.
“Lula acha que pode se safar sem explicações e dizendo apenas que houve injustiça”, avalia.
Na avaliação do cientista político Renato Perissinotto, da Universidade Federal do Paraná (UFPR), o resultado do primeiro turno deixou claro que uma parte significativa da população assumiu de vez um discurso conservador, religioso e de costumes.
“Acho que a questão da classe média é importante sim; o que fica claro é que política social não é incompatível com o campo conservador. A direita pode pensar em políticas sociais também, mas para a classe média é preciso pensar em algo mais: desenvolvimento, reforma tributária, melhores serviços”, afirma.