Golpistas temem que Copa os desmobilize

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Foto: Vinícius Schmidt/Metrópoles

Ironicamente, brasileiros que transformaram a camisa amarela da CBF em símbolo de amor pelo país estão em campanha contra a Seleção e o principal evento que ela disputa, a Copa do Mundo. Nas redes sociais e em grupos no WhatsApp e Telegram, há uma intensa campanha de bolsonaristas pedindo que os patriotas boicotem os jogos que acontecem no Catar e sigam concentrados na pauta do momento: a contestação da vitória de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nas eleições.

Nos ambientes virtuais, militantes bolsonaristas defendem que entrar no clima de Copa seria se submeter a uma versão contemporânea da política do pão e circo, estratégia do Império Romano (27 a.C. a 476 d.C.) para evitar revoltas populares.

A ordem nos espaços onde a militância bolsonarista se manifesta é esquecer a Copa e dedicar a energia a ficar na frente dos quartéis Brasil afora, pedindo a ajuda dos militares para evitar a posse de Lula.

 

O medo entre os influenciadores é que o torneio, que dura um mês e tem mais de um jogo por dia na primeira fase, acabe desmobilizando as manifestações, que já estão na terceira semana e vão ficando cada vez mais difíceis de manter na primavera chuvosa deste ano em São Paulo e Brasília, principais pontos de aglomeração em frente às instalações militares.

Um temor que é compartilhado pelo próprio presidente Jair Bolsonaro (PL). De acordo com apuração do colunista Guilherme Amado, do Metrópoles, o ainda chefe do Executivo federal avalia que a Copa tem o potencial de esvaziar os protestos. Nesse cenário, a promessa do presidente do PL, Valdemar Costa Neto, de reclamar ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sobre um suposto problema nas urnas seria uma tentativa de manter o interesse dos bolsonaristas no tema.

O boicote à Copa do Mundo não é uma questão unânime entre os bolsonaristas e há quem queira entrar no clima do Mundial, aproveitar os jogos e torcer pelo Brasil. Os que se atrevem a externar isso nas redes sociais, porém, não estão sendo bem tratados por seus seguidores mais radicais.

No último sábado, o ministro Fábio Faria (Comunicações) fez postagem com vídeo da Seleção Brasileira a caminho do Catar, com a legenda “Bora, Brasil. Rumo ao hexa!”. Nas respostas, porém, o clima é outro. “Cara … Amamos a seleção. Mas estamos muito preocupados com o nosso futuro”, respondeu um perfil. Veja a postagem e uma das interações:

 

Já o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, postou no domingo (20/11) uma foto de si mesmo usando uma camisa com o número 22 (um afago a seu chefe) assistindo ao jogo de estreia da Copa, a vitória do Equador sobre o Catar. “Começou a Copa do Mundo, momento de alegria, de reunir os familiares e amigos para acompanhar o maior espetáculo esportivo do mundo”, escreveu o ministro, em postagem que havia recebido pouco mais de 1.500 respostas até a tarde de segunda (21/11), praticamente todas com teor de crítica.

“Enquanto os patriotas estão rachando no sol pela nossa liberdade, o ministro está no conforto do lar assistindo futebol na globolixo”, escreveu um internauta, em resposta a Queiroga. “Meus olhos e os da minha família estão voltados para outro assunto muito mais importante”, “Estamos boicotando essa Copa”, respondeu outra.

 

Os bolsonaristas radicais não são o primeiro grupo político a militar pelo boicote à Copa do Mundo entre os brasileiros. Há oito anos, quando o Mundial foi realizado no nosso país, também houve uma mobilização anticopa, mas, naquele caso, eram militantes de esquerda que protestavam.

O slogan “Não Vai ter Copa” nasceu ainda no ano anterior ao evento, 2013, quando uma série de protestos balançou o país e os gastos públicos com a construção de estádios luxuosos foram um dos alvos dos manifestantes.

Em 10 de dezembro de 2013, Dia Internacional dos Direitos Humanos, movimentos sociais ligados à esquerda lançaram um manifesto com o título “Se não tiver direitos, não vai ter Copa” e uma agenda de protestos foi organizada no ano seguinte.

Em um dos momentos mais dramáticos dos protestos contra a Copa, centenas de indígenas que estavam em Brasília no dia 27 de maio de 2014 se juntaram aos manifestantes anticopa e se dirigiram ao recém-construído Estádio Nacional para protestar. A polícia cercou a arena para impedir o avanço dos manifestantes e se seguiu uma batalha campal que acabou com dezenas de feridos e intoxicados por gás, além de um PM atingido por uma flecha.

O clima era tão tenso que bonecos infláveis do mascote daquela Copa, o Fuleco, que ficavam expostos nas cidades-sede precisavam ter escolta 24 horas por dia para não serem “mortos” por manifestantes.

No fim, porém, teve Copa e o evento foi um sucesso, apesar do 7 a 1.

Metrópoles