Lula ainda vai segurar nome do ministro da Fazenda
Foto: Marlene Bergamo/Folhapress
As expectativas se concentram no anúncio do novo ministro da Fazenda, e é natural que seja assim: desde a campanha, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) se esquiva quando é perguntado sobre o assunto. Mas é recomendável manter as atenções, também, nos demais postos da equipe econômica. Inclusive nos escalões inferiores.
Parte do suspense pode terminar quando Lula retornar do Egito, onde participa da cúpula do clima, a COP27. Contudo, aliados do petista lembram como, em 2002, ele adiou o máximo possível o chá de revelação durante a gestação do seu primeiro ministério.
Deve-se olhar o perfil do secretariado e a diretoria do BC
Naquele ano, Lula só tornou público o nome do chefe da equipe econômica no dia 10 de dezembro. E o anúncio saiu em uma espécie de ato falho, durante uma visita à capital dos Estados Unidos.
Em entrevista a jornalistas realizada já no Brasil, dois dias depois, Lula lembrou do episódio. Primeiro, confirmou Antonio Palocci para o cargo: “Em uma resposta que dei aos jornalistas no Clube de Washington eu confundi o coordenador da equipe de transição com o ministro da Fazenda. Eu agora quero confirmar o Palocci como ministro da Fazenda”.
Na sequência, anunciou o ministro da Casa Civil, José Dirceu, e Henrique Meirelles, à época deputado federal eleito pelo PSDB de Goiás, para a presidência do Banco Central. Ainda brincou com as especulações, acrescentando que daria um prêmio ao jornalista que acertasse mais nomes.
Hoje, o cenário não é muito diferente. Lula tenta, novamente, ganhar tempo.
Com o argumento de que todos deveriam recordar como apresentou seguidos superávits primários num passado remoto, vem desconversando sobre o arcabouço fiscal que pode substituir o combalido teto de gastos. A ausência de uma proposta já é sentida pelos agentes econômicos. Enquanto isso, o PT testa a reação do mercado à sua intenção de manter o controle dos ministérios da Fazenda, do Planejamento e da Casa Civil.
São estes os cargos que devem voltar a compor a junta de execução orçamentária, órgão que coloca em prática a política fiscal e define como será feita a gestão do Orçamento a fim de cumprir as metas estabelecidas em lei. O perfil da junta, aliás, pode sinalizar se a política fiscal será mais restritiva ou complacente.
No governo de Jair Bolsonaro, por exemplo, inicialmente o Superministério da Economia teve um peso maior no processo decisório. Isso durou quase dois anos. Só mudou depois que o Centrão foi alojado no núcleo do Palácio do Planalto.
Há que se observar, ainda, como serão preenchidas as cadeiras dos escalões inferiores do Ministério da Fazenda.
Um posto estratégico é o de secretário do Tesouro Nacional, cuja função vai muito além do que se convencionou chamar de “gestão dos cofres públicos”. A STN é responsável por administrar a dívida pública e sua contabilidade. Fica a cargo dessa secretaria o estabelecimento e a avaliação dos programas de reestruturação e ajuste fiscal dos Estados, e é ela que acompanha a situação financeira de municípios endividados.
Um nome cotado é o de Felipe Salto, secretário de Fazenda de São Paulo. Ex-diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI), órgão vinculado ao Senado, Salto tem bom trânsito no PSDB e no Congresso. Se confirmado, dará pluralidade à equipe econômica.
Outros dois cargos sensíveis são os de secretário da Receita Federal e de Política Econômica.
A SPE é um órgão mais formulador do que executor. Tem como objetivo elaborar projetos e propostas que conversem, de forma integrada, com a estratégia geral do governo federal. É a secretaria do Ministério da Economia (ou Fazenda, futuramente) que avalia os impactos macroeconômicos de diversas políticas públicas para dar suporte ao processo de tomada de decisão da pasta. Sua equipe produz cenários e ferramentas para o acompanhamento de indicadores econômicos.
Já à Receita Federal cabe, por exemplo, administrar os tributos internos e de comércio exterior, realizar as atividades de arrecadação, fiscalização e investigação fiscal, além do controle aduaneiro e o combate ao contrabando. Ela participa da formulação de propostas para o aperfeiçoamento da legislação tributária e aduaneira, apresenta subsídios à política tributária e à formulação do Orçamento. Neste caso, mais especificamente às receitas orçamentárias e benefícios tributários concedidos pela União.
Ainda não se tem clareza em relação à lista de candidatos para a Secretaria de Política Econômica, posto que pode ser ocupado por um acadêmico. Quanto à Receita Federal, já se menciona, conforme revelou o Valor, o presidente do Comitê Nacional dos Secretários de Fazenda dos Estados e do Distrito Federal (Comsefaz), Décio Padilha.
Trata-se de um nome ligado ao governador de Pernambuco, Paulo Câmara (PSB), que pode sofrer resistências corporativistas dentro da Receita. Por outro lado, sua escolha atenderia a um outro pré-requisito: ter canais de interlocução abertos com as unidades da federação.
O secretariado escolhido por Lula terá que cumprir algumas missões consideradas fundamentais pela equipe de transição. Uma delas é restabelecer uma política industrial. Outra é tomar decisões, inclusive quanto à reforma tributária, que reduzam as preocupações de Estados e municípios sobre a capacidade financeira das administrações locais a partir do ano que vem. Tudo isso num cenário de desaceleração econômica no mundo todo e incertezas em relação à inflação global.
Um outro ponto de atenção é a diretoria do Banco Central. Dois dos seus integrantes, Bruno Serra Fernandes (Política Monetária) e Paulo Sérgio Neves de Souza (Fiscalização), têm mandato até 28 de fevereiro de 2023. Em tese, eles podem ser reconduzidos. O desfecho dessas nomeações pode sinalizar como será a relação de Lula com o BC, depois de aprovada a autonomia da autoridade monetária.