Negacionismo da pandemia melou reeleição de Bolsonaro
Foto: Divulgação/PSB
O governador reeleito da Paraíba, João Azêvedo, disse, em entrevista à Folha, que o presidente Jair Bolsonaro (PL) poderia ter sido reeleito se tivesse postura diferente durante o período mais crítico da pandemia da Covid-19 no Brasil.
“Se ele tivesse tido uma postura mais humanitária durante a pandemia, talvez tivesse até ganhado a eleição”, afirma Azevêdo, ao frisar o negacionismo do governo federal no enfrentamento da Covid-19.
Vitorioso com 52,51% dos votos válidos, Azevêdo avalia que o uso da máquina pelo governo Bolsonaro provocou o acirramento no resultado eleitoral na disputa contra o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
“[Entre essas estratégias] a ação da PRF que aconteceu no Nordeste para evitar que tivesse um número maior de pessoas votando e a disseminação de mensagens no guia [eleitoral] de Bolsonaro, [que] era muito contundente em um nível de disputa que acho que não faz bem à democracia”, diz.
Como avalia a vitória de Lula por margem apertada no segundo turno contra Bolsonaro? Essa era uma eleição extremamente polarizada em que prevíamos uma disputa muito acirrada. As próprias pesquisas já indicavam essa direção, mas esperávamos que fosse uma margem muito maior. Talvez as ações que foram usadas por Bolsonaro tenham dado efetivo a ponto de ter alterado essa quantidade de votos.
Quais estratégias são essas que o senhor acha que beneficiaram Bolsonaro? A ação da PRF que aconteceu no Nordeste para evitar que tivesse um número maior de pessoas votando. E a disseminação de mensagens no guia [eleitoral] de Bolsonaro era muito contundente em um nível de disputa que acho que não faz bem à democracia.
O que foi determinante para a derrota de Bolsonaro na sua avaliação? Acho que é um conjunto de fatores. A própria ação de Roberto Jefferson trouxe um impacto negativo para ele, trouxe influência principalmente sobre os indecisos.
Acredita que a conduta do presidente na pandemia teve impacto negativamente no resultado eleitoral dele? Não tenho dúvida alguma. Foram quatro ministros da Saúde no período de pandemia. Percentualmente o Brasil teve um número de mortes maior que o da população. As disputas constantes contra governadores acarretaram desgaste desnecessário para o governo. [O governo incentivou] métodos diferentes do que a ciência recomendava. Se ele tivesse tido uma postura mais humanitária durante a pandemia, talvez tivesse até ganhado a eleição.
Lula disse que, em janeiro, vai reunir os governadores e pedir que citem três projetos prioritários nos estados. Quais serão os seus? Um dos projetos é a terceira entrada do Eixo Norte da Transposição na Paraíba para o Rio Piancó. Há um conjunto de cidades ao redor desse rio com potencial muito grande, mas com a insegurança hídrica. Além disso, obras econômicas viárias na Paraíba, pois as rodovias federais precisam de melhor adequação e serem duplicadas. O terceiro é a saúde, a construção do Hospital de Clínicas e Traumatologia do Sertão. E vamos discutir também a insegurança alimentar.
Na Paraíba, Lula teve 66,62% dos votos contra 33,38% de Bolsonaro. Em João Pessoa, a margem foi menor de vitória: 50,1%, ante 49,9% de Bolsonaro. Houve um avanço do bolsonarismo em João Pessoa?Lula (o PT) nunca teve um desempenho aqui muito grande nas últimas eleições. Agora as grandes cidades, João Pessoa e Campina Grande, deram resultado [positivo] para Lula e o PT. Houve reversão do quadro em relação às eleições passadas com Haddad. Lula agora venceu no primeiro e no segundo turno nessas cidades. Normalmente, ele vencia no estado como um todo, mas nesses dois municípios não conseguia vencer e dessa vez conseguiu.
Como avalia o primeiro pronunciamento do presidente Bolsonaro após o resultado das eleições? Acho que foi muito mais no intuito de conter os pequenos focos de manifestação que estavam ocorrendo no Brasil. Impedir que as pessoas tenham o direito sagrado de ir e vir não cabe num país democrático.
Os atos estão perdendo força em função da própria fala [de Bolsonaro]. Ele não fez uma leitura sobre o resultado das eleições, colocou o ministro [da Casa Civil] Ciro Nogueira para dizer que a transição já está autorizada, o que sinaliza que ele reconheceu o resultado das eleições, mas coube ao ministro e não ao presidente tratar desse assunto.
O PSB venceu para os governos de Paraíba, Maranhão e Espírito Santo, mas perdeu no Rio de Janeiro e em Pernambuco. Qual a reflexão que fica para o partido? O PSB vai ter que rever sua posição inclusive quanto partido. Há uma necessidade de se reavaliar as possíveis alianças. Acho que foi correto o PSB não ter entrado na federação [com PT, PC do B e PV], pois sairia menor quanto partido [se entrasse]. O PSB acertou em vários estados, entretanto, em função de alianças, até com o próprio PT em determinados estados, [isso] levou o PSB a ter derrotas no Rio de Janeiro e em Pernambuco.
O sr. acha que o PSB vai ter protagonismo e eventual participação em ministérios no governo Lula? Acredito que sim. A maior representatividade do PSB está na figura do vice-presidente [eleito] Geraldo Alckmin. Ele vai desempenhar um papel fundamental.
O sr. venceu no segundo turno em uma disputa apertada contra Pedro Cunha Lima. Ele teve pouco mais de 1,1 milhão de votos, cerca de 117 mil a menos que o senhor. Qual mensagem passar a quem não votou pela sua reeleição? Serei governador de todos os paraibanos e não apenas da parte que me elegeu. Mas travamos uma luta gigantesca porque no aglomerado de pessoas do outro lado tinha de extrema esquerda à extrema direita, pessoas de PL, PT, MDB, como o senador Veneziano, o ex-governador Ricardo Coutinho, os deputados federais e estaduais eleitos aliados do ex-governador estavam juntos. Uma salada política cujo único objetivo era derrotar o governo, não havia coerência ideológica, os interesses eram confusos e diversos.
Tem espaço para uma reconciliação com Ricardo Coutinho e Veneziano, que já foram seus aliados? Diria que é improvável. O ex-governador tem um rumo completamente diferente daquilo que acredito de fazer política. Não tenho nenhum problema pessoal com o senador, entretanto, [ele] escolheu caminhos diferentes.
Quais serão as prioridades do seu segundo mandato? Temos muitas coisas que estão em andamento e vamos dar continuidade. A área de turismo teve avanços, apesar da pandemia, com o polo turístico de Cabo Branco e vamos interiorizar mais o turismo, incluindo a construção de um Centro de Convenções de Campina Grande. E na segurança, investir em tecnologia com centros integrados de comando e controle. Sem descuidar da saúde.